Título: CHEFE DA MÁFIA ENTREGA MAIS
Autor: Bernardo de la Peña e Maria Lima
Fonte: O Globo, 04/08/2006, O País, p. 3

Vedoin depõe e faz novas revelações que complicam situação de sanguessugas

Num depoimento de mais de sete horas a integrantes da CPI dos Sanguessugas, o empresário Luiz Antônio Trevisan Vedoin reforçou ontem as acusações contra o líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), e também complicou a situação de petistas. Um dos principais alvos das revelações de Vedoin foi José Airton Cirilo, integrante do diretório nacional do PT e candidato do partido ao governo do Ceará em 2002.

As acusações contra Cirilo levaram parlamentares a defender que seja aprofundada a investigação sobre as relações da Planam, empresa da família Vedoin, com o Ministério da Saúde na gestão do ex-ministro Humberto Costa (PT). Vedoin negou ter tido contatos com o ex-ministro, mas citou Francisco Rocha, o Rochinha, ex-braço direito de Humberto Costa e que seria o homem responsável pelo pagamento de emendas no ministério.

Vedoin disse, segundo os deputados, que Rochinha seria o interlocutor de Cirilo no governo. O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) já apresentou requerimento para convocar Rochinha, que é amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e um dos coordenadores da campanha pela reeleição no Nordeste.

¿ Ficou caracterizada a participação do Zé Airton (Cirilo). Ele vai ter de prestar esclarecimentos porque usava interferência e tráfico de influência para negociar dívidas que ficaram como restos a pagar em 2003. Há ainda a citação de muita gente próxima do ministro e do governo, pessoas que de certa forma autorizavam o repasse e a liberação das emendas através da Casa Civil ¿ afirmou Júlio Delgado (PSB-MG), sub-relator da CPI.

Petista: provas são irrefutáveis

Representante do PT na CPI dos Sanguessugas, o deputado Paulo Rubem Santiago (PE) fez um apelo ao presidente do PT, Ricardo Berzoini, para que seja aberto um processo na comissão de ética do partido contra Cirilo. Segundo Santiago, existem provas cabais contra o petista. Vedoin contou ter feito depósitos nas contas de dois assessores de Cirilo, José Caubi Diniz e Raimundo Lacerda Filho. Segundo Vedoin, a MC Lacerda, empresa dos assessores no Ceará, recebeu depósitos da máfia a título de adiantamento pela liberação de emendas. Santiago defendeu a expulsão de Cirilo.

¿ Se há indícios e provas já reunidas pela CPI, não vejo motivo para que as pessoas tomem distância e achem que isso é uma manobra da oposição. As provas são claras e a melhor forma é abrir processo, ouvir a defesa e, se for necessário, expulsá-los, punindo peremptoriamente ¿ afirmou Santiago, que considera as provas incontestáveis.

Mas nem todos os petistas concordam com Santiago.

¿ Há um rancor dele contra o ministro Humberto Costa ¿ disse o senador Sibá Machado (PT-AC), que é contra a punição pelo PT agora.

Cirilo, de acordo com Vedoin, teria ajudado a quadrilha a liberar o dinheiro de emendas no Ministério da Saúde, no recebimento de parte de uma dívida de R$8 milhões do governo passado e nas tratativas para obter um financiamento no Banco do Nordeste (BNB). A instituição recebeu uma proposta para financiar a expansão dos negócios da família Vedoin na Bahia. O plano era montar a empresa Vedobus e diversificar os negócios da família no Nordeste.

Segundo os parlamentares, Vedoin contou ainda ter tido três encontros com o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), em 2003 e 2004, para tratar de negócios com o estado. Ele disse ainda ter conversado com o secretário de Saúde de Mato Grosso do Sul. Os contatos teriam sido intermediados por Cirilo.

No depoimento, Vedoin pôs sob suspeita ainda uma liberação de R$18 milhões para a prefeitura de Nova Iguaçu, do petista Lindberg Farias, que já havia sido citado no depoimento à Justiça Federal.

¿ A liberação de Nova Iguaçu é impressionante, porque consegue ser maior do que todas as feitas para o governo do Estado do Rio ¿ disse a senadora Heloísa Helena.

No depoimento, Vedoin afirmou ainda que o senador Ney Suassuna tinha conhecimento da participação de seus assessores e da destinação de suas emendas para compra superfaturada de ambulâncias. No mesmo momento em que Vedoin era inquirido pela CPI, na Corregedoria do Senado Marcelo de Carvalho, ex-assessor de Ney Suassuna, piorou ainda mais a situação do senador. Interrogado por Romeu Tuma, Carvalho não só disse que comunicava a Suassuna tudo que fazia relativo às emendas como tinha seu aval.

Segundo Tuma, Vedoin falou com bastante ênfase sobre assessores do gabinete de Suassuna. O corregedor lembrou que existem ofícios mostrando solicitações de Suassuna ao Ministério da Saúde para que fossem liberadas emendas extras. Tuma disse que Vedoin sugeriu a quebra do sigilo de Paulo Roberto, genro da senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), e confirmou à CPI ter dado dinheiro a ele.

Ignorando documentos que mostram o pagamento de propina, Marcelo de Carvalho negou ter recebido da máfia R$ 200 mil em espécie e R$225 mil de empréstimo ou da venda de um barco. Tuma, entretanto, disse que não se convenceu com a negativa, porque tem a documentação que desmente as afirmações do ex-assessor de Suassuna.

¿ Um detalhe importante é que ele (Carvalho) diz que nunca deixou de comunicar ao senador qualquer emenda que tenha feito, qualquer encaminhamento que tenha feito, mesmo quando o senador estava fora do país. Ele comunicava antes de encaminhar. Não dá para dizer que ele (Suassuna) não sabia ¿ disse Tuma.

Quando Marcelo de Carvalho estava sendo ouvido pela CPI, Suassuna tentou constrangê-lo insistindo em permanecer na sala. O senador se sentou no plenário e pediu ao sub-relator José Carlos Aleluia (PFL-BA) para ali permancer. Aleluia consentiu. Mas o sub-relator Júlio Redecker (PSDB-RS) reclamou de sua presença e ele foi obrigado a sair.

¿ Eu fui convidado a assistir o depoimento, mas ele pediu e eu saí ¿ disse Suassuna, contrariado.

O depoimento da assessora Ana Alberga, que trabalha para o deputado Wanderlei Assis (PP-SP), surpreendeu integrantes da CPI. Ana confessou ter recebido em sua conta dinheiro da máfia, mas disse que o repassou ao deputado. Ela alegou que o chefe é pintor e vendeu alguns de seus quadros para Vedoin. Wanderlei Assis é acusado de receber R$60 mil de propina, sendo R$40 mil em espécie e R$20 mil depositados em conta de assessores.

¿ Essa senhora disse que recebeu o dinheiro, repassou ao deputado, que disse ser pintor e que o dinheiro era o pagamento da venda de quadros. Se os quadros eram do deputado, porque ele não colocou o pagamento em sua própria conta? No mínimo ele cometeu crime de sonegação fiscal ¿ disse Aleluia.