Título: OS PRÓPRIOS DOADORES ESTÃO ASSUSTADOS¿
Autor: Isabel Braga
Fonte: O Globo, 02/07/2006, O País, p. 14
NO RASTRO DO CAIXA DOIS Corregedor-geral do TSE diz que será rigoroso com candidatos
Responsável pela fiscalização da eleição para a Presidência, o corregedor-geral eleitoral do TSE, ministro Cesar Asfor Rocha, diz que o tribunal será rigoroso para garantir o equilíbrio entre os candidatos nas eleições de outubro. Argumenta que o TSE já tem dado sinais em votações recentes, como as que proibiram a veiculação de publicidade institucional do governo federal nos três meses que antecedem a campanha eleitoral. Cearense, de 58 anos, diz acreditar que a ação do TSE será facilitada por mudanças como a que impôs duas prestações de contas pelos candidatos durante a campanha (em 6 de agosto e 6 de setembro). E faz um aviso: candidatos e doadores infratores serão vigiados.
A eleição será acirrada na Justiça eleitoral, com uma chuva de acusações entre os concorrentes?
CESAR ASFOR ROCHA: Será mais movimentada pelos antecedentes políticos, a questão dos mensaleiros. Isso agitou o espírito não só dos políticos, mas também da imprensa e do cidadão e, evidentemente, da Procuradoria e da Justiça Eleitoral. Claro que se achava (que havia o caixa dois), mas não nessa intensidade e gravidade. Isso despertou em todo mundo o desejo de corrigir.
O TSE pode combater o caixa dois sem fiscais?
ASFOR ROCHA: O TSE e os TREs têm um corpo de funcionários. Agora está menos difícil, temos as duas prestações de contas no período eleitoral, as denúncias serão maiores, temos a necessidade de identificação da entrada e da saída dos recursos, a identificação de quem dá e de quem recebe. Hoje, qualquer saque em espécie acima de R$10 mil já é identificado. Isso tudo vai assustando as pessoas. E a redução dos gastos vai nos facilitar a fiscalização.
Uma prestação mais enxuta permite ver os sinais exteriores de riqueza de uma campanha.
ASFOR ROCHA: Teremos parâmetros para saber se o sinal de riqueza pode ser suprido pelo que foi declarado. Podemos fazer fiscalização por amostragem. Vamos pegar dez candidatos com campanhas mais ricas e fiscalizar com profundidade.
O TSE tem pessoal para checar as prestações?
ASFOR ROCHA: Tem, e temos convênio com a Receita Federal. Hoje a Receita está mais estruturada, tem o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), que é muito atuante, e todas as requisições feitas pela Justiça Eleitoral neste período precedem as demais.
Como o TSE fiscalizará os candidatos à reeleição?
ASFOR ROCHA: Essa questão é realmente crucial. Por isso sou contra a reeleição. É muito difícil definir o limite de um cidadão candidato e do cidadão detentor do cargo público executivo.
O presidente Lula reclamou da limitação da lei para sua atuação como governante...
ASFOR ROCHA: O candidato à reeleição tem o que chamamos de mais-valia. Bem ou mal aparece mais, naturalmente. Por mais que respeite as restrições da legislação eleitoral, ainda assim aparece muito. A dificuldade é conter excessos para evitar o abuso do poder político.
A lei é suficiente para impor limites e garantir o equilíbrio no pleito? Não pode inaugurar mas pode visitar obra, o que não deixa de ser um ato político...
ASFOR ROCHA: O governante tem que governar também. A lei tem elementos para se evitar abuso, mas não temos cultura ainda sobre reeleição, é um princípio muito novo.
O senhor foi o único ministro que votou contra a decisão do TSE de endurecer a verticalização, da qual o tribunal acabou recuando. Agora o presidente do TSE, Marco Aurélio de Mello, se envolve em nova polêmica sobre o aumento dos servidores. Há desgaste do TSE capaz de influenciar seu papel nas eleições?
ASFOR ROCHA: No primeiro episódio a minha visão é de que o tribunal foi magnânimo e os ministros tiveram muita grandeza. Não foi por intimidação. Foi por ciência de que o tribunal não deveria adotar, naquele momento, aquele entendimento.
E o reajuste de servidores? Pode haver aumento via reestruturação de carreiras?
ASFOR ROCHA: No meu entendimento tudo está vedado. Decidimos em cima da revisão geral, agora os princípios utilizados podem valer para o outro (tipo de aumento). Nesta época não (pode haver aumento). Tem um cunho eleitoral.
Depois do escândalo do caixa dois as pessoas estão vacinadas ou pode haver mais Delúbios?
ASFOR ROCHA: Certamente haverá. E se desta vez as agências de publicidade foram o instrumento, como antes eram as empreiteiras, outra atividade vai servir a isso. Mas há um dado relevante: os próprios doadores estão assustados. E o sentimento de impunidade é muito menor que há cinco anos. Ninguém acreditaria que um figurão pudesse ser preso. E quantos estão sendo, certo ou errado, precipitadamente ou não? Esse sentimento de impunidade está desaparecendo aos poucos e as pessoas estão ficando receosas.