Título: Estados muito caros
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 08/08/2006, O GLOBO, p. 2

Quando falava nas mazelas de Alagoas, Graciliano Ramos brincava que, retirado do mapa, seu estado daria um lindo golfo. Alagoas não virou a praia do futuro, mas hoje há coisas piores. A Polícia Federal prendeu boa parte da elite dos três poderes em Rondônia, mas a intervenção federal foi descartada: sua população ficaria excluída da eleição e nenhuma matéria constitucional poderia ser votada pelo Congresso. Está na pauta o Fundeb, tão importante para a educação.

Na sexta-feira foi um senador de Rondônia, o relator da CPI dos Sanguessugas, Amir Lando, que defendeu a intervenção. O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, descartou-a.

Há três estados da federação que estão sempre envolvidos em escândalos e maracutaias: Rondônia, Amapá e Roraima. Eram territórios até a Constituição de 1988. O Acre tornara-se estado bem antes, até bem pouco tempo atrás vivia também na fronteira da civilização, mas há alguns anos tornou-se um estado decente. O deputado Paulo Delgado (PT-MG) deseja mais que a intervenção defendida por Lando. Defende o retorno desses estados à condição de territórios federais.

¿ Na Constituinte, criamos estes estados fictícios que custam muito caro à União, em termos financeiros, e, por conta dos delitos recorrentes, custam muito à democracia. Tornaram-se a terra de Marlboro, onde todos querem levar vantagem em tudo. Terra onde aventureiros conseguem se eleger com muito dinheiro e pouco espírito público. O que está havendo em Rondônia mostra que a situação ali é desastrosa. Se esses estados voltarem a ser territórios, todos ganharão com isso, sobretudo suas populações ¿ diz Delgado.

Haveria certamente dúvidas jurídicas sobre essa possibilidade e uma guerra política numa eventual votação. Mas o deputado tem razão quanto à recorrência dos delitos, sobretudo em Rondônia e Roraima, onde a questão indígena também é grave. Em Roraima, a demarcação da Reserva Raposa-Serra do Sol ainda enfrenta resistências e gera conflitos. Em Rondônia tivemos, não faz muito tempo, a matança de garimpeiros que exploram diamantes na Reserva dos Cinta-larga. O contrabando rola solto ali, bem acobertado.

A Operação Dominó, desencadeada pela Polícia Federal na sexta-feira, foi a de maior impacto entre todas essas ações de combate à corrupção. Prendeu 23 pessoas, incluindo os presidentes da Assembléia Legislativa e do Tribunal de Justiça, assim como o candidato a vice na chapa do governador Ivo Cassol, que disputa a reeleição. O Ministério Público e o Tribunal de Contas também foram atingidos. Não sobrou nenhum poder.

E com isso, um partido que tem se destacado no combate à corrupção, como o PPS, levou também sua rajada de chumbo. Cassol é do PPS, assim como João Magno Ramos, seu companheiro de chapa. A imunidade evitou a prisão de 21 deputados envolvidos no esquema de corrupção e tráfico cruzado de influência, do tipo ¿proteja meus bandidos que eu protejo os seus¿. Outras 130 pessoas, incluindo servidores públicos e altos dignitários locais, estão sendo investigados. O esquema teria desviado cerca de R$70 milhões em dois anos.

Na Assembléia, a farra dos deputados deixa no chinelo esquemas como o dos sanguessugas: licitações viciadas, compras superfaturadas e até uma folha de pagamento com servidores fictícios, um duto que desembocava nas contas bancárias dos deputados estaduais.

Há poucos dias a principal organização criminosa paulista soltou um aviso telefônico: ¿O braço armado voltará a agir¿. As organizações policiais detectaram, mas não conseguiram impedir novos ataques.