Título: Separar a ninhada
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 11/08/2006, O Globo, p. 2

Contra 18 deputados a CPI não encontrou provas, mas pedir a cassação de 72, incluindo três senadores, foi uma façanha nestes tempos de impunidade. Pressões imensas deve ter sofrido o relator amir Lando para salvar cabeças. afora as listas dos militares, cassando democratas que resistiam à ditadura, nunca se tentou expurgo tão grande no Congresso. Por isso mesmo, está posta a questão: poderão eles continuar votando até que sejam julgados pelo Conselho de Ética?

Na Câmara, serão abertos processos contra 69 deputados no Conselho de Ética. Mas, tal como os 18 do valerioduto, eles continuarão votando e desfrutando de todas as prerrogativas até serem julgados pelo plenário. Votando inclusive contra a própria cassação e a dos colegas de lista. antes da eleição de 1 de outubro a Câmara pode não aprovar nada de relevante, mas, passado o pleito, deve trabalhar até 31 de dezembro (se não inventarem uma convocação em janeiro). Qualquer votação que ocorrer nesse período sofrerá déficit de legitimidade se dela participarem os sanguessugas. Uma deliberação por maioria simples exige a presença de metade mais um da Casa (257 deputados) e o voto de metade mais um dos presentes. Logo, pode ser decidida por 129 votos. Os 69 sanguessugas podem, a rigor, decidir qualquer votação. Mesmo um dos projetos da reforma política que estão prontos para serem votados.

anteontem, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), que foi relator da CPI dos Correios, apresentou projeto de resolução proibindo que eles participem das votações para cassação do próprio mandato e dos colegas acusados. Invoca ele uma regra difusa do direito que impede os juízes de atuarem em casos nos quais tenham interesse pessoal. Deputados também deveriam sujeitar-se a ela, diz Serraglio. Quando votam cassações, estão no papel de juízes. Mas tantas coisas eles não deveriam fazer e fazem, com a maior desfaçatez.

Serraglio propõe também que os processados sejam excluídos do cálculo da maioria absoluta exigida para cassações. Em vez de 257, seriam necessários, para a cassação, 222 votos (metade mais um de 513 menos os 69 sanguessugas). Na semana que vem, os líderes dirão se apóiam ou não o pedido de urgência para se votar a resolução. Se aprovada, será um avanço, mas ainda é pouco. Para preservar a legitimidade de todas as votações, e não apenas a dos processos de cassação, a ninhada toda deveria ser excluída, até o julgamento de cada um. Na Grécia era assim. Quem respondia a acusações era submetido ao ostracismo. Ficava impedido de votar na ágora até ser inocentado ou até depois do cumprimento da pena.