Título: MP DENUNCIA FRAUDADORA DE COTAS NA BAHIA
Autor: Heliana Frazao
Fonte: O Globo, 02/08/2006, O País, p. 13

Estudante, que pagou R$800 por falso histórico de ensino público para obter bolsa na UFBA, foi afastada do curso

SALVADOR. O Ministério Público Federal na Bahia denunciou ontem um dos 14 estudantes acusados de fraudar o sistema de cotas da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Para conseguir vaga por meio das cotas, eles apresentaram documentos obtidos irregularmente em escolas públicas. A denúncia de ontem refere-se à ex-estudante de medicina X, de 21 anos. Ela teve a matrícula cancelada no início do ano.

É a segunda denúncia oferecida pelo Ministério Público em relação aos casos de fraude já confirmados. Outro aluno do curso de medicina, Y, de 22 anos, foi afastado da universidade este ano.

Falsificação foi descoberta na universidade

Segundo os procuradores da República Sidney Madruga e André Batista Neves, que denunciaram a aluna à 2ª Vara Federal Criminal, X pagou R$800 para obter dois históricos falsos, nos quais se atestava que ela concluíra o ensino fundamental e a 1ª e 2ª séries do ensino médio numa escola da rede pública no bairro da Ribeira, em Salvador. O caso de X foi o primeiro descoberto na UFBA.

Para ser cotista, o aluno deve ser oriundo do ensino público. Um cruzamento de dados realizado pela Secretaria estadual de Educação, a pedido da procuradoria jurídica da UFBA, comprovou a falsificação, classificada de grosseira pela secretária estadual de Educação, Anaci Paim. A aluna, na verdade, estudara em colégio particular de um bairro nobre de Salvador.

Ao ser ouvida no inquérito civil público, a estudante admitiu a fraude.

“Embora seja bem branca e tenha cabelos claros, ela se declarou parda ao fazer a opção pelas cotas. No depoimento, justificou a declaração com o fato de na Bahia todo mundo ser pardo”, disse o procurador Madruga, acrescentando que X teria afirmado que outros colegas brancos e de classe média igualmente se beneficiaram das cotas.

“Já Y, o segundo caso que descobrimos, alegou que o seu tataravô fora índio, por isso sentia-se no direito de se declarar índio”, disse Madruga.

Promotor vai denunciar outros 12 universitários

Segundo o procurador, com a abertura do processo penal, os envolvidos poderão responder pelo crime de falsidade ideológica, cuja pena varia de um a cinco anos de reclusão. O procurador acredita que em 60 dias seja oferecida denúncia contra os outros 12 estudantes fraudadores descobertas pela universidade.

Além de responder criminalmente por apresentação de documentos falsos, a estudante será responsabilizada na esfera civil. Como os dois denunciados são réus primários, podem ser condenados à pena mínima.

As fraudes contra o sistema de cotas da UFBA vêm sendo apuradas desde janeiro deste ano. As investigações partiram de uma representação da Pró-Reitoria de Ensino e Graduação da UFBA noticiando as irregularidades. Madruga chegou a enviar às presidências da Câmara e do Senado, assim como a líderes partidários em Brasília, cópia das apurações realizadas na UFBA, alertando para a necessidade de se criar mecanismos de fiscalização.

A política de cotas foi aprovada na UFBA em 2004 e passou a valer a partir do vestibular de janeiro de 2005. A instituição destina 45% das suas vagas para alunos da rede pública. Há subcotas para descendentes indígenas e para quem se declara negro ou pardo.