Título: DENÚNCIA ATINGE FORNECEDOR DA APPLE
Autor: Gilberto Scofield Jr.
Fonte: O Globo, 16/07/2006, Economia, p. 37

Abuso é investigado no país onde milhares morrem por excesso de trabalho

PEQUIM. O receio sobre as conseqüências da alta dos salários foi abrandado depois que Tang Kuang, professor da Escola de Relações de Trabalho e Recursos Humanos da Universidade Popular da China, disse à prestigiada revista ¿Beijing Review¿ que o país continuará a atrair investimentos. Segundo ele, além de o estoque de mão-de-obra ainda ser gigantesco (estima-se que 250 milhões de pessoas migrarão para as cidades nos próximos cinco anos), a China tem dois outros atrativos imbatíveis: uma infra-estrutura impecável e um mercado de consumo potencial incomparavelmente grande.

É fato que a China precisa desesperadamente gerar empregos, ainda que ordinários, mas os direitos trabalhistas estão longe dos concedidos por países mais desenvolvidos. Mês passado, por exemplo, a Apple Computer se viu em meio a acusações de uso aviltante de mão-de-obra nas fábricas da empresa taiwanesa Foxconn, em Longhua. A Foxconn é fornecedora da Apple e monta iPods, um dos mais vendidos (e caros) aparelhos multimídia. A Apple prometeu investigar as denúncias na fábrica de 200 mil funcionários, que adota jornadas de 15 horas, paga salários de US$50 por mês e proíbe visitas nos dormitórios para cem pessoas.

A Confederação Americana do Trabalho, que reúne federações de trabalhadores dos EUA e do mundo, entrou com uma queixa junto ao Congresso e ao Executivo americanos em junho, pedindo providências contra os produtos chineses. A organização alega que o país viola direitos dos trabalhadores ao reprimir greves, proibir a formação de sindicatos independentes e fechar os olhos para as empresas que desrespeitam as leis trabalhistas. A Confederação afirma que o custo do trabalho na China responde por apenas 13% do custo total dos produtos manufaturados no país.

Desrespeito continua apesar de avanço na lei

O próprio governo da China admite que o custo trabalhista é ínfimo. No setor de manufaturados chineses, equivale a 2,2% dos custos americanos, 2,1% dos japoneses e 2,8% dos europeus. Comparado com outros países em desenvolvimento, como Polônia, o custo ainda é competitivo: entre 15% e 20%.

¿ Mesmo se as empresas chinesas resolverem dobrar os benefícios trabalhistas, o impacto disso no preço final dos produtos é coisa de centavos ¿ diz a pesquisadora Anita Chan.

Para ela, a legislação de proteção trabalhista na China melhorou muito nos últimos dez anos, mas a maioria das empresas desrespeita os direitos. Segundo recente reportagem no Chinanews.com, o serviço de notícias online estatal chinês, a China é hoje um dos países com a maior jornada de trabalho do mundo e, a cada ano, cerca de 600 mil chineses morrem devido a doenças relacionadas a excesso de trabalho. (Gilberto Scofield Jr., correspondente)