Título: ADAPTAÇÃO
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Fonte: O Globo, 28/07/2006, Opinião, p. 6

AVenezuela é o primeiro país a se tornar membro pleno do Mercosul desde a criação formal do bloco, em 1991, por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. Mas o país ainda levará alguns anos para se integrar. Para isso, precisará demonstrar que compartilha o mesmo projeto de desenvolvimento democrático dos novos parceiros.

Em princípio, a adesão fortalece o grupo, já que a Venezuela é a terceira maior economia da região e inegável potência energética, com as maiores reservas de petróleo e gás natural do continente. Ao reunir uma identidade popular e uma vontade política progressivamente voltada para o Sul e a integração regional, sua entrada confere uma dimensão mais ampla ao bloco, e também deve dinamizar relações econômicas com o Norte e o Nordeste brasileiros.

No entanto, a concretização desse potencial ainda depende de como o governo venezuelano se adaptará ao bloco e vice-versa. Restam dúvidas quanto à convergência entre os projetos de integração, os modelos de desenvolvimento pós-neoliberalismo e o respeito ao regime democrático. Até agora, os discursos de Hugo Chávez não têm ultrapassado muito o campo da retórica. Mas uma eventual posição excessivamente nacionalista ou socializante teria grandes contradições e mesmo incompatibilidades irreversíveis com o modelo de expansão e integração capitalista em andamento no Brasil e na Argentina.

Dificilmente conseguiriam se integrar a economias socialistas ou a algum tipo de nacionalismo extremado; em algum momento, a retórica chavista terá que reduzir seu grau de contradição e ambigüidade. Tendo em vista as lutas internas já observadas na base de apoio do governo venezuelano, esse momento de decisão pode estar próximo. Se Chávez superar essas contradições, então a entrada da Venezuela fará do Mercosul um bloco mais atraente.

MARCELO COUTINHO é coordenador do Observatório Político Sul-Americano do Iuperj.