Título: UM ESTADO ATRÁS DAS GRADES
Autor: Ismael Machado
Fonte: O Globo, 05/08/2006, O País, p. 3

Os podres poderes de Rondônia

Autoridades do governo, da Assembléia e do Judiciário do estado são presas pela PF

Algumas das autoridades mais importantes de Rondônia ¿ entre elas o presidente do Tribunal de Justiça do estado, desembargador Sebastião Teixeira Chaves, e o presidente da Assembléia Legislativa, deputado José Carlos de Oliveira, o Carlão ¿ foram presas ontem pela Polícia Federal sob a acusação de participar de um esquema de desvio de recursos públicos do estado a partir da Assembléia Legislativa. Foi preso também o chefe da Casa Civil do governo estadual, Carlos Magno, candidato a vice na chapa do governador Ivo Cassol (PPS) para a eleição de outubro.

Ao todo foram presas pela PF 24 pessoas na Operação Dominó, incluindo o ex-procurador-geral de Justiça José Carlos Vitachi; o juiz José Jorge Ribeiro Luz, da 5ª Vara Cível de Porto Velho; e Edílson de Souza Silva, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Segundo a PF, a quadrilha é responsável pelo desvio de cerca de R$70 milhões dos cofres públicos de Rondônia. O superintendente da Polícia Federal em Rondônia, delegado Joaquim Cláudio Figueiredo Mesquita, informou que o governador Ivo Cassol também poderá ser investigado nessa operação da PF.

¿ O Poder Executivo estadual é atingido de alguma maneira. Há casos de liberação de emendas, que, a rigor, envolvem o Executivo. Mas se o governador tem conhecimento ou não de todo esse esquema, as investigações vão apontar ¿ disse Mesquita.

¿Compadrio entre os três Poderes¿

O superintendente afirmou ainda que ficou claro uma relação de ¿comprometimento e compadrio¿ entre os três Poderes. Os envolvidos responderão a processo por crimes como corrupção ativa, corrupção passiva, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, exploração de prestígio e peculato, entre outros.

O deputado Carlão é apontado como chefe da quadrilha. Além de desviar recursos públicos, o grupo é acusado de exercer influência indevida e promíscua sobre agentes de Poder Judiciário, Ministério Público, Tribunal de Contas e do Poder Executivo. Segundo a PF, a Assembléia tinha um esquema de laranjas que recebiam como se fossem funcionários públicos. Havia também fraude em contratos: produtos e serviços eram supostamente adquiridos junto a cerca de 20 empresas, mas o dinheiro saía voltava para as mãos da quadrilha na Assembléia.

Entre os presos estão a mulher de Carlão, Márcia Luiza de Oliveira, e mais dois irmãos e um cunhado dele, além de um assessor. O deputado estadual Amarildo Almeida, que não foi preso, é o que mais tem pessoas próximas envolvidas no esquema: o irmão, quatro assessores e o chefe de gabinete. Também foram presos filhos de outros deputados estaduais.

No cumprimento dos mandados de busca e apreensão, foram encontrados R$189.409 em notas pequenas na casa do deputado Edison Gazoni, e a PF acha que a verba seria usada para compra de votos. Com o diretor da Mesa Diretora da Assembléia, José Roberto Palitot, foram encontrados R$4.800 e com o deputado José Carlos de Oliveira, R$13.900. O desembargador Sebastião Chaves tinha R$30.500 em casa.

O filho do deputado Haroldo Santos foi preso em flagrante por posse ilegal de uma arma de fogo. Com o procurador Vitachi foi apreendida uma escopeta. Trezentos policiais federais de Amazonas, Distrito Federal, Mato Grosso, Acre e Rondônia participaram da operação, que cumpriu pelo menos 80 mandados de busca e apreensão e prisão.

¿ Poderia ser uma lista maior de presos, caso não houvesse imunidade parlamentar impedindo as prisões em flagrante. Dos 24 deputados estaduais, 22 são suspeitos ¿ disse o delegado Figueiredo.

Alguns presos são altos servidores da Assembléia. A Polícia Federal detectou também que há vários braços externos no esquema. Diversos empresários de Rondônia e também de outros estados estariam envolvidos com a quadrilha. Essas empresas participavam de processos licitatórios fraudulentos, para serviços inexistentes e compras e obras superfaturadas.

Dezenas de laranjas eram utilizados no esquema para emprestar nomes, dados e contas bancárias na movimentação financeira e também para ocultar o patrimônio e a titularidade das empresas envolvidas no esquema. A ação da quadrilha partia sempre de um mesmo grupo que operava na Assembléia Legislativa.

As investigações tiveram início em junho de 2005, a partir de uma série de reportagens exibidas em maio pelo programa ¿Fantástico¿, da Rede Globo, a partir de gravações feitas pelo próprio governador de Rondônia, Ivo Cassol (PPS), mostrando como deputados estaduais extorquiam grandes quantias em dinheiro para apoiar e votar projetos de interesse do governo estadual.

As imagens, gravadas em três fitas pelo governador, detalhavam as reuniões entre Cassol e os deputados. O material, segundo a PF, indicava a prática de crimes de concussão, corrupção passiva e formação de quadrilha. A partir daí a Polícia Federal obteve da Justiça Federal autorização para monitorar os envolvidos acusados. Essas investigações foram submetidas ao Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia e ao Superior Tribunal de Justiça.

Em investigações preliminares a PF descobriu que a atuação da quadrilha já comprometia algumas das instituições investigadas. O leque do trabalho policial foi ampliado, com a intenção de apurar a exata participação de desembargadores e conselheiros do Tribunal de Contas no esquema. Segundo a PF, a quadrilha cooptou altos membros do Poder Judiciário, do Ministério Publico e do Tribunal de Contas.

Em relatório ao Superior Tribunal de Justiça a PF detalha um aumento de repasses ao Ministério Público, ao Tribunal de Justiça e ao Tribunal de Contas. Segundo a PF, isso se deveu a pressões sobre as investigações do esquema na Assembléia Legislativa, que indicavam que havia acordos com esses órgãos. Por isso, as investigações sobre as fraudes na Assembléia teriam sido abafadas.

COLABOROU Evandro Éboli