Título: Sem consenso, o país está perdido¿
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 02/07/2006, O Mundo, p. 43

CIDADE DO MÉXICO. O maior desafio do país será criar um consenso que permita ao novo presidente governar, diz Armand Peschard-Sverdrup, diretor do Projeto México no Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, de Washington.

Quem será o escolhido pelos mexicanos neste domingo?

ARMAND PESCHARD-SVERDRUP: Não dá para adivinhar. A disputa é tão ferrenha que o vencedor deverá ter uma margem de vantagem muito pequena. A questão mais importante é que o grande desafio começará amanhã mesmo. Fox ficará no poder até 1º de dezembro. Mas a transição começará já nesta segunda-feira. E ela só poderá ser tranqüila se houver um consenso. Sem isso o México estará perdido.

Qual a dificuldade em se encontrar um consenso?

PESCHARD-SVERDRUP: Depois de 71 anos num sistema de partido único, com o PRI (Partido Revolucionário Institucional) no poder, os mexicanos não sabem ainda fazer uma transição como outras democracias fazem. A cultura política mexicana jamais foi moldada pela construção de um consenso. O vencedor desta eleição terá dificuldades para conseguir isso.

Por que? Todos os candidatos falam em buscar a união nacional...

PESCHARD-SVERDRUP: Pois é. Isso é extremamente necessário. Mas temos que considerar que o país viveu uma campanha eleitoral extremamente negativa, com uma propaganda muito agressiva. Será difícil perdoar os ataques ofensivos. E é preciso levar em conta, especialmente, que tudo indica que o Congresso continuará dividido em três forças: PAN, PRD e PRI. E, portanto, sem maioria absoluta. E sem um consenso entre os parlamentares o novo presidente não fará nada, como aconteceu com Vicente Fox.

Ou seja, o país poderá perder mais seis anos em divagações?

PESCHARD-SVERDRUP: O cenário é muito complicado, pois uma das conseqüências inevitáveis é que haverá um realinhamento do sistema partidário. E isso, que deveria ter ocorrido nesses seis anos, só está começando agora. E vai depender, ainda mais, de boa vontade política. Ela tem de existir pelo menos ao longo do primeiro ano do novo governo: esse será um período fundamental para o futuro do México.

Como será o México presidido por Felipe Calderón ou por López Obrador?

PESCHARD-SVERDRUP: Vença quem vencer o cenário será complicado. A estratégia de López Obrador foi apelar aos que pouco ou nada têm: os pobres. Mas terá que governar para todos os mexicanos e sabe disso. Seu discurso final de campanha foi significativo: ele enviou as mensagens corretas aos mercados financeiros e também aos setores políticos. O problema é a falta de experiência de governo do PRD que existe apenas desde 1989.

E com Calderón?

PESCHARD-SVERDRUP: Com ele haveria um certo índice de continuidade. Haveria menos incerteza sobre como seria e como agiria o governo. É preciso ver ainda como será a composição do seu ministério, assim como o de López Obrador. Nenhum deles falou claramente a respeito. E com uma minoria num Congresso dividido seria difícil também para Calderón montar uma boa plataforma de governo.

E onde entra Roberto Madrazo nessa equação?

PESCHARD-SVERDRUP: Pode ser ainda que o PRI, com Madrazo, fique em segundo lugar nessa eleição. E se isso acontecer o partido continuará a ser um poderoso intermediário político no Congresso.(J.M.P.)