Título: DE PALAFITAS A MANSÕES NO RIO, QUASE TUDO ILEGAL
Autor: Dimmi Amora
Fonte: O Globo, 30/07/2006, O País, p. 8

Maioria das habitações está fora da lei, num mercado informal que cresce com invasões e até venda de lajes

Cinco anos atrás, o sonho da casa própria tornou-se possível para Marcelo da Cunha, de 39 anos, quando ele viu o anúncio: ¿Condomínio Vale do Monte. Lotes: R$3 mil de entrada e 40 prestações de R$150¿. O lote é bem em frente à Favela do Caboclo, em Campo Grande, Zona Oeste do Rio, onde dona Francisca Pessoa, de 43 anos, e sua família conseguiram uma área semelhantes à de Marcelo, sem pagar nada, numa invasão sete anos antes dele. O pedreiro preferiu pagar à imobiliária para ter sua casa com tranqüilidade, recebendo uma promessa de compra e venda. Semanas atrás, o sonho da casa própria foi paralisado por um embargo da prefeitura. E Marcelo acordou na triste realidade: sua construção é tão ilegal quanto a dos vizinhos da favela.

¿ Quando comprei, a promessa é que ficaria tudo pronto, mas a imobiliária fechou e estamos sem nada direito ¿ lamenta Marcelo.

Marcelo e Francisca não estão sozinhos neste mundo da habitação informal. Estimativas do professor Luiz Cezar Queiroz Ribeiro, coordenador da ONG Observatório das Metrópolis, indicam que apenas 20% dos imóveis construídos na cidade do Rio estão legalizados. Do restante, metade está apenas parcialmente legalizada e a outra, nem isso. Nestes 80% de informalidade há de palafitas a mansões.

¿ A estimativa foi feita comparando números do mercado imobiliário, dos registros de licenciamentos da prefeitura e de ligações da Light. É uma estimativa do Rio, mas que não está longe da realidade da maioria das cidades do país. Sem transporte público de qualidade e com o desemprego, as opções são poucas e a pessoa tem que ficar perto de onde há emprego, nos serviços das áreas nobre ¿ diz Cezar.

Laje pode custar R$15 mil

As novas tendências do mercado ilegal da habitação mostram que ele só cresce. No Rio, centenas de galpões industriais inutilizados foram invadidos para a construção de habitações sem a menor infra-estrutura. Além disso, moradores das favelas vendem as ¿lajes¿ de seus imóveis para a construção de novas residências.

¿ Uma laje pode custar de R$10 mil a 15 mil, dependendo da favela. A pessoa compra só o direito de construir. A casa ela faz. A pessoa não tem opção. Não há qualquer política pública para atender quem precisa de casa ¿ diz Rocino Castro Diniz, presidente da Federação das Associações de Moradores de Favelas do Rio de Janeiro (Faferj).

Além das favelas, na Zona Oeste são mais de 400 loteamentos irregulares, como o de Marcelo, segundo a vereadora Lucinha (PSDB), que trabalha desde a década de 80 no setor. Ela conta que os donos de terra dividem o terreno e, antes de o município dar o aval, os lotes são vendidos e o empreendedor some sem urbanizá-los.

A falta de planejamento afeta a qualidade de vida de toda a região. No caso do Vale do Monte, a construção das ruas sem rede pluvial fez com que a água escoasse diretamente para a Favela do Caboclo, num terreno mais baixo, alagando as casas.

¿ Um vereador deu umas manilhas, mas entupiu tudo ¿ contou Francisca.

A esperança de receber serviços aparece nos anos pares, os eleitorais. No caso do condomínio Bosque dos Sabiás, em Campo Grande, semana passada chegaram a brita e o óleo queimado jogado sobre a terra batida, num torpe asfaltamento sem rede pluvial. E também placas de um candidato.