Título: COMERCIANTE SE TORNA A 7ª VÍTIMA DO BRASIL NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E HEZBOLLAH
Autor: Carol Knoploch, Leonardo Valente e Isabel Braga
Fonte: O Globo, 20/07/2006, O Mundo, p. 32

Fábrica de político de São Bernardo do Campo foi atingida por míssil. Brasileiros no Líbano temem intensificação de ataques após saída de estrangeiros, e Itamaraty tenta acordo com Israel

SÃO BERNARDO DO CAMPO, RIO DE JANEIRO e BRASÍLIA. ¿Era o pilar da família. Dib criou todos nós¿, contou Omar Barakat. ¿Era o nosso líder. Desabou a casa¿, completou o Habib Barakat. Foi assim que definiram o irmão Dib Barakat, de 60 anos, que morreu ontem, após um bombardeio israelense à cidade de Sultan Yakubi, conhecida como Lucy, no Líbano. Dib é o sétimo brasileiro a morrer no país no fogo cruzado entre Israel e Hezbollah.

Ele trabalhava em sua fábrica de móveis, quando morreu. Além dele, outra pessoa foi morta e quatro ficaram feridas.

¿ Ele tinha acabado de receber um carregamento de madeira do Brasil. Acho que confundiram com armamento ¿ contou o irmão Adib.

Dib, que foi enterrado em Lucy, na região do vale do Bekaa, era casado, tinha dois filhos e cinco netos. Durante o enterro, mísseis israelenses atingiram as proximidades do cemitério.

O comerciante, que morava no Líbano há 8 anos, foi subprefeito de Riacho Grande, distrito de São Bernardo do Campo, nos anos 80. Ficou desgostoso com a política após um amigo ser assassinado. Dib, nascido no Líbano, veio para o Brasil na década de 60. No início, trabalhou como mascate. Depois abriu loja de móveis e de tecidos. A política, segundo Omar, foi passageira.

¿Tinha gosto mesmo pelo comércio ¿ disse Omar, acrescentando que ainda assim fez vários amigos políticos, inclusive o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No Líbano, desespero e críticas ao Itamaraty

A família recebeu a notícia por volta das 3h (hora local), quando uma sobrinha telefonou.

¿ Falei com Dib por telefone no domingo. Ele estava tranqüilo ¿ disse Habib.

A comunidade libanesa calcula em 70 mil o número de brasileiros no Líbano.

Entre os brasileiros que não conseguem sair do Líbano, o clima é de pavor e revolta. Najra Assef entrou em contato com o consulado em Beirute para pedir ajuda. Foi aconselhada a ir para a capital.

¿ Peguei o carro, arriscando a vida da minha família. Uma viagem que duraria uma hora, levou dez. Ao chegarmos, exaustos e sem dinheiro, o consulado disse que nada poderia fazer pois não tinha estrutura para tirar muita gente do país. Por sorte, fomos abrigados num bairro cristão. Não sabemos o que fazer. O Brasil não nos ajuda.

Fátima Bonnauy Salid, que mora em Santos, vive drama parecido. Há dois meses de férias no Líbano, teve ajuda negada pelo consulado e teve que partir para as montanhas de Trípoli para fugir dos bombardeios.

¿ Fomos ignorados. A água e a comida estão acabando. Se o Brasil não nos ajudar, vamos morrer. Americanos e europeus estão conseguindo ajuda para sair. Segundo libaneses, quando eles estiverem fora os ataques serão piores. Estou com vergonha do meu país.

O chanceler Celso Amorim recebeu ontem, no Itamaraty, a família Barakat, além de representantes da comunidade libanesa e dos deputados federais Jamil Murad (PCdoB-SP) e Vicentinho (PT-SP). Mohamed Barakat, sobrinho de Dib, disse que objetivo era pedir que o governo federal intensifique as ações para retirar os brasileiros do Líbano.

Após a reunião, o chanceler informou que o Brasil vai tentar um acordo com Israel para garantir uma espécie de salvo conduto para a retirada de brasileiros. Amorim, informou que irá chamar a embaixadora de Israel no país, Tzipora Rimón, para uma conversa hoje no Itamaraty. O Brasil vai também tentar outros contatos, seja com a ONU ou com países que possam ter influência na situação. Ele reconheceu que há problemas com o telefone do consulado, uma das queixas citadas por brasileiros.

¿ Não temos frota de aviões que possa transportar todos. Estamos fazendo o que podemos.

*Do Diário de S. Paulo