Título: DOENÇA DESCONHECIDA MATA MAIS UMA CRIANÇA
Autor: Aloysio Balbi
Fonte: O Globo, 11/07/2006, Rio, p. 17

Ratazana enviada viva de Campos é recusada pela Fiocruz e volta ao Norte Fluminense para ser sacrificada

CAMPOS. Mais uma morte de criança sem causa aparente assusta Campos, no Norte Fluminense, onde em um espaço de 40 dias quatro outras crianças morreram de uma doença ainda não diagnosticada. Há, porém, forte suspeita que elas tenham sido vitimas de hantavirose, doença transmitida por ratos e diferente da conhecida leptospirose. A quinta criança que morreu foi o bebê Kaira Fidélis, de apenas 4 meses. Ela estava internada há dois dias e morreu no domingo no Hospital Geral de Guarus (HGG), com um quadro de hemorragia pulmonar, semelhante ao apresentado pelas quatro crianças que morreram anteriormente.

O secretário de Saúde de Campos, Rodrigo Quitete, disse que, embora a criança que morreu no domingo morasse num bairro distante do Parque Santa Rosa, onde morreram as outras quatro, não pode descartar uma relação. Por isto determinou a retirada de vísceras e coleta de sangue para exames laboratoriais mais apurados. A situação é considerada preocupante e ontem a prefeitura anunciou um projeto de saneamento no Parque Santa Rosa, onde morreram as primeiras quatro crianças, que eram vizinhas.

Vigilância Sanitária interdita poços

A família de Kaira Fidélis, que reside no Parque Bandeirantes, área periférica também em Guarus, parte da cidade onde morreram as primeiras quatro crianças, não acredita que a causa da morte tenha sido alguma doença transmitida pelos ratos. Os parentes suspeitam que a criança tenha se sentido mal após tomar uma vacina em um posto de Saúde da prefeitura. O secretário Rodrigo Quitete, que é pediatra, confirmou que Kaira recebeu a segunda dose da vacina retroviral dias antes de morrer, mas não acredita que isto tenha provocado a morte.

Ontem a Vigilância Sanitária, o Centro de Controle de Zoonoses e técnicos da Secretaria de Saúde de Campos continuaram trabalhando nos quatro quarteirões interditados desde sábado passado no Parque Santa Rosa, onde morreram os irmãos Carolliny Teixeira, de 7 meses, e José Vítor Teixeira Pinheiro, de 4 anos; e os também irmãos Jéferson de Oliveira da Hora, de 8, e André Luís Ferreira da Hora Júnior, de 4 anos, que eram vizinhos. A Vigilância Sanitária decidiu interditar poços artesianos de várias residências, inclusive das casas onde morreram as crianças. O fornecimento está sendo feito por caminhões pipas em caixas d¿água que foram instaladas. A água dos poços está sendo analisada.

Uma viagem inútil de 300 quilômetros

A ratazana que técnicos do Centro de Controle de Zooneses de Campos capturaram em uma armadilha no domingo foi levada ontem para a Fundação Oswaldo Cruz, no Rio, para que testes laboratoriais indicassem se ela poderia ser o vetor da doença que matou as crianças. A ratazana de 20 centímetros e cega de um olho foi capturada dentro de uma das casas onde moravam duas das crianças que morreram e onde também os técnicos encontram ninhos de ratos em um colchão e várias tocas de roedores.

Mesmo fazendo uma viagem de 300 quilômetros, a ratazana teve que retornar a Campos. Segundo o Centro de Controle de Zoonoses de Campos, a Fiocruz não aceitou o animal vivo, admitindo que o procedimento correto seria sacrificar a ratazana e enviar para a Fiocruz suas vísceras. Sendo assim, a ratazana voltou para Campos na noite de ontem e hoje será sacrificada para a retirada dos órgãos, que retornarão para exames na Fiocruz.

Também ontem agentes de saúde continuaram a coleta de sangue das famílias que moram nos quatro quarteirões interditados no Parque Santa Rosa. Ao mesmo tempo uma equipe foi mobilizada para uma inspeção na residência onde morava o bebê que morreu no domingo no Parque Bandeirantes. Ontem o Instituto Médico-Legal (IML) de Campos divulgou o laudo da morte de uma das crianças ¿ Jéferson Oliveira da Hora ¿ atribuindo-a a um mal súbito, ou seja, sem causa determinada. As vísceras foram enviadas ao Instituto Carlos Eboli, no Rio, para exames mais detalhados.

A Secretaria estadual de Saúde enviará hoje a Campos sanitaristas especializados em controle epidemiológico para ajudar as equipes do município. Os sanitaristas deverão concentrar o trabalho nos quarto quarteirões interditados e ouvir parentes das crianças que morreram. O monitoramento nesses quarteirões vai continuar por tempo indeterminado como disse ontem o secretário Rodrigo Quitete.

Tratadores estão espalhados pelo bairro fazendo limpeza de terrenos baldios, e técnicos do Centro de Controle de Zoonoses iniciaram um trabalho de desratização espalhando em pontos estratégicos das casas pastilhas que atraem e matam os roedores.