Título: Cubanos de Miami recebem notícia com festa
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 02/08/2006, O Mundo, p. 29

Estados Unidos temem êxodo em massa da ilha e reforçam patrulhamento da Guarda Costeira com 30 barcos

MIAMI. Muitos têm festejado com enorme euforia, inclusive nas ruas da cidade, agitando bandeiras, gritando ¿Viva a liberdade¿, como se fosse um fato consumado: Fidel Castro está morto, e o governo cubano está escondendo a verdade. Seu argumento é que, se estivesse vivo, o presidente de Cuba teria comunicado sua cirurgia numa gravação ou vídeo, não numa carta cuja assinatura não se assemelha ao autógrafo dele.

Mas há também os cautelosos, que acham que tudo não passa de um ardil. Para eles, o velho ditador está apenas aplicando mais um golpe, tanto nos exilados quanto em quem vive em Cuba.

¿ Fidel pode ter planejado isso. Ele pode estar só olhando para ver o que aconteceria se realmente entregasse o poder para o seu irmão ¿ disse Ramón Saúl Sánchez, ativista do Movimento Democracia, de Miami.

Por via das dúvidas, o governo dos Estados Unidos se manteve ainda mais cauteloso. Funcionários da Casa Branca e do Departamento de Estado, em conversa telefônica com o GLOBO, confidenciaram que sabem muito pouco sobre o que acontece nos bastidores do regime em Cuba.

Em sua entrevista diária, o porta-voz da Casa Branca, Tony Snow, falou primeiro em nome do governo e, em seguida, manifestou sua própria opinião:

¿ Nós não sabemos qual a condição da saúde de Fidel Castro. Eu não creio que ele esteja morto.

A principal, e momentânea preocupação do governo dos EUA, é evitar um êxodo em massa de cubanos em direção à Flórida. Por isso, a Guarda Costeira passou a intensificar o seu patrulhamento, utilizando nada menos que 30 barcos. O objetivo é interceptar os balseros ainda no oceano, devido à política chamada de ¿pé seco, pé molhado¿.

Segundo ela, quem for apanhado no mar é repatriado imediatamente, mas quem conseguir tocar o solo americano tem asilo garantido. No ano passado, três mil cubanos foram bloqueados no meio do caminho.

Comemoração dos exilados tomou as ruas da cidade

Miami está em festa desde a noite de segunda-feira. Muita gente varou a madrugada em ruidosas carreatas e dançando nas ruas. Durante todo o dia de ontem houve manifestações de júbilo nas imediações do Café e Restaurante Versailles, tradicional ponto de encontro de cubanos na Calle Ocho (Rua Oito), a principal via do bairro Little Havana (Pequena Havana).

Poucas horas antes do anúncio da cirurgia e do afastamento de Fidel Castro, o presidente George W. Bush, que visitava Miami, tinha ido até o Versailles para tomar um café com os exilados. Ali ele arrancou facilmente aplausos calorosos ao dizer que ¿o governo cubano é tirânico¿.

Ontem, porém, um dos mais populares radialistas cubanos da cidade, Agustín Tamargo, de 79 anos, disse ao microfone da estação que dirige ¿ a Rádio Mambi, com alcance até Cuba ¿ que estava decepcionado com Bush e todos os seus antecessores das últimas quatro décadas:

¿ Não perdôo este governo e os antecessores porque intervieram em toda parte, mas não tiveram a coragem de invadir Cuba. O anunciado afastamento de Fidel é uma alegria, mas é também uma mancha que cai sobre nós, exilados: nós não o derrubamos. Ele está caindo naturalmente, morrendo como um cachorro, sem que tenhamos feito nada para matá-lo.