Título: OBESIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS
Autor: Vivian Braga
Fonte: O Globo, 21/07/2006, Opinião, p. 7
Uma pesquisa divulgada recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) trouxe números alarmantes sobre obesidade no país, especialmente a infanto-juvenil. Entre os adolescentes de 10 a 19 anos, 16,7% sofrem de excesso de peso. Constatou-se que este problema é maior nas famílias mais ricas (apesar de também afetar significativamente as mais pobres), que moram em áreas urbanizadas, e incide mais sobre os meninos do que as meninas.
Esta realidade traz à tona para o debate não apenas os fatores que determinam os padrões de consumo de alimentos no país, mas também a necessidade de estarmos atentos e abertos a novas políticas públicas voltadas para a questão alimentar.
Sabe-se que o hábito alimentar de cada pessoa, grupo ou sociedade é determinado por inúmeros fatores associados - biológicos, geográficos, psicológicos e culturais, além dos econômicos. Culturalmente, alguns estudiosos reconhecem o papel da família como fundamental nessa formação: as mães são as principais responsáveis pelo alimento que entra em casa, embora a participação da criança neste momento também seja importante.
No caso específico do "gosto infantil", há forte atração por doces e frituras. Além da idade, observa-se que diferentes pressões sociais geram diferenças de comportamento. No que diz respeito aos meninos, alguns estereótipos exigem que eles manifestem mais interesse diante dos alimentos. Entre as meninas, as preocupações dietéticas vinculadas à estética interferem no paladar. Isto para não falar da publicidade, que agrega aos alimentos símbolos e significados, estabelece hierarquias, alcança os desejos e, portanto, mexe com as emoções.
Outro fator que não pode ser negligenciado é o próprio modelo de produção alimentar e sua estreita relação com o crescimento da obesidade, independentemente de categorias sociais. Isto porque a indústria não está voltada exclusivamente para atender a nossas necessidades, mas também (e principalmente) para induzir ao consumo - e sobretudo de produtos distribuídos em escala maciça para os pontos de revenda, a maioria ricos em calorias e pobres em nutrientes.
É bem verdade que os alimentos industrializados considerados saudáveis - como os diets, massas integrais, produtos com zero por cento de gordura, sem conservantes - ganham espaço nas prateleiras dos supermercados. Os alimentos orgânicos, como alternativa in natura e produzidos sem agrotóxicos, também estão cada vez mais presentes nas grandes redes: as vendas crescem, embora, de acordo com dados divulgados recentemente pelo GLOBO, sua produção e consumo representem menos de 1% da agropecuária brasileira.
Diante deste quadro, como pensarmos em políticas públicas voltadas para a melhoria da qualidade de alimentação, em especial a dos jovens? Em primeiro lugar, será necessário facilitar o acesso aos produtos saudáveis, tornando-os disponíveis no mercado a preços mais baixos. Mas também - e isto é importante - difundir de modo contínuo informações sobre alimentação, já que muitas vezes há desconhecimento sobre o que consumimos de fato. Para trilharmos este caminho, as iniciativas públicas (como cartilhas, filmes para TV, regulação da publicidade para se evitar abusos) precisariam caminhar juntamente com medidas que incentivem a diversidade alimentar, tanto no âmbito da produção quanto da comercialização.
Políticas voltadas para a melhora de nossos hábitos alimentares não são apenas uma questão nutricional: implicam, por exemplo, valorização de culturas alimentares regionais e inclusão de pequenos produtores nos mercados. São ações que podem contribuir não só para a saúde pública como para a promoção do desenvolvimento econômico com base em vocações locais e no fortalecimento da cidadania.
VIVIAN BRAGA é pesquisadora do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase).
Precisamos facilitar o acesso aos produtos saudáveis e informar melhor sobre alimentação