Título: EPIDEMIAS DE RAIVA ATINGEM AMÉRICA LATINA
Autor: Marizilda Cruppe
Fonte: O Globo, 01/07/2006, O Mundo, p. 31

Doença erradicada em países ricos volta a matar em nações mais pobres do continente

SANTA CRUZ. Erradicada em praticamente todo o mundo desenvolvido, a raiva vem ressurgindo na América Latina. Na Bolívia, somente em Santa Cruz já foram registrados mais de 500 focos da doença desde o início do ano. No Peru, um surto da zoonose levou o governo a pedir ajuda ao Brasil: 400 mil doses da vacina anti-rábica foram enviadas esta semana ao país andino.

Em Santa Cruz, uma das regiões mais atingidas da Bolívia, quatro pessoas morreram este ano ¿ o mesmo número de todo o ano passado. Para tentar conter a epidemia, o governo boliviano lançou uma campanha nacional de vacinação. De janeiro a março, 2.421 pessoas receberam o imunizante. No ano passado, foram 5.941.

Mais de 400 mil cachorros já foram vacinados

A raiva não tem cura e a única forma de reduzir a incidência da doença é a prevenção, com a vacinação de pessoas e cachorros ¿ principal vetor da doença. Mas a tarefa não é das mais simples, sobretudo no que diz respeito aos animais. Apenas na área urbana de Santa Cruz estima-se que existam 460 mil cachorros ¿ 90 mil deles de rua. Até agora, pouco mais de 400 mil já foram vacinados.

¿ A raiva sempre foi endêmica na Bolívia, mas de 2005 para cá passou a ser uma epidemia ¿ afirmou o epidemiologista Roberto Torres, responsável pela Unidade de Prevenção e Controle de Doenças do estado. ¿ Santa Cruz tem mais casos porque tem mais cachorros, muitos deles de rua.

A falta de recursos generalizada e a pouca informação disponível produz situações dramáticas. Em geral, a doença leva de duas a dez semanas para se manifestar, mas há relatos de períodos de incubação de até seis anos. Esdras Mendoza, de 10 anos, morreu no último sábado sem que os médicos conseguissem determinar exatamente como o menino se contaminou.

Um outro menino, vizinho de Esdras, desenvolveu a doença depois de ter sido mordido pelo próprio cachorro. Em vez de observar o comportamento do animal para determinar se ele estava doente, a família deu o cão. Tempos depois, o menino começou a apresentar os sintomas mais tristes da doença: atacou e mordeu no pescoço um colega durante uma brincadeira. Ele acabou morrendo há um mês, enquanto o amigo foi vacinado e se salvou.