Título: Eletrodomésticos `made in US$¿
Autor: Cássia Almeida e Fabiana Ribeiro
Fonte: O Globo, 23/07/2006, Economia, p. 31

Desvalorização do dólar favorece agora compra de geladeiras, fogões e TVs

Depois dos alimentos, das roupas e dos calçados, chegou a vez dos eletrodomésticos e automóveis importados ganharem o mercado brasileiro, favorecidos pelo dólar barato, que já sofreu desvalorização de 5,38% este ano, depois de cair 12,4% no ano passado. O movimento ficou mais forte este ano e a importação de televisores, por exemplo, ficou 410% acima do ano passado. Os percentuais se assemelham quando se observa a quantidade de geladeiras vindas do exterior: houve alta de 202,1% no primeiro semestre contra o mesmo período de 2005. De janeiro a junho, a importação de bens de consumo duráveis como um todo subiu 51% frente ao ano passado. Foram US$2,576 bilhões, este ano, contra US$1,703 bilhão no primeiro semestre de 2005. E o ritmo da importação desses produtos tem crescido, de janeiro a maio, a média diária de compras externas aumentara 49%:

¿ Há uma expectativa do governo de que as importações cresçam mais que as exportações este ano. E diante da expansão da economia, acredito que o ritmo da importação de bens duráveis se mantenha nesse patamar ou até aumente um pouco ao longo do ano. É movimento natural, não há um surto de importações ¿ disse Fábio Faria, diretor de Planejamento e Estatística do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Mais 60% de eletroeletrônicos

A Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) já percebeu essa concorrência no mercado brasileiro. Pelas contas da entidade, a presença de eletroeletrônicos no mercado interno aumentou 60% de janeiro a junho. Apenas na linha branca (geladeiras, fogões, máquinas de lavar) a variação é quase o dobro: alta de 95,67%. Em 2005, o avanço limitou-se a 11,79%.

¿ O segmento de portáteis é o que mais sofre a concorrência da China, sendo que 90% da importação desta linha é proveniente desse país. Em 2004, esta participação não chegava a 60%. ¿ explicou Paulo Saab, presidente da Eletros.

A farra da importação da indústria contaminou o varejo. Na Ambient Air, o termômetro dessa invasão estrangeira são as geladeiras side by side ¿ que trazem, em geral, o freezer numa das portas laterais, além de outros recursos. Há um ano, alguns modelos eram vendidos nas seis lojas da rede entre R$10 mil e R$12 mil. Hoje, o preço caiu para R$7 mil.

¿ No último ano, passamos a ter mais modelos dessa geladeira: de três marcas para oito. A queda do dólar permitiu mais do que ampliar nossa importação. Neste mesmo período, mais que dobramos a venda desse item. Sonhos de consumo ficaram mais acessíveis à classe média ¿ explicou, Ilana Kohn, diretora da Ambient Air.

A arquiteta Valéria Marques conseguiu realizar um desses sonhos. No seu caso, ter uma TV de plasma. Uma não, três. Há dois meses, comprou um modelo. E, no mês passado, encantada com a aquisição, levou para casa outro aparelho ¿ que, pela promoção da loja, rendeu-lhe outra. Os novos aparelhos exigiam DVDs compatíveis. Resultado: seus gastos foram superiores a R$20 mil (parcelados em alguns meses).

¿ Antes de comprar os televisores, pesquisei os preços até em sites de jornais americanos. E verifiquei que a diferença não era tão grande assim. É um efeito do dólar, que barateou esses custos ¿ disse a arquiteta, que já tem novos sonhos ¿ Máquina de lavar e secadora, além da geladeira side by side.

Esses dois produtos aparecem com destaque nos números da Eletros. Foram os importados que mais aumentaram na linha de imagem e som, na qual a alta da entrada de produtos externos foi de 51,34% em valor.

Venda 50% maior em importadora

Dólar barato também tem feito a felicidade de redes como a Brasif Shopping, que controla as lojas de importados nos aeroportos. As vendas aumentaram acima de 50% em 2005 na comparação com o ano anterior. Bem acima dos 20% de alta registrados em 2004 sobre 2003 ¿ sem qualquer efeito do câmbio nos negócios. Nesse ano, a expectativa é de crescimento forte com aumento do mix de produtos e de marcas. Só de artigos para presentes a empresa passou a importar mais 14 marcas; e de eletrônicos, quatro.

¿ Com a queda do dólar, o mercado ficou ainda mais competitivo. Não se pode esquecer que os eletrônicos sofrem influência do câmbio, mas também dos avanços da própria tecnologia ¿ disse Sherlon Adley, diretor da empresa.

As bebidas são um outro segmento que expandiu com a cotação do dólar. A importadora de cervejas Boxer do Brasil, por exemplo, trouxe duas novas marcas esse ano ¿ a Strong Suffolk (inglesa) e a Wexford (irlandesa). A empresa espera quase o dobrar a venda de litros nas latas: em 2005, foram 26.500 litros; nesse ano, espera fechar em 42 mil litros nas latas. A Impexco aumentou 30% suas vendas no primeiro semestre, contra o mesmo período de 2005.

¿ Vinhos, em especial os da América do Sul, ficaram mais baratos na mesma proporção da queda do dólar ¿ disse Rogério Daudt d¿Oliveira, diretor da importadora de vinhos.

Até o varejo virtual já sentiu esse movimento. O Compra Fácil, portal de e-commerce do Grupo Hermès, dobrou a importação de artigos, em especial eletrônicos, nos primeiros seis meses de 2006, frente ao mesmo período de 2005. E as vendas acompanharam o ritmo dessa compra de artigos de outros países. Um avanço que ajudou o site a representar 25% das vendas da Hermès.

¿ Produtos eletroeletrônicos nacionais chegam a ter, inclusive, preços semelhantes. Mas os produtos para o lar feitos aqui ainda ganham dos produzidos lá fora ¿ disse José Luiz Rochinha, diretor da Hermès.

Segundo do diretor do Ministério do Planejamento, esse aumento nas importações de bens de consumo já fez esse segmento aumentar sua participação nas compras externas. Em 2005, representavam 11%. Este ano, a fatia subiu para 12%.

IMPORTAÇÃO DE CARROS AUMENTOU 113% NO PRIMEIRO SEMESTRE DO ANO, na página 32