Título: MÁFIAS CONCORRENTES
Autor: Alan Gripp e Maria Lima
Fonte: O Globo, 29/07/2006, O País, p. 3

CPI investiga outras três quadrilhas, além da dos sanguessugas, que corrompiam parlamentares

ACPI dos Sanguessugas tem fortes indícios de que a quadrilha que superfaturava a venda de equipamentos hospitalares, com o envolvimento de 90 parlamentares, não atuava sozinha no Congresso Nacional. A comissão investiga a existência de pelo menos três máfias paralelas, que disputavam com os donos da Planam recursos provenientes de emendas parlamentares. A suposta concorrência entre quadrilhas é revelada pelo dono da Planam, o empresário Luiz Antônio Vedoin, em seu depoimento à Justiça Federal de Mato Grosso.

Vedoin disse à Justiça que uma emenda do deputado Almir Moura (PFL-RJ), que vinha sendo negociada com ele em troca de propina, foi redirecionada para uma empresa concorrente: a Médica Engenharia de Veículos. A empresa teria feito a negociata com Adarildes Moraes Costa, que já trabalhou nos gabinetes de seis deputados e, segundo Vedoin, ¿ocupava posição de operadora do esquema no PL¿.

Em sua página na internet, a Médica Engenharia é apresentada como uma próspera empresa que ocupa uma área de 15 mil metros quadrados em Santa Maria, cidade-satélite de Brasília, e usa ¿técnicas modernas¿ para transformar veículos em 13 tipos diferentes de unidades móveis de saúde, além de carretas para aulas de informática ¿ uma das áreas de atuação da máfia dos sanguessugas.

Na empresa, apenas dois ônibus parados

Na sede da empresa, no entanto, O GLOBO encontrou um galpão em péssimo estado de conservação onde havia apenas dois ônibus com o logotipo da empresa em reforma, aparentemente parados. Apenas um funcionário trabalhava no local. Um vizinho, que não quis se identificar, disse que lá só funciona hoje uma pequena marcenaria. O dono, segundo ele, chama-se Joaquim e tem um escritório vizinho ao galpão.

¿ Mas só aparece lá de vez em quando ¿ disse.

Procurado pelo GLOBO, o dono da empresa não foi localizado. Nos telefones da Médica Engenharia, ninguém atendeu às ligações.

Mas, segundo integrantes da CPI, a Médica não seria a única empresa suspeita. Segundo o dono da Planam, Adarildes, que cobraria 3% de comissão para cada emenda dos deputados da bancada evangélica, operava em outros esquemas, em segmentos diversos. Na lista de parlamentares suspeitos divulgada pela CPI, 18 pertencem à bancada evangélica e dez à Igreja Universal.

O sub-relator da CPI, deputado Júlio Delgado (PPS-MG), disse que os concorrentes da Planam um dia já foram aliados da quadrilha.

¿ Sabemos que, num primeiro momento, esses empresários começaram a trabalhar juntos. Um não entrava em área em que o outro não tinha negócios, mas as empresas eram emprestadas de parte a parte para servir de fachada nas licitações dirigidas. Era um cartel, mas em algum momento o acordo foi furado ¿ disse Delgado.

A CPI também já sabe que a Planam não conseguia entrar no Rio Grande do Sul, pois lá outros empresários já dominavam o mercado das emendas parlamentares. Vedoin disse que chegou a antecipar R$10 mil de comissão para tentar pôr as mãos em R$1,2 milhão destinado pelo deputado Érico Ribeiro (PP-RS) a 15 municípios do estado. Mas ele desistiu do negócio. O motivo consta do depoimento de Vedoin à Justiça: ¿Em virtude de o interrogando (Vedoin) não ser do Rio Grande do Sul e encontrar, na região, outro concorrente¿.

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), integrante da CPI, disse que o pai de Vedoin, Darci Vedoin, responsável pelas negociações com os parlamentares em Brasília, revelou em depoimento à comissão que a concorrência de outros empresários corruptos estava reduzindo os lucros de sua organização criminosa.

¿ Ele nos disse que, em virtude da concorrência, o ¿mercado¿ havia ficado difícil, que eles tinham cada vez menos lucro. Também contou que o peso das propinas era tão grande que o negócio estava se tornando inviável ¿ disse Gabeira.

O dono da Planam contou ainda que enfrentou um esquema paralelo que teria sido montado pelo deputado Lino Rossi (licenciado), que fora o primeiro contato dos Vedoin na Câmara. Segundo o empresário, os dois tiveram uma briga e Rossi passou a atuar sozinho. Teria conseguido R$650 mil de recursos extra-orçamentários para o município de Chapada dos Guimarães (MS) e R$300 mil para Luciara (MS) para a compra de equipamentos hospitalares.

¿A empresa vencedora, nessas licitações, pertence à esposa do deputado Lino Rossi¿, disse Vedoin à Justiça.