Título: JAPÃO ANUNCIA SANÇÕES CONTRA CORÉIA DO NORTE
Autor: Gilberto Scofield Jr.
Fonte: O Globo, 06/07/2006, O Mundo, p. 28

Tóquio suspende entrada de funcionários norte-coreanos após teste com mísseis. Sétimo foguete foi lançado ontem

PEQUIM. O governo da Coréia do Norte fez ontem às 17h20m (5h20m no Brasil) novo lançamento de um míssil de médio alcance, informaram os governos japonês e sul-coreano, elevando para sete os mísseis que caíram no Mar do Japão (um deles de longo alcance) e aumentando a tensão no leste da Ásia. O governo do Japão não apenas pôs suas Forças Armadas de Defesa em estado de alerta - e enviou fragatas ao local de queda dos mísseis, a 600 quilômetros do país - como anunciou sanções, que começaram com a suspensão da entrada tanto de funcionários do governo norte-coreano quanto da balsa de transporte Mangyongbong-2, a única ligação entre os países.

O porta-voz do Gabinete japonês, Shinzo Abe, qualificou os lançamentos de "ameaça à estabilidade e à segurança no leste da Ásia" e não descartou sanções econômicas, decisão que o país proporia ao Conselho de Segurança da ONU.

- O lançamento dos mísseis pela Coréia do Norte é uma violação da moratória estabelecida bilateralmente com o Japão e multilateralmente com outras nações - afirmou o porta-voz.

EUA: interceptadores de mísseis estão prontos

Segundo a Rússia, a Coréia do Norte lançou ao todo dez mísseis. Já os Estados Unidos confirmaram, pela primeira vez, que seus interceptadores de mísseis estavam prontos, caso precisem usar contra armas de longo alcance da Coréia do Norte.

- O que posso dizer é que cada lançamento foi detectado e monitorado e que os interceptadores estavam operacionais quando eles ocorreram - disse Bryan Whitman, porta-voz do Pentágono.

Sem citar os lançamentos, o governo da Coréia do Norte, através do jornal do Partido Comunista Coreano, afirmou que seu poder militar é invencível: "Nós mantemos a revolução à nossa maneira, de acordo com nossa convicção em meio a esta situação complicada e conflitante, já que possuímos um poder militar revolucionário e invencível, mesmo para os imperialistas dos EUA."

A Coréia do Sul colocou em alerta máximo suas Forças Armadas, mas evitou tomar qualquer decisão contra o vizinho do norte, com o qual, pelo menos tecnicamente, continua em guerra. Mas, segundo Seo Joo-seok, secretário de Segurança Nacional da Presidência, ficou mais difícil para os sul-coreanos manterem os programas de ajuda e investimento no vizinho:

- A relação entre as Coréias não permanecerá a mesma.

Venezuela defende testes com mísseis

Choo Kyo-Ho, vice-ministro das Relações Exteriores da Coréia do Sul, deixou claro que qualquer ação será decidida em acordo com os outros quatro países que hoje tentam convencer a Coréia do Norte a abandonar o seu programa nuclear em troca de ajuda econômica: EUA, Japão, Rússia e China.

Depois de manter-se em silêncio durante todo o dia, o Ministério das Relações Exteriores da China divulgou uma nota oficial demonstrando preocupação. A Coréia do Norte suspendeu as negociações com os seis países e quer uma conversa direta com os EUA, que se recusam a fazê-lo.

A Otan condenou os testes com mísseis, ressaltando que eles representavam uma séria ameaça à região. Na contramão das críticas internacionais, a Venezuela do presidente Hugo Chávez se manifestou a favor do lançamento dos mísseis, com o seu Ministério da Comunicação dizendo que os países têm o direto de desenvolver sua tecnologia logística.

Mundos bem diferentes

SEUL. Muitos sul-coreanos viram com tensão, mas sem muita surpresa, o lançamento dos mísseis norte-coreanos - mais um episódio no problemático relacionamento com seus vizinhos. Mas estes sequer foram informados pela mídia do país sobre o rebuliço que seu governo provocara no cenário internacional.

A calma tensa em Seul pode ser explicada pelo fato de os sul-coreanos viverem sob a ameaça de um ataque da Coréia do Norte por mais de 50 anos. Seul está a apenas 60 quilômetros da fronteira, considerada a mais militarizada do mundo, e ao alcance mesmo de armas de menor alcance que os mísseis Taepodong-2.

Na Coréia do Norte, a notícia que ganhou manchetes em várias partes do mundo foi ignorada pelos meios de comunicação estatais. A principal notícia da rádio oficial ontem era a visita do líder Kim Jong-il a uma fábrica.

A Península Coreana foi dividida em dois países em 1948, após a Segunda Guerra Mundial, e a fronteira entre o sul capitalista e o norte comunista foi motivo da violenta Guerra da Coréia (1950-1953), na qual morreram 2,5 milhões de pessoas. A guerra, tecnicamente, nunca acabou, já que não houve tratado de paz.

Mas os laços vinham se estreitando nos últimos anos. Os sinais estavam nos encontros entre parentes divididos pela fronteira, na ajuda financeira do sul para o norte, na abertura de uma estrada entre os países e nos freqüentes intercâmbios políticos e econômicos - um processo que pode voltar ao compasso de espera.