Título: Países árabes advertem ONU sobre conflito
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Fonte: O Globo, 09/08/2006, O Mundo, p. 33

NOVA YORK e BEIRUTE. Uma delegação da Liga Árabe acusou ontem o Conselho de Segurança da ONU de agir com lentidão diante do conflito entre Israel e a guerrilha xiita do Hezbollah, advertindo que o Líbano pode mergulhar numa guerra civil se as tropas israelenses não se retirarem do sul do país. Enquanto isso, o Líbano vive uma crise humanitária, com a ajuda não conseguindo chegar às vítimas. Novos ataques aéreos israelenses mataram ontem mais 14 pessoas, num conflito que já fez quase mil vítimas no lado libanês. Do lado israelense, quatro soldados morreram. O Líbano e a Liga Árabe pressionam a ONU a aprovar uma resolução que determine a retirada imediata das forças israelenses. Tal retirada não é mencionada num projeto de resolução feito por Estados Unidos e França, uma omissão que os países árabes consideram inaceitável. A votação do texto não deve ocorrer antes de amanhã.

¿ É deprimente que o conselho fique passivo, mutilado, incapaz de deter o banho de sangue ¿ disse o ministro de Relações Exteriores do Qatar, xeque Hamad bin Jassem bin Jabr al-Thani. ¿ O que está acontecendo irá plantar sementes de ódio e extremismo na região.

Israel discute hoje expansão da ofensiva militar

A Liga Árabe decidiu enviar uma delegação a Nova York após um apelo emocionado do primeiro-ministro do Líbano, Fouad Siniora, que quase chorou no encontro ¿ um fato criticado ontem pela ministra do Exterior de Israel, Tzipi Livni.

¿ Ele deveria secar as lágrimas e começar a agir ¿ disse a chanceler, acrescentando que Israel exige a devolução dos dois soldados seqüestrados pelo Hezbollah ¿sem condições¿.

Diante do impasse, a Rússia sugeriu que o Conselho de Segurança adote uma resolução provisória, pedindo um ¿cessar-fogo humanitário¿. O embaixador russo na ONU, Vitaly Churkin, deixou claro que a posição libanesa precisa ser ouvida.

¿ É óbvio para nós que uma proposta que não seja favorável ao lado libanês não deve ser adotada. Isso levaria ao prolongamento do conflito.

O anúncio do Líbano de que está disposto a enviar 15 mil soldados ao sul do país após a retirada israelense foi bem recebida na ONU e em Israel. O primeiro-ministro Ehud Olmert a considerou ¿interessante¿, mas disse que mesmo assim seu Gabinete discute hoje uma possível expansão das ações militares.

¿ É um passo interessante que precisamos examinar e ver todas as implicações ¿ disse Olmert.

Já o Departamento de Estado americano acredita que o Exército libanês não seja capaz de subjugar o Hezbollah. O presidente do Líbano, Emile Lahoud, acusou os EUA de serem contrários a um cessar-fogo imediato para dar tempo aos israelenses de ocuparem posições próximas ao Rio Litani.

Enquanto isso, as estradas no sul do país estavam vazias, depois de Israel advertir que pode bombardear ¿qualquer veículo que circular ao sul do Rio Litani, pois será suspeito de transportar armas para terroristas¿.

Ghaziyeh é bombardeada durante funeral

A restrição de movimentos imposta por Israel por tempo indeterminado e a destruição de uma ponte improvisada sobre o Rio Litani transformaram o sul numa área inacessível, segundo agências de ajuda humanitária, que buscam uma nova rota para levar medicamentos e alimentos à região. A ONU decidiu suspender o envio de ajuda ao sul.

¿ As forças israelenses abriram uma exceção para os comboios humanitários, mas decidimos não ir devido aos intensos combates ¿ disse Christian Berthiaume, do Programa Mundial de Alimentos.

Pelo segundo dia consecutivo, a aldeia libanesa de Ghaziyeh foi alvo de pesados bombardeios. Dois ataques ontem mataram 14 pessoas e feriram 23. No primeiro, dois prédios foram atingidos a 500 metros de onde eram enterradas as 15 vítimas da véspera. Segundo Israel, um dos prédios pertencia a um membro do Hezbollah. Uma hora e meia mais tarde, outros quatro prédios foram atingidos.

Já na madrugada de hoje (noite de ontem no Brasil), a Marinha israelense bombardeou pela primeira vez o campo de refugiados palestinos de Ain Helue, que abriga 50 mil pessoas.

Ao todo, Israel fez 40 ataques ontem ao sul do Líbano. O Vale do Bekaa também foi bombardeado, assim como Beirute. Em 28 dias de conflito, pelo menos 992 libaneses morreram. Nos combates em terra, quatro soldados de Israel morreram, elevando o número de israelenses mortos até agora para 101. O Hezbollah disparou 160 foguetes contra Israel ontem, ferindo quatro pessoas.

Sob fortes críticas, o Exército israelense nomeou um novo comandante para as operações no sul do Líbano: o major-general Moshe Kaplinsky, que passará a coordenar as operações, enfraquecendo a posição do general Udi Adam, chefe do Comando Norte. Adam teria enfurecido Olmert ao declarar que políticos estavam limitando a campanha militar no Líbano.