Título: Guerra de estrangeiros
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 30/07/2006, O Mundo, p. 48

BEIRUTE. Paranaense de Maringá, o antropólogo Roberto Bhatlake, descendente de sauditas, é pesquisador da Universidade de Notre Dame, uma das mais conceituadas do Líbano, e autor do livro ¿Mahjar¿, um estudo sobre a imigração libanesa para o Brasil. Para Bhatlake, o Líbano é palco de uma guerra de palestinos, sírios e iranianos contra Israel.

O Líbano está unido na guerra a Israel?

ROBERTO BHATLAKE: Há um sentimento de solidariedade entre a população, mas a tendência é que as comunidades fiquem com medo umas das outras. O país não está unido. O Hezbollah comprou esta briga e está sozinho. O Exército libanês só observa. Não há união dentro do governo nem entre os próprios xiitas. Muitos fogem do país. Quando você luta por uma causa, não foge.

Os demais grupos que sofrem com os ataques de Israel não se sentem protegidos pelo Hezbollah?

BHATLAKE: Se algum grupo se revoltar contra o Hezbollah, vamos voltar à guerra civil. Os outros grupos não estão se manifestando nem pró nem contra porque têm medo do conflito interno. Os partidos sabem que a guerra civil não trouxe resultado para ninguém. Além disso, os xiitas, com suas famílias grandes, hoje são maioria.

Existe risco real de uma nova guerra civil?

BHATLAKE: Creio que não. Os partidos de oposição à Síria sempre procuraram o debate.

Esta guerra é do Líbano ou do Hezbollah?

BHATLAKE: Aí é que está a contradição. O mundo todo vê a guerra como sendo do Líbano. As vítimas são libanesas. Mas quem começou a guerra não foi o governo, foi o Hezbollah. Se o Hezbollah lutasse pelo Líbano, também atacaria a Síria, que fez milhares de prisioneiros e desaparecidos durante a ocupação do sul do país, e não apenas Israel. O Líbano é palco de uma guerra de palestinos, iranianos e sírios, que lutam daqui contra Israel.

O crescimento dos xiitas pode levar a um retrocesso no Líbano, que sempre foi um dos países árabes mais liberais?

BHATLAKE: Esta onda já existe.

Qual a saída política?

BHATLAKE: É fugir da influência síria e iraniana. (Ricardo Galhardo)