Título: Lendas sobre o segundo turno
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 22/07/2006, O Globo, p. 2

A conversa palpitante nas campanhas agora é sobre o segundo turno apontado pela última pesquisa Datafolha. Os petistas, a começar pelo próprio Lula, não falam em evitá-lo, mas em táticas para ganhá-lo. E acham que ganham. Heloísa Helena trabalha para chegar lá. Tucanos e pefelistas acham que, se ele ocorrer, a vitória está no papo.

O presidente do PFL, Jorge Bornhausen, tem dito que é batata: candidato à reeleição que não ganhar no primeiro estará rifado no segundo. Cita como exemplos os prefeitos Cesar Maia (PFL-RJ) e Fernando Pimentel (PT-BH), que ganharam no primeiro em 2004. E Marta Suplicy (PT-SP) e Raul Pont (PT-PA) como exemplos de capotagem no segundo turno.

Há exemplos que contradizem essa regra, e também os há contra a crença que parece embalar os petistas, a de que o primeiro colocado no primeiro turno está destinado a ganhar no segundo.

Em 1998, Mario Covas enfrentou Maluf no segundo turno e ganhou, com a agravante de ter chegado em segundo lugar. Em 1990 houve segundo turno para governador em 12 estados. Em nove, o vencedor do primeiro turno ganhou. Em três, houve virada a favor do segundo colocado. Foram eles Edison Lobão (MA), contra João Castelo, Roberto Requião (PR), contra José Carlos Martinez, e Oswaldo Pianna (RO), contra Valdir Raupp. Em 1994 houve 18 eleições decididas em segundo turno. Em 14 delas o vencedor do primeiro turno ganhou, e em quatro o segundo colocado venceu de virada.

A Mosaico Consultoria Política analisou 121 eleições brasileiras que foram ao segundo turno ¿ presidenciais, de governador e de prefeito. Em 33 delas, ou em 27%, houve virada a favor do segundo colocado. Segundo Alexandre Marinis, diretor da Mosaico, a probabilidade de uma virada é significativamente menor se o primeiro colocado alcançar dez pontos percentuais ou mais de vantagem sobre o segundo. Como a diferença entre Alckmin e Lula hoje é de 16 pontos percentuais, segundo o último Datafolha (Lula 44, Alckmin, 28), para pensar em virada o tucano terá que reduzir essa diferença: crescendo e derrubando Lula.

Das 33 viradas analisadas, nada menos do que 27 (82% do total) ocorreram quando a diferença de votos válidos entre os vencedores do primeiro turno foi inferior a dez pontos percentuais. Apenas seis viradas (18% do total) aconteceram quando a diferença era maior.

Se as estatísticas e a história eleitoral valem alguma coisa, nada está perdido, nada está ganho. Nem é certo que a senadora Heloísa Helena está destinada a forçar o segundo, mas a ficar no terceiro lugar.

As mulheres nesta eleição

Dos 5.402 candidatos a deputado federal, 4.728 são homens e 674 mulheres, informa o TSE. Vale dizer, 87,5% de homens contra 12,5% de mulheres. Do total de 19.166 candidatos a todos os cargos, em todo o país, apenas 13,95% são mulheres. Esse quadro sugere que não haverá avanço significativo da participação das mulheres, principalmente na Câmara, embora elas representem 51,53% do eleitorado.

Esses números informam também que os partidos, em geral, não cumpriram a regra da cota, que reserva 30% das candidaturas para mulheres. Há controvérsias sobre os efeitos que as cotas vêm produzindo: se as mulheres tinham 6,2% das cadeiras da Câmara antes de 1998, ano em que a regra passou a vigorar, na eleição daquele ano elas conquistaram apenas 5,6% das cadeiras. Em 2002, chegaram aos atuais 8,18%. Por outro lado, o número de deputadas estaduais cresceu 33% de 1998 para cá.

Alegam os partidos que não conseguem preencher a cota por falta de interessadas. Umas das razões desse desinteresse certamente é o realismo feminino. Se não terão dinheiro e recursos para competir com os homens em sistema de lista aberta, para que disputar? O acesso ao dinheiro eleitoral, com o sistema que temos, tem lá seu viés machista-calculista. Sabendo que mulheres têm menos chances de se eleger, os financiadores investem menos nelas.

As cotas só serão um instrumento mais eficaz quando for adotado o financiamento público de campanhas e também a lista fechada de candidatos. Só a lista, com o voto no partido e não nos indivíduos, trará maior equilíbrio. Está em discussão na Espanha um projeto do PSOE garantindo a alternância na lista. Um homem, uma mulher. Um luxo que é preciso cobiçar para melhorar qualidade da representação.

A língua de HH

A senadora Heloísa Helena chamou os ministros Luiz Dulci e Tarso Genro de canalhas. Tarso a criticara mesmo, pondo em dúvida seu perfil ¿de esquerda¿. Dulci se diz chocado:

¿ Não entendi a razão do insulto e da grosseria, pois nem sequer mencionei o nome dela. Nos 15 anos em que convivemos, divergi da senadora muitas vezes mas sempre a respeitei ¿ diz o ministro.

Enquanto ofender políticos, a senadora nada perde. Talvez ganhe mais votos. Mas ela está ofendendo também eleitores, quando diz que o Bolsa-Família gera ¿mendigos¿. Quem ganha a bolsa não gostará de ser chamado assim.