Título: A contradição
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 17/07/2006, O Globo, p. 2

O presidente da República que vier a ser eleito enfrentará dificuldades políticas para manter ou aprofundar o ajuste fiscal iniciado em 1999, no governo tucano, e mantido na gestão petista. a tensão entre o Congresso, sempre disposto a aumentar os gastos públicos, e o Executivo, comprometido com o equilíbrio fiscal, vai persistir. Por isso, montar uma base governista será um desafio.

Desde a gestão do presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992) que os governos brasileiros, com maior ou menor ímpeto, adotam medidas liberais ou neoliberais na economia e nas finanças públicas. a adoção destas políticas, impostas pela necessidade, se choca com a falta de um suporte político claro e definido. O Brasil não tem um forte partido que assuma como bandeira a defesa do liberalismo. O PFL, que mais se aproxima disso, tem como seu maior legado a aprovação de um Fundo de Combate à Pobreza, enquanto dava apoio a um governo que aumentou a carga tributária de 29,74%, em 1998, para 35,61% do PIB, em 2002.

O predomínio do pensamento social-democrata sobre a política e os partidos brasileiros, já descrito pelo economista Paulo Guedes, tem gerado uma tensão permanente entre os governos e suas bases parlamentares. Esse embate se verificou nos oito anos do governo Fernando Henrique e nos três anos e meio do governo Lula. Para os governos brasileiros, a integração financeira internacional representa uma camisa-de-força que os condiciona a adotar medidas e políticas, pois nenhum presidente se arriscaria a enfrentar uma crise. Por outro lado, o Congresso é dominado por partidos que não têm compromisso com esta circunstância e que elegem seus representantes prometendo mundos e fundos aos eleitores. a pressão pelo aumento dos gastos públicos e pela ampliação das políticas assistenciais continuarão dando a tônica na atuação do PT, que elegeu 17,7% dos deputados nas eleições de 2002, e do PMDB, que elegeu 14,4%. Esta também é a postura de outros 33,3% dos deputados que em 2002 foram eleitos pelo PTB, PL, PP, PSB, PDT, PPS, PCdoB e PV. Mesmo nos partidos mais comprometidos com ajustes liberais, o PSDB, que elegeu 13,8% dos deputados em 2002, e no PFL, cuja bancada representa 16,3% da Câmara, não existe unanimidade. Entra governo, sai governo e permanece a divisão política sobre o que se deve fazer.