Título: Brasil organiza mais três vôos de resgate
Autor: Leonardo Valente/Demétrio Weber/Fabiula Wurmeister
Fonte: O Globo, 21/07/2006, O Mundo, p. 37
O primeiro deve partir da Turquia no domingo. País tem maior número de mortos em conflito desde a Segunda Guerra
BRASÍLIA, RIO DE JANEIRO e FOZ DO IGUAÇU. O Itamaraty anunciou ontem que a Força Aérea Brasileira (FAB) vai realizar mais três vôos, a partir de domingo, para retirar brasileiros que estão no Líbano. Os aviões sairão de Adana, na Turquia. Está previsto um vôo no domingo, um na segunda-feira e outro na terça. O Itamaraty estuda também o uso de embarcações para retirar brasileiros da zona de conflito pelo mar, mas teme pela falta de segurança. O destino, nesse caso, seria o Chipre. Os vôos para o Brasil poderão ser retomados a partir de quinta-feira.
O coordenador do grupo de apoio aos brasileiros no Líbano, embaixador Everton Vieira Vargas, disse que o número de brasileiros mortos no conflito é o maior desde a Segunda Guerra Mundial. Até ontem, eram sete. Ele afirmou que todos que procurarem embaixadas e consulados serão atendidos:
- A sociedade brasileira nunca nos perdoará se formos sovinas - disse Vargas.
Brasil terá escritório de emergência em Adana
Como o Líbano está sitiado por tropas de Israel, o governo brasileiro precisa primeiro levar os moradores por terra, de ônibus, até a Turquia. O Itamaraty registra a presença de cerca de 400 brasileiros em Beirute e outros mil no Vale do Bekaa. Outros 150 estão em Damasco, na Síria, e também deverão deixar a região em vôos da FAB.
Hoje está prevista a saída de dois comboios de ônibus: um de Beirute e outro de Damasco. O Itamaraty está deslocando quatro diplomatas e funcionários para um escritório de emergência para dar suporte em Adana.
O chanceler Celso Amorim pediu ontem à embaixadora de Israel, Tzipora Rimon, que os comboios não sejam alvo de Israel. Amorim também conversou ontem por telefone com a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice. Ele pediu proteção aos brasileiros e defendeu um cessar-fogo imediato.
O embaixador Everton Vargas disse que o governo já entrou em contato com empresas marítimas para alugar barcos que transportariam os brasileiros do Vale do Bekaa até Chipre. Não há garantia, porém, de que os moradores possam ser retirados dos vilarejos em segurança. Vargas descartou o pagamento, pelo governo, de passagens aéreas. Mas disse que o Itamaraty está em contato com a comunidade libanesa no Brasil para localizar cidadãos na região e pedir apoio no sentido de pressionar companhias aéreas para endossar bilhetes. A idéia é que passagens do Líbano para o Brasil sejam convertidas em bilhetes para destinos fora da área de guerra.
No encontro com Amorim, a embaixadora de Israel pediu detalhes sobre os trajetos e os comboios. Ela prometeu empenho para garantir a segurança da retirada dos brasileiros:
- Faremos todo o possível - disse ela.
Brasileiros querem ir à região ajudar parentes
Pouco após ser oficializada a venda para a VarigLog, o presidente da Varig, Marcelo Bottini, afirmou que a empresa está providenciando formas de buscar os brasileiros no Líbano. De acordo com ele, há negociações em andamento com uma empresa de leasing, que cederia um avião, e com a BR Distribuidora, que entraria com combustível. A Varig cederia a tripulação.
No Líbano, o drama das famílias brasileiras é cada vez maior. Nadim Aboul Hosn e sua mulher Afaf Aboul Hosn, de férias no país há 20 dias, não conseguiram entrar no grupo que está sendo retirado pelo Itamaraty e tiveram que se esconder nas montanhas do norte do país para fugir dos bombardeios.
- O consulado disse que não tinha como nos incluir. Estamos sem dinheiro para fugir por conta própria. Nosso vôo partia de Beirute, mas o aeroporto foi destruído. O alimento e a água estão acabando e temo pela minha família - disse ele.
Ahmad Sahyoun, de São Paulo, está há 15 dias em Beirute com a mulher e duas filhas.
- Tento tranqüilizar minha família mas não consigo mais, estou apavorado. Não temos condições de seguir para a Síria. Ouvimos as bombas o dia todo.
Outros, no Brasil, querem fazer o caminho inverso. Sem notícias dos parentes, alguns estão viajando para a região. Muitos tentam conseguir um dos 160 lugares disponibilizados pelo governo no Boeing da FAB que sairá hoje da Base Aérea do Galeão, no Rio, para Adana, Turquia. Na tentativa de resgatar a esposa e filhos que conseguiram chegar a Damasco, um comerciante de Foz do Iguaçu deve embarcar hoje para a Síria. Mais duas pessoas embarcam esta semana.
- Mesmo com o perigo, estas pessoas dizem que o melhor é estar perto da família e tentar trazê-la de volta - disse Zaki Moussa, dono de uma agência de viagens em Foz do Iguaçu.
Fugindo da guerra
Alguns países, como Reino Unido e Dinamarca, montaram suas maiores operações de evacuação desde a Segunda Guerra Mundial.
EUA: Criticados no início pela demora na operação e pela possibilidade de cobrarem pelo resgate, os Estados Unidos já retiraram cerca de 2,6 mil pessoas desde domingo. Nove navios estão envolvidos na operação, além de helicópteros.
REINO UNIDO: Seis navios, incluindo dois porta-aviões, estão sendo usados para retirar os britânicos. Cerca de 5 mil devem deixar o Líbano por estes dias.
ÍNDIA: Quatro navios de guerra estão a caminho para retirar cerca de 12 mil pessoas; 49 foram levados de ônibus para a Síria.
DINAMARCA: Cinco mil já foram levados de ônibus para a Síria e de barco para o Chipre.
FRANÇA: Com mais de 17 mil cidadãos no Líbano, o país já retirou pelo menos 2 mil franceses. Hoje deve retirar mais 1,2 mil.
ALEMANHA: Já retirou cerca de 3,5 mil.
ITÁLIA: Cerca de 600 italianos já deixaram o Líbano e mais 400 deveriam sair ontem.
SUÉCIA: Retirou cerca de 5 mil.
BRASIL: Já retirou 98 pessoas de avião, a partir da Turquia. Novos vôos estão programados.
AUSTRÁLIA: Cerca de 7,5 mil querem partir. Já tirou 200 de ônibus. Dois navios devem chegar hoje à região.
Tento tranqüilizar minha família mas não consigo mais, pois estou apavorado
AHMAD SAHYOUN
Brasileiro em Beirute
A sociedade brasileira nunca nos perdoará se formos sovinas
Everton Vieira Vargas
Embaixador e coordenador do grupo de apoio aos brasileiros no Líbano
Especial para O GLOBO
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