Título: ESPECIALISTAS VOLTAM A CRITICAR COTAS
Autor: Demétrio Weber/Itala Maduell
Fonte: O Globo, 06/07/2006, O País, p. 13

Signatários de carta contra reserva de vagas para negros defendem debate

BRASÍLIA e RIO. Intelectuais e políticos contrários ao projeto de cotas nas universidades federais e ao Estatuto da Igualdade Racial evitaram ontem rebater as críticas do diretor-executivo da Educafro, rede de cursos pré-vestibulares para negros e pobres, frei David dos Santos, mas reafirmaram sua posição contra a reserva de vagas. Na última semana, ambos os grupos entregaram no Congresso manifestos a favor e contra as propostas.

Anteontem, no Congresso, frei David criticou os autores do manifesto contrário, dizendo trata-se de "intelectuais que se formaram com dinheiro público e querem continuar pisando no negro". E acusou os críticos de estarem preocupados em evitar que negros beneficiados pelas cotas tirem vagas de seus filhos nas universidades federais.

A pesquisadora Yvonne Maggie, professora de antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, afirma que o debate é fundamental, mas não a polêmica:

- A nossa carta é um alerta sobre essa engenharia social com base na raça. Este projeto de lei diz respeito a toda a sociedade, não só aos diretamente interessados. A iniciativa desses movimentos é importante, assim como o debate. Mas não podemos debater com quem tem acusações em vez de argumentos.

Schwartzman: "Número de beneficiados é pequeno"

Outro signatário, o ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Simon Schwartzman, reiterou os argumentos do grupo sem entrar em polêmica:

- O número de beneficiados é pequeno. Não sei em quanto tempo vai se conseguir melhorar a educação básica no Brasil. Mas, enquanto isso, não vai ser uma política de cotas que vai resolver.

O deputado federal Alberto Goldman (PSDB-SP), candidato a vice-governador de São Paulo na chapa de José Serra, discorda das posições de frei David, mas acha o debate positivo:

- As declarações expressam um ponto de vista pessoal. Não concordo, mas é preciso mostrar o pensamento de cada setor. Acho que isso ajuda na definição mais correta para o país.

Goldman é o autor do requerimento exigindo a votação em plenário na Câmara do projeto que reserva 50% das vagas nas universidades federais para alunos da rede pública, prevendo subcota para negros e índios proporcional às populações em cada estado. De autoria do Ministério da Educação, o projeto foi aprovado por unanimidade nas Comissões de Educação, Direitos Humanos e Constituição e Justiça, de onde seguiria direto para o Senado.

Pesquisadora vê prejuízo em valorizar idéia de raças

Para Yvonne - que integra a rede internacional Observa, que acompanha ações afirmativas na área de pesquisas, e coordenou o projeto "Cor e educação: políticas alternativas de combate à exclusão", apoiado pela Fundação Ford - a política de cotas e o Estatuto da Igualdade centram as baterias na própria idéia de raças, produzindo um país dividido em brancos e negros:

- O que está em jogo não é apenas a modificação de uma lei, mas a mudança do sentido de brasilidade.

"O que está em jogo não é apenas a modificação de uma lei, mas a mudança do sentido de brasilidade"

YVONNE MAGGIE

Pesquisadora