Título: GRANDES ACIONISTAS DA PERDIGÃO REJEITAM SADIA
Autor: Aguinal Novo, Patricia Eloy e Martha Beck
Fonte: O Globo, 19/07/2006, Economia, p. 30

Fundos de pensão e Weg, que detêm 55,38% do capital, criticam oferta. CVM investigará suspeita de vazamento

SÃO PAULO, BRASÍLIA e RIO. Os grandes fundos de pensão e a fabricante de motores Weg, detentores de 55,38% do capital da Perdigão, recusaram ontem a proposta para vender suas ações, feita na véspera pela Sadia. Eles disseram que o preço de R$27,88 por ação ¿não atende às expectativas dos acionistas¿. Com isso, caiu por terra mais uma tentativa da Sadia de arrematar o controle da concorrente, representada pela posse de pelo menos 50% mais uma ação de seu capital.

Ainda que houvesse entendimento sobre o preço, a Perdigão afirmou que a proposta da Sadia feriu seu estatuto social e, por isso, não teria validade jurídica. A Sadia fez uma oferta pública por 100% do capital pagando R$27,88 por ação, valor que inclui um prêmio de 35% sobre a cotação média nos últimos 30 dias. Segundo a Perdigão, a Sadia só poderia fazer essa oferta se já tivesse pelo menos 20% de seu capital.

¿ Isso não se aplica à Sadia, que não detém ou não informou deter nenhuma ação na nossa empresa ¿ afirmou o presidente da Perdigão, Nildemar Secches.

Presidente da Perdigão diz que preço-alvo é de R$37

A regra está prevista no artigo 37 do novo estatuto social da Perdigão, válido desde o ingresso da companhia no Novo Mercado da Bovespa. Na prática, isso não inviabiliza a possibilidade de a Sadia apresentar uma nova proposta. Primeiro, a empresa teria de adquirir uma participação relevante do capital da Perdigão, para depois fazer uma oferta aos demais acionistas, o que acabaria inflando o valor final da compra.

Em nota, a Sadia anunciou que mantém sua oferta original e ressalta que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) não viu até agora qualquer incongruência jurídica na proposta. Para a empresa, a leitura da Perdigão seria ¿inteiramente equivocada e em dissonância com a melhor interpretação¿ do seu próprio estatuto. A Sadia não menciona a recusa do preço, mas afirma que sua oferta ¿é transparente e democrática para 100% dos acionistas, está em perfeita consonância com o mercado de capitais¿.

¿ Eles até podem recorrer à CVM, mas será infrutífero, porque os principais acionistas não aceitaram o preço ¿ respondeu Secches.

Ele disse que tanto forma como preço tiveram papel relevante na decisão de rejeitar a oferta, mas não rechaçou a possibilidade de a negociação ser retomada em outros termos. Pelas avaliações apresentadas por Secches, o chamado preço-alvo das ações da Perdigão, que indica o potencial de retorno para os acionistas, varia entre R$35 e R$37.

A Perdigão tem hoje capital pulverizado na bolsa de valores, mas isso não impede haver um bloco majoritário. A Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil, e o Petros, dos empregados da Petrobras, detêm juntos 26,94% do capital. Somados a outros fundos, como Valia (Vale do Rio Doce) e Sistel (empresas de telefonia), eles chegam a 49,8%. O bloco de controle é completado pela Weg, com 5,45% das ações. Secches negou que isso interfira no interesse dos minoritários:

¿ Cada um dos acionistas está livre para dispor de suas ações. Não existe isso.

A oferta hostil ¿ assim chamada por não haver consulta prévia aos maiores acionistas ¿ da Sadia pela Perdigão poderá ajudar as autoridades de defesa da concorrência a julgar a operação. Isso porque, segundo fontes que acompanham a análise do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), como uma das partes se opõe à operação, ela não tentará influenciar os conselheiros com dados favoráveis.

¿ No caso Nestlé-Garoto, quando as empresas eram questionadas sobre a concentração de mercado, elas davam sempre os mesmos números. Mas desta vez, isso pode não acontecer. A Perdigão provavelmente fará questão de dar informações cruas ¿ disse a fonte.

A CVM pediu na noite de segunda-feira esclarecimentos à Sadia devido à forte alta de suas ações na última semana. Os papéis subiram 17,65% entre 10 e 17 de julho, levantando suspeitas de vazamento de informações. Embora as ações da Perdigão tenham disparado 32,92% no período, a CVM informou que o pedido se restringiu à Sadia porque ela fez a oferta.

Ontem, os papéis com direito a voto da Perdigão subiram 0,18% e os preferenciais da Sadia ¿ com prioridade no recebimento de dividendos ¿ caíram 3,87%. Já as ações com direito a voto da Sadia, com menor liquidez, avançaram 11,14%.

Fusão poderia acabar com pequenos produtores

José de Sousa, presidente da Bolsa de Gêneros Alimentícios do Rio, alerta que a calmaria dos mercados de carne e frango pode acabar se as empresas se unirem. E o consumidor terá de ficar atento aos preços:

¿ Essa união pode representar o fim de muitos pequenos produtores, além de um monopólio do mercado. A Sadia pode vir a dominar 70% do mercado nacional. E até que ponto isso é bom?