Título: AMORIM VAI À TURQUIA ACOMPANHAR RESGATES
Autor: Luiza Damé, Demétrio Weber e Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 25/07/2006, O Mundo, p. 28

Chanceler intervém para garantir segurança na retirada do 1º grupo de brasileiros isolados no Vale do Bekaa

BRASÍLIA e EL KHIARA, Líbano. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou ontem que o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, acompanhe pessoalmente a retirada de brasileiros do Líbano. Amorim deve chegar amanhã a Adana, na Turquia. A cidade é ponto de encontro dos brasileiros que deixaram o Líbano em comboios de ônibus. De lá, têm embarcado em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para o Brasil.

Amorim estava em Genebra, Suíça, participando de negociações na Organização Mundial do Comércio. Segundo o porta-voz da Presidência, André Singer, o chanceler partiria imediatamente para a Turquia. Sua missão será acelerar ao máximo a saída dos brasileiros. Singer disse que Amorim ficará na cidade o tempo que for necessário. Já o embaixador Everton Vieira Vargas, que coordena o grupo de apoio a brasileiros no Líbano, afirmou que o ministro deve passar apenas um dia na Turquia.

Irritado, Amorim teria telefonado a Livni

Antes mesmo de ir para Adana, Amorim precisou interferir pessoalmente para convencer Israel a garantir o deslocamento em segurança de comboios brasileiros num trajeto mais curto do Vale do Bekaa, no Líbano, até Damasco, na Síria. O Itamaraty queria que os ônibus atravessassem a fronteira leste, por um trajeto que leva uma hora e meia até Damasco. Mas Israel liberava a passagem apenas pela fronteira norte, o que significaria uma viagem de 14 horas. O aval israelense é indispensável para evitar ataques na viagem.

Amorim conversou anteontem com a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, e manteve contato com a Embaixada de Israel no Brasil.

Segundo Vargas, dois comboios com 309 brasileiros deixaram o Vale do Bekaa rumo a damasco ¿ no primeiro resgate de brasileiros na região. O Itamaraty esperava transportar 500, mas nem todos apareceram nos horários marcados. Foi preciso contratar uma empresa libanesa para realizar o transporte depois que motoristas sírios se recusaram a ir ao vale. Dadas as dificuldades, a remoção foi considerada um sucesso.

Segundo fontes em Beirute, Amorim ficou irritado com o que as autoridades brasileiras classificaram como intransigência do governo israelense, telefonou pessoalmente para a chanceler de Israel, Tzipi Livni, e depois para Condoleezza Rice, que garantiu o aval americano à operação. Amorim teria chegado a dizer a Rice e Livni que as relações com Israel poderiam ser prejudicadas caso algo de ruim acontecesse aos brasileiros.

Carcaças de ônibus bombardeados no caminho

Nas estradas do Vale do Bekaa é comum ver carcaças de ônibus bombardeados. Pelo menos um brasileiro morreu nos bombardeios lá. O vale concentra, segundo a embaixada, 88% dos brasileiros no Líbano.

A entrada na Síria foi tumultuada. Segundo Vargas, pelos menos 13 brasileiros estavam com o passaporte vencido ou em situação de imigração irregular. Por isso, o governo brasileiro teve de pagar multa de US$30 por pessoa. O cortejo foi monitorado por aviões israelenses que sobrevoavam a região.

Em El Khiara, lugarejo que parece uma cidade fantasma, as pessoas riam, choravam e se abraçavam num misto de alegria por deixar a zona de risco e saudade antecipada dos que ficam.

A presença brasileira no vale está explícita em placas como na oficina Roberto Cars, Lingerie Belíssima, Casa Grande Decorações, Fantástico Modas. Tanto que o governo do Canadá pediu ajuda a brasileiros da região para localizar seus cidadãos.

¿ Coloquei duas bandeiras do Brasil em cima da minha casa. Assim os caças israelenses vêem que aqui moram brasileiros ¿ disse Mohamad Abduni.

O embaixador Vargas anunciou que a TAM fará dois vôos de Damasco para São Paulo. O primeiro, amanhã, será bancado inteiramente pela TAM. O segundo, no sábado, terá as despesas divididas entre TAM e GOL. A TAM negocia um terceiro vôo com empresas estrangeiras.

Um Boeing 707 da FAB, com capacidade para 80 pessoas, decolaria ontem de Adana. Outro, com capacidade para 150 passageiros, deve partir amanhã.

Segundo o Itamaraty, já foram retirados do Líbano 854 brasileiros. O Brasil estuda a possibilidade de realizar mais um ou dois vôos da FAB entre sábado e segunda. Foram enviados US$440 mil extras para as embaixadas da região, como reforço.

O Brasil poderia ainda integrar uma força internacional de paz, disse ontem Amorim.

¿ Temos que ver primeiro o que decide o Conselho de Segurança da ONU, mas o Brasil já colaborou com outras missões de paz, inclusive no Oriente Médio, e pode fazê-lo outra vez ¿ disse.

*Enviado especial