Título: TENDÊNCIA CLARA
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 26/07/2006, O GLOBO, p. 2

Na pesquisa Ibope divulgada ontem, o cenário de segundo turno é menos nítido do que no último Datafolha, com Lula (44%) mantendo folga maior sobre a soma dos pontos dos adversários (38%). No Datafolha esta diferença foi de apenas três pontos percentuais. Mas a tendência de segundo turno é clara e sua consolidação vai depender agora do desempenho dos demais candidatos.

Alckmin, entre junho e agora, subiu de 19% para 27%. Um crescimento significativo de oito pontos percentuais, que Márcia Cavallari, diretora-executiva do Ibope, atribui à maior exposição alcançada com a cobertura jornalística de todos os candidatos a partir do início oficial da campanha. Isso vale para ele bem como para Heloísa Helena e os demais - embora os outros não tenham se movido.

Alckmin e Heloísa apareceram como alternativa para os indecisos e para os que estavam dispostos a votar em branco ou a anular o voto. Esta fase de projeção graças ao noticiário em breve dará lugar à da propaganda eleitoral gratuita, em 15 de agosto. Aí entrarão em cena outros elementos, como o marketing e a troca de chumbo, a campanha negativa. É impossível prever a quanto cada um poderá chegar, o chamado teto. Alckmin é um candidato previsível, já mostrou seu discurso e seu estilo. A incógnita fica por conta do grau de agressividade que sua campanha adotará.

Já Heloísa Helena apareceu e cresceu, mas expôs um ponto fraco, o descontrole verbal, que pode levá-la a atrair antipatias e a perder eleitores. Márcia Cavallari e outros analistas apontam este risco lembrando a trajetória de Ciro Gomes em 2002. A senadora passou de 6% para 8% entre o Ibope de junho e o de agora. Soube beneficiar-se do noticiário sobre os candidatos, ganhando espaços talvez mais relevantes do que poderá alcançar com seu programa de TV, que terá apenas um minuto e 11 segundos. Mas nos últimos dias, e notadamente depois que atingiu os 10% na pesquisa Datafolha, ajudando a colocar o cenário de segundo turno no horizonte, produziu uma coleção de impropérios que não combinam com quem, como ela, sempre fez política no papel de vítima. Chamar o ministro Tarso Genro de "empregadinho" foi um lapso aristocrático. Voltou a atacá-lo pondo junto o ministro Luiz Dulci, que não lhe fizera crítica alguma. Chamou-os de canalhas. Afirmou que o Bolsa Família gera mendigos. Quando um jornalista questionou sua promessa de baixar os juros à metade, reagiu:

- Não será por decreto presidencial, ignorantes. Ô, gentalha, que tenta vender à opinião pública o pensamento único como única alternativa.

"Gentalha" também é linguagem da Casa Grande. No Senado, no PT, em Alagoas, a senadora sempre desfrutou de plena liberdade verbal para atacar e desqualificar. Como candidata, pode ser vítima do hábito, embora as pesquisas ainda não tenham mostrado se ela perde ou ganha com os rompantes. Mas é certo que o PSOL já percebeu o perigo de uma capotagem e escalou outros atores, como os deputados Chico Alencar e o candidato a vice, César Benjamin, para atuarem nos confrontos verbais, de modo mais suave. Nos debates, porém, ninguém poderá substituí-la.

Da parte de Lula, a decisão é evitar o confronto com ela. Tarso fez o primeiro ataque e não deve fazer outros. Lula, pessoalmente, não fará nenhum. A contradição essencial é com o tucano, firmam os petistas, evitando dizer o óbvio: querem os votos dela no segundo turno.

Lula caiu de 48 para 44 pontos entre o Ibope de junho e o de agora. Se os adversários ganharam espaço, o governo enfrenta uma nova maré contrária no plano ético, com o caso dos sanguessugas. Embora haja também deputados da oposição envolvidos, as denúncias começam a respingar em petistas e aliados como os ex-ministros da Saúde Humberto Costa (PT) e Saraiva Felipe (PMDB). Os lulistas dão o segundo turno como favas contadas, mas no fundo ainda acreditam na recuperação de alguns pontos com o início do horário eleitoral.