Título: Venezuela adere formalmente ao Mercosul
Autor: Ilimar Franco e Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 05/07/2006, Economia, p. 25

Lula ameniza tom ideológico da adesão do novo sócio; Chávez cita Bolívar e San Martín ao falar de integração

CARACAS e BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva contestou ontem as críticas de que o ingresso da Venezuela no Mercosul era motivada por razões ideológicas e que isso poderia criar dificuldades de relacionamento com os Estados Unidos. Ao chegar ao Teatro Tereza Carreño, para participar da solenidade da entrada da Venezuela no processo de integração, o presidente Lula também afirmou que os países maiores do bloco, como o Brasil e a Argentina, devem ajudar os países menores, que integram, a se desenvolverem. O presidente Lula chegou atrasado para a cerimônia, retardando seu início em cerca de uma hora e meia.

- Ninguém vai importar ideologias ou vai vender ideologias, nós vamos trocar experiências científicas e tecnológicas, vamos trocar produtos - disse Lula, contestando críticas da oposição e do ex-governador Geraldo Alckmin, de que sua política externa não se baseava nos interesses do país mas em questões ideológicas.

Com Venezuela, PIB do Mercosul vai a US$1 trilhão

O presidente venezuelano, no entanto, ressaltou a importância política da integração dos países sul-americanos:

- Hoje começa uma nova etapa na História venezuelana e, por que não dizer, da América do Sul. Estamos dando corpo a um projeto nacional e colocando pedras fundamentais para a liberalização da América do Sul - afirmou o

presidente da Venezuela, acrescentando que a adesão se enquadra no projeto geopolítico de San Martín e Simon Bolivar de unir as Américas.

Com a adesão, a Venezuela tornou-se o quinto país-membro do Mercosul, originalmente composto por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. Com isso, o Mercosul passará a ter um Produto Interno Bruto (PIB) estimado em cerca de US$1 trilhão, o correspondente a 76% de toda a América do Sul, e um comércio global de mais de US$300 bilhões.

O presidente Lula chegou até mesmo a minimizar a animosidade que existe entre os governos da Venezuela e do Estados Unidos que caracterizam as relações entre os dois países no governo Chávez.

- Até agora não vi nenhum conflito, vi uma guerra verbal. A Venezuela não deixou de vender nenhum litro de petróleo para os Estados Unidos, nem os Estados Unidos deixou de comprar nenhum litro da Venezuela - afirmou Lula.

Na entrevista, o presidente se recusou a comentar o pleito do presidente do Paraguai, Nicanor Duarte, de renegociar os contratos da empresa Itaipu Binacional. O paraguaio, que fez críticas à postura protecionista do Brasil e da Argentina, não voltará de mãos vazias para Assunção porque o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, atendeu a um de seus pedidos e anunciou ontem que compraria US$100 milhões em papéis da dívida paraguaia.

Mesmo sem assumir nenhum compromisso concreto, o presidente Lula disse que o Brasil está disposto a ajudar as menores economias a região. Mas alegou que muito deste acirramento se deve a eleições nestes países.

- Nós temos obrigação de ajudar os países mais pobres a se desenvolverem. Se o Paraguai tem problemas no seu desenvolvimento, nós temos que ajudá-lo. Os países maiores têm de ter a sabedoria de conviver com os pleitos e reivindicações dos mais pobres - disse Lula.

O presidente brasileiro negou que fosse negociar com o presidente da Bolívia, Evo Morales, na sua vinda a Venezuela, lembrando que os ministros das Relações Exteriores, Celso Amorim, das Minas e Energia, Silas Rondeau, e o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, estiveram recentemente em La Paz para tratar do assunto. Mas em seu discurso fez questão de citar a presença de Morales na solenidade de adesão da Venezuela ao Mercosul.

- Quero saudar a presença, aqui, de meu amigo, presidente Evo Morales. Sua decisão de prestigiar esse evento aponta para as grandes potencialidades que se abrem para uma parceria reforçada da Bolívia com o nosso bloco - disse o presidente brasileiro.

No discurso que fez, Lula fez questão de falar da importância da Venezuela entrar no Mercosul, dizendo que o processo de integração a partir de agora é continental, ligando a Patagônia ao Caribe. O presidente disse ainda que o ingresso da Venezuela no Mercosul contribuirá para desfazer a impressão equivocada de que o Mercosul atende apenas aos estados do Sul e do Sudeste do Brasil.

(*) Enviado Especial