Título: Juro dos EUA em parada estratégica
Autor: Patricia Eloy*
Fonte: O Globo, 09/08/2006, Economia, p. 25

WASHINGTON, NOVA YORK e RIO - O Federal Reserve (Fed, o banco central americano) interrompeu ontem um ciclo de mais de dois anos de alta nos juros ¿ foram 17 elevações desde meados de 2004 ¿ mantendo a taxa básica em 5,25% anuais devido à desaceleração da economia americana. Mas o Fed, sob o comando de Ben Bernanke, deixou claro que poderá voltar a subir os juros se o desaquecimento da economia não for suficiente para segurar a inflação. Essa postura esfriou o ânimo dos mercados e levou as bolsas americanas a fecharem em queda.

¿As pressões inflacionárias tendem a reduzir-se com o tempo, refletindo expectativas moderadas de inflação e o efeito cumulativo da política monetária (as altas anteriores) e outros fatores de contenção da demanda¿, afirmou o Fed em comunicado.

Indicadores recentes da economia apontam uma desaceleração da atividade, principalmente no mercado imobiliário, que vinha liderando a expansão dos eua. Ontem, por exemplo, o governo informou que a produtividade dos trabalhadores recuou de 4,3% para 1,1% no segundo trimestre.

O problema, segundo o Fed, é que ainda há pressão de salários e preços. O petróleo voltou a bater recorde este semana, com a cotação do barril em torno de US$ 77. Daí a cautela com a inflação futura por parte do BC americano, que ressaltou a existência de riscos e deixou aberto o caminho para novas elevações dos juros básicos.

Decisão do Fed não foi unânime

A decisão já era esperada pelos mercados. As quedas de 0,41% do Dow Jones e de 0,56% do Nasdaq (Nova York) se deveram à possibilidade de altas futuras na taxa básica.

¿ Eles fizeram basicamente o que era previsto ao deixar os juros estáveis. O mais importante, se você olhar o comunicado do Fed, é que eles estão deixando a porta aberta para novas altas, se necessário ¿ disse o economista Rick Egelton, da consultoria BMO Financial.

Para a próxima reunião, em 20 de setembro, a maioria dos especialistas espera que o juro continue em 5,25%.

A decisão do Fed não foi unânime: o presidente da instituição em Richmond, Jeffrey Lacker, era favorável a uma nova alta, de 0,25 ponto percentual. Para Mark Zandi, economista-chefe do site Economy.com, isso mostra que houve um debate caloroso na reunião.

A pausa foi bem recebida em mercados emergentes, como o Brasil. Analistas acreditam que a manutenção da taxa americana tende a alimentar o apetite dos investidores estrangeiros por ativos de nações em desenvolvimento. Isso porque, apesar da longa seqüência de elevações, os juros americanos continuam muito baixos se comparados às taxas de emergentes, como o Brasil, que remuneram os investidores a juros reais próximos a 10% ao ano.

Para Alexandre Maia, economista-chefe da GAP Asset Management, a decisão de ontem pode marcar o início de um período de estabilidade dos juros nos eua. Ele lembra que, historicamente, todas as vezes em que o banco central americano interrompeu uma seqüência de apertos ou afrouxamentos na política monetária, o que se viu foi uma longa pausa, para avaliar os efeitos da decisão.

¿ Isso ocorreu entre 1999 e 2000, quando o Fed subiu os juros para 6,5% ao ano e os manteve neste patamar por seis reuniões seguidas. O mesmo aconteceu em 2004, quando a taxa caiu para 1% ao ano e assim ficou por oito reuniões consecutivas. Se a história se repetir, essa será uma boa notícia para emergentes, já que os estrangeiros vêm para o país em busca do ainda grande diferencial de juros ¿ afirma Maia, que descarta novas altas pelo Fed.

Dólar cai no Brasil e fecha em R$ 2,178

Já Cecília Hoff, economista do Grupo de Conjuntura da UFRJ, não elimina a possibilidade de novas elevações de juros. Segundo ela, a trajetória da cotação do barril de petróleo definirá os próximos passos do Fed:

¿ Se os preços se mantiverem em patamares elevados, criando um risco potencial de inflação, podemos esperar novas altas de juros nos eua. Para o Brasil, no entanto, o impacto de tal medida deve ser limitado. Os estrangeiros, que têm voltado a aplicar no país, perceberam que os ativos do país são bem menos arriscados do que a média dos países emergentes.

Ontem, o dólar fechou no Brasil a R$ 2,178, menor cotação do dia, em baixa de 0,36%. O risco-Brasil, indicador da confiança dos investidores estrangeiros no país, recuou 1,83%, para 214 pontos centesimais. Após subir mais de 1%, a Bolsa de São Paulo encerrou o pregão em queda de 0,26%.

(*) Com agências internacionais