Título: Minhas coisas estão todas lá¿
Autor: Luiza Damé, Demétrio Weber e Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 25/07/2006, O Mundo, p. 28

BRUXELAS. Há uma semana, a brasileira Neide Marques conseguiu deixar o Líbano. Ficaram para trás os objetos pessoais, móveis e roupas, fotografias da vida inteira e o carro. Saiu da capital libanesa com o filho de 11 anos e algumas roupas.

Quando você decidiu deixar o Líbano?

NEIDE MARQUES GARCIA: Ao meio-dia da véspera da minha partida. Percebi que a situação estava mais perigosa do que imaginava. Saí às 5h de segunda-feira. Viemos em três ônibus com a bandeira brasileira e placas douradas. O governo de Israel tinha se comprometido a respeitar a evacuação. Trouxe poucas peças de roupa. Não sabia quanto poderia levar.

Como foi a partida?

NEIDE: Não dormia há três dias. Precisava arrumar tudo para sair. Na madrugada da partida, o nervosismo era tão grande que resolvi não dormir. Fiquei com medo de dormir e não acordar a tempo. Saímos de ônibus por Trípoli e levamos quase 13 horas até chegar a Adana. De lá, tomei um vôo comercial para Istambul.

Tudo o que é seu ficou para trás?

NEIDE: Minhas coisas estão todas lá. Móveis, fotografias, o carro na garagem. Me disseram que deveria deixar as janelas um pouco abertas para evitar que os vidros se quebrassem com os bombardeios.

Qual era a situação em Beirute?

NEIDE: Morava num bairro cristão e lá as pessoas ainda saíam de casa, apesar das bombas que se escutavam. Ouvia bombas explodindo de dia e de noite. Às vezes, começavam entre duas e três da manhã. Ninguém dormia. Na sexta-feira antes da minha partida, os supermercados estavam cheios. As pessoas estavam fazendo estoque de mantimentos para evitar o desabastecimento.

Chegou a faltar algo?

NEIDE: Não, mas os preços começaram a disparar.