Título: EVO MORALES SE SUBMETE NOVAMENTE ÀS URNAS
Autor: Janaina Figueiredo
Fonte: O Globo, 02/07/2006, O Mundo, p. 44

Eleição de Assembléia Constituinte e referendos sobre autonomia de estados são teste para presidente da Bolívia

BUENOS AIRES. O presidente da Bolívia, o socialista Evo Morales, enfrentará hoje o primeiro teste eleitoral de seu governo desde que assumiu o poder, em janeiro passado. Cerca de 3,8 milhões de bolivianos elegerão os 255 membros da Assembléia Constituinte que a partir de agosto começará a redigir a nova Constituição do país. Morales espera que o Movimento ao Socialismo (MAS) consiga uma ampla maioria na assembléia para controlar o processo de elaboração da Constituição (que terá uma duração máxima de um ano e mínima de seis meses), peça fundamental do projeto de refundação da Bolívia, eixo do programa de governo do MAS.

Paralelamente, os habitantes dos nove departamentos (estados) bolivianos participarão do referendo sobre autonomias regionais que, segundo pesquisas divulgadas recentemente no país, favorecerá os movimentos que defendem o pedido de autonomia, na contramão do modelo de país pretendido pelo presidente.

Proteção para plantadores de coca estaria na Carta

Morales está confiante. O presidente boliviano disse durante a campanha eleitoral que seu partido vencerá a eleição constituinte com 70% ou até mesmo 80% dos votos. O projeto de reforma da Constituição do MAS prevê, por exemplo, medidas de proteção para os plantadores de folha de coca, a implementação de um Estado laico, o poder total do Estado para redistribuir terras e controlar a exploração de todos os recursos naturais do país.

Analistas locais ouvidos pelo GLOBO afirmaram, porém, que mesmo obtendo um excelente resultado nas urnas, o MAS deverá negociar com a oposição na Assembléia Constituinte.

¿ A lei (de Convocatória da Assembléia Constituinte, aprovada em março passado) impede que o governo imponha seu critério automaticamente, mesmo vencendo a eleição. E não podemos esquecer que Evo ganhou a eleição presidencial com 53% dos votos, mas a oposição elegeu prefeitos (governadores) em seis dos nove departamentos bolivianos ¿ explicou Ximena Costa, professora da Universidade Maior de San Andrés.

Na visão da analista boliviana, o governo de Morales enfrentará um cenário delicado a partir de segunda-feira.

¿ No caso das autonomias, o ¿sim¿ certamente vencerá nos departamentos governados pela oposição e se o governo não respeitar esse resultado a imagem positiva de Morales, que hoje atinge cerca de 75%, poderia ser seriamente abalada ¿ argumentou Costa.

O presidente boliviano é o mais duro opositor dos movimentos que buscarão aprovar o pedido de autonomia em departamentos como Santa Cruz ¿ o mais rico do país ¿, Beni, Tarija, e Cochabamba. Os autonomistas estão otimistas.

¿ Acho que até mesmo em departamentos governados pelo MAS, como Potosí e Chuquisaca, o ¿sim¿ vai ganhar ¿ afirmou Mario Galindo, co-autor do projeto de autonomia de Santa Cruz. Segundo ele, ¿os bolivianos querem mudanças e por isso votaram em Evo, mas também querem evitar que o governo tenha um poder absoluto¿.

¿ A autonomia favorecerá o crescimento econômico de vários departamentos. Nosso projeto propõe a criação de um fundo de compensação para os departamentos mais pobres e Santa Cruz será a principal fonte de financiamento desse fundo ¿ declarou Galindo.

Segundo ele, se o ¿sim¿ obtiver o maior percentual de votos nacionalmente, a Constituinte aprovará uma lei sobre autonomias que poderá ser automaticamente aplicada pelos departamentos após a entrada em vigência da nova Constituição.

¿ Caso o ¿não¿ faça uma melhor eleição, os departamentos deverão realizar um segundo referendo para adotar a lei de autonomias que será votada pela constituinte ¿ disse Galindo.

A sede da Assembléia Constituinte será a cidade de Sucre. Concluída a redação da nova Constituição, que deverá ser aprovada por dois terços dos constituintes, o governo convocará um referendo popular para aprovar o texto. A nova Constituição só será ratificada se obtiver uma maioria absoluta de votos.