Título: ESCÂNDALOS ESVAZIAM OS COFRES DAS CAMPANHAS DE CANDIDATOS A DEPUTADO
Autor: Alan Gripp e Raquel Miura
Fonte: O Globo, 06/08/2006, O País, p. 4

Poucos empresários ousam fazer doações com as novas regras eleitorais

BRASÍLIA. Se os candidatos à Presidência da República se queixam da falta de dinheiro, a chiadeira se multiplica entre os candidatos a cargos proporcionais: deputado federal, estadual e distrital. Em tempos de mensaleiros e sanguessugas ¿ neste caso com as investigações a pleno vapor ¿ até quem escapou das denúncias reclama que são poucos os empresários com coragem de registrar doações dentro das novas regras eleitorais. Um mês após iniciada a campanha, muitos candidatos, inclusive deputados de vários mandatos, não conseguiram ainda se apresentar ao eleitorado.

Não são raros os casos de candidatos que dizem bancar do próprio bolso as despesas de campanha. O deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), que tenta a reeleição para a Câmara depois de forte atuação na CPI dos Correios, diz que até agora não conseguiu qualquer doação e está usando as economias que fez nos últimos meses ¿ R$23 mil, segundo ele.

¿ Minha campanha está atrasada. Os empresários estão com medo de aparecer na lista de doadores. E os grandes grupos vão atrás apenas dos candidatos a presidente e a governador. Para nós, acho que as coisas só vão melhorar a partir de setembro já com os reflexos da campanha no rádio e na TV ¿ afirma Fruet.

¿Quando eu disse que daria recibo, a maioria desistiu¿

Terceiro candidato mais votado em 2002 na disputa por uma vaga na Câmara por São Paulo, o deputado José Eduardo Cardozo (PT) diz que ainda não pôs sua campanha na rua porque tem se dedicado exclusivamente a buscar doadores. Para ele, as campanhas proporcionais foram mais prejudicadas porque muitas empresas de pequeno e médio porte só aceitam contribuir por meio de caixa dois.

¿ Estava pensando em fazer um jantar para arrecadar dinheiro e muita gente se mostrou interessado. Mas quando eu disse que daria recibo, a maioria desistiu. Nestas eleições terá vantagem o candidato paroquial, aquele que tem reduto eleitoral fiel, porque aí ele concentra a campanha numa região e tudo sai mais barato ¿ afirmou Cardozo.

O deputado Ricardo Izar (PTB-SP), presidente do Conselho de Ética e candidato à reeleição, prevê que esta será sua campanha mais pobre em 20 anos de Congresso. Até agora ele só conseguiu dinheiro de uma empresa de transporte. Sem revelar valores, diz que a doação foi ¿magrinha¿ e para pagar suas despesas de campanha tem recorrido a amigos e parentes.

¿ Meu irmão e amigos têm ajudado. Mas está difícil, o dinheiro não entra, as empresas estão com medo de doar. Com isso, atrasou tudo. Eu fazia anúncios em jornais de várias cidades do interior três meses antes da votação, mas este ano só vou anunciar 15 dias antes do pleito ¿ diz Izar.

A reclamação também se estende às novas regras que restringem a propaganda eleitoral, proibindo, por exemplo, a distribuição de brindes e a colocação de cartazes e outdoors em espaços públicos. Para muitos, as mudanças vão encarecer as campanhas.

¿ Antes, eu colocava 20 outdoors numa cidade e tinha o meu número exposto para todos os eleitores. Agora, tenho que distribuir milhares de santinhos para ter o mesmo alcance ¿ reclama o líder do PSDB na Câmara, deputado Jutahy Júnior (BA).

¿Caixa dois permanece de forma sutil¿, diz cientista

Para o cientista político Octaciano Nogueira, da Universidade de Brasília (UnB), a reclamação dos candidatos a deputado tem fundamento. Mas ele crê que o caixa dois continuará presente na eleição deste ano, ainda que de forma sutil.

¿ A suspeita de caixa dois é maior porque muitos dos candidatos tiveram o nome relacionado a escândalos de corrupção, como os mensaleiros e os sanguessugas. Que empresa vai querer doar dinheiro e ver seu nome ligado a esses candidatos? No entanto os candidatos estão aí, principalmente na disputa proporcional, fazendo campanha, distribuindo santinhos e colocando gasolina nos carros de som ¿ disse Nogueira.

O cientista político Luiz Henrique Bahia, da Uerj, também considera difícil acabar com o caixa dois, mesmo depois de tantos escândalos. Mas acredita que as novas regras trazem dificuldades e as doações ilegais deverão diminuir:

¿ As mudanças são importantes para a democracia. E a chiadeira significa que pelo menos alguma coisa mudou.

(*) Da CBN, especial para O GLOBO