Título: CPI investiga suspeitas em mais uma pasta
Autor: Jaílton de Carvalho
Fonte: O Globo, 12/07/2006, O País, p. 10

Integrante da comissão defende mudança nos critérios para apresentação e aprovação de emendas parlamentares

CUIABÁ. A CPI dos Sanguessugas investiga indícios de que a máfia acusada de fraudar vendas de ambulâncias e ônibus escolares teria atuado também no Ministério das Comunicações. Integrantes da organização teriam desviado dinheiro destinado à compra de ônibus com computadores do Programa de Inclusão Digital financiado, em parte, pelo ministério. A Polícia Federal, o Ministério Público e a CPI já investigavam incursões de parlamentares e empresários da organização nos ministérios da Saúde, da Educação e da Ciência e Tecnologia.

- Surgiram indícios de envolvimento de setores do Ministério das Comunicações. Pelo menos um projeto já foi identificado entre as fraudes - afirmou o vice-presidente da CPI, Raul Jungmann (PPS-PE), depois de participar do interrogatório de Ronildo Medeiros, um dos supostos chefes da organização dos sanguessugas.

Segundo Jungmann, os indícios de irregularidades foram detectados num projeto de compra de ônibus do Programa de Inclusão Digital, uma iniciativa do governo federal para assegurar o acesso à internet a pessoas de baixa renda. O projeto foi lançado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), mas tem apoio de outros setores do governo. Integrantes da máfia confirmaram ontem à CPI que, depois da exploração das ambulâncias, um dos maiores alvos do grupo eram as licitações para as compras das unidades digitais, os ônibus equipados com computadores, a partir de emendas parlamentares.

Jungmann: escândalo de "dimensões trágicas"

A CPI também descobriu fraudes na compra de seis ônibus, dois novos e quatro usados, com recursos do Finep - Financiadora de Estudos e Projetos, empresa pública vinculada ao MCT, que é uma das principais financiadora de pesquisas do país. Os ônibus foram comprados por três organizações não-governamentais a partir de emendas de deputados ao Orçamento da União. O fundo desembolsou R$1,7 milhão no negócio. Foram R$700 mil em dois ônibus novos e R$1 milhão para os quatro usados. A diretoria da Finep confirmou ao GLOBO as fraudes desde a semana passada. Relatório interno também aponta as irregularidades descobertas pela CPI.

- Mas os detalhes do caso só serão divulgados depois que as partes apresentarem a defesa - disse uma das assessoras da presidência do fundo.

Sobre as fraudes com emendas de diferentes programas e ministérios, Raul Jungmann disse que o Congresso Nacional deve reformular o mais cedo possível o sistema de elaboração do Orçamento. Segundo o deputado, o comércio de emendas entre parlamentares e empresas interessadas em verbas de licitações públicas é de uma dimensão trágica, igual ou superior ao superescândalo investigado pela CPI do Orçamento no início da década passada. O escândalo devorou reputações, inclusive a do ex-presidente da Câmara Ibsen Pinheiro.

- Do jeito que está não adianta só fazer investigação. Isso aqui virou um mercado persa com um percentual elevado de parlamentares participando do jogo - disse o deputado.

Ministérios afirmam que auditorias nada encontraram

Os ministérios das Comunicações e da Ciência e Tecnologia informaram que não detectaram, em suas auditorias, desvios no uso dos recursos das emendas parlamentares. O Ministério das Comunicações divulgou nota ontem rebatendo a suspeita de que a quadrilha dos sanguessugas tenha atuado também na pasta. Segundo a nota, até o momento não foi detectado qualquer irregularidade na liberação de recursos do ministério, comandado por Hélio Costa.

"O Ministério das Comunicações conta com auditor que faz acompanhamento permanente dos processos de liberação de recursos. Por ora, essa checagem não detectou qualquer irregularidade. Mesmo assim, o trabalho continua", diz a nota. O ministro não quis se manifestar pessoalmente sobre as denúncias.

AMBULÂNCIAS COM PROPINA

A chamada máfia dos sanguessugas é uma organização acusada de vender ambulâncias, unidades digitais móveis e ônibus escolares superfaturados a prefeituras. O empresário Luiz Antônio Trevisan Vedoin, dono da empresa Planam, é apontado como um dos chefes da organização, encarregado de negociar e pagar propinas aos parlamentares em troca da apresentação de emendas favoráveis às empresas do grupo.

Em depoimento à Polícia Federal, a ex-assessora especial do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino revelou o funcionamento do esquema. A Controladoria Geral da União chegou a um segundo grupo de fraudadores a partir da análise de 300 contratos. Os fiscais descobriram indícios de irregularidades em 90% dos contratos, o que deflagrou uma devassa em caráter de urgência mais três mil prestações de contas de compras de ambulâncias do Ministério da Saúde em vários estados.