Título: O `BANCO¿ DOS SANGUESSUGAS
Autor: Alan Gripp e Maria Lima
Fonte: O Globo, 28/07/2006, O País, p. 3

Máfia adiantava dinheiro para parlamentares sem juros nem pedido de garantias

Um banco sempre disposto a adiantar grandes somas de dinheiro, que não exigia garantias e abria mão de cobrar juros. Para seduzir parlamentares envolvidos no esquema de fraudes na venda de ambulâncias, a máfia dos sanguessugas operava como uma instituição financeira, que adiantava o pagamento da propina acertada com a maioria dos políticos envolvidos. Segundo o depoimento à Justiça Federal do empresário Luiz Antônio Vedoin, chefe da quadrilha, até hoje a máfia tem créditos a receber com pelo menos oito parlamentares, no valor de cerca de R$830 mil. Os devedores, que estão na lista dos investigados pela CPI dos Sanguessugas, negam as denúncias.

Em depoimento de nove dias à Justiça Federal de Mato Grosso, Vedoin, réu confesso dos crimes, contou que antecipava as propinas para deputados e senadores que se comprometiam verbalmente a apresentar emendas ao Orçamento para a compra de ambulâncias, depois vendidas a prefeituras a preços superfaturados. A propina, em geral, era de 10% do valor da emenda.

Como nem sempre os recursos eram liberados ou só eram parcialmente, muitos parlamentares tornaram-se devedores da quadrilha. Segundo Vedoin disse ao juiz, esse é o caso, por exemplo, do senador Ney Suassuna (PB), líder do PMDB no Senado, que teria uma dívida de R$110 mil, ¿sem juros¿, com a organização. Suassuna, de acordo com o empresário, recebeu ao todo cerca de R$200 mil ¿ que teriam sido pagos em 14 parcelas de janeiro a dezembro de 2005 a seu assessor parlamentar Marcelo Carvalho. O senador nega.

Emenda vendida várias vezes

O crédito pré-aprovado criou muitos problemas para a organização, contou Vedoin à Justiça. Segundo o empresário, após receber um adiantamento de R$30 mil, o deputado Paulo Gouvêa (PL-RS), que integra a bancada da Igreja Universal do Reino de Deus, ¿desinteressou-se pelo acordo e vendeu a emenda, novamente, para outros operadores¿. Vedoin também disse ter um tomado calote de cerca de R$40 mil do deputado Heleno Silva (PL-SE). O empresário contou ao juiz federal Jefferson Schneider que, por esse motivo, o parlamentar estava ¿esquivando-se¿ dele ¿sempre que o encontrava na Câmara¿.

A quadrilha não teve o mesmo tratamento quando ficou devendo dinheiro ao ex-deputado Carlos Rodrigues (sem partido), que foi um dos principais líderes da bancada evangélica. Em maio de 2005, Luiz Antônio e seu pai, Darci Vedoin, teriam pegado empréstimo de R$300 mil com o então deputado para montar uma filial do esquema na Bahia. Rodrigues teria vendido uma casa em Brasília para atender ao pedido e, segundo o empresário, cobrava juros de R$9 mil mensais. Rodrigues foi preso no início de maio por envolvimento com o esquema de corrupção. Ano passado, acusado de participar do mensalão, renunciou para escapar da cassação.

O maior devedor da máfia seria o deputado Ricarte de Freitas (PTB-MT). Segundo Vedoin, o parlamentar recebeu R$279.393 a mais do que a comissão supostamente acertada. Ricarte de Freitas teria recebido 15% do valor das emendas (cerca de R$650 mil), além de um carro de luxo (Toyota Hillux SW4) e passagens para a filha passar férias em Nova York.

Considerado por Vedoin peça-chave na máfia, o deputado Nilton Capixaba (PTB-RO) teria dívida ¿ao redor de R$150 mil¿ com a quadrilha. Foi ele que, segundo o empresário, apresentou a primeira emenda do esquema, em 1999, para a compra de uma ambulância pela prefeitura de Cacoal, em Rondônia. O deputado fluminense Fernando Gonçalves, que teria recebido R$300 mil da organização ¿ R$150 mil em espécie ¿ estaria devendo R$167 mil aos donos da Planam.