Título: Tenso, Lula erra e renega ações do passado
Autor: Lydia Medeiros
Fonte: O Globo, 11/08/2006, O País, p. 15
RIO e BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição pelo PT, não ofereceu respostas precisas sobre os casos de corrupção que envolveram seu partido e ministros do governo durante entrevista ontem ao ¿Jornal Nacional¿, da Rede Globo. Lula, que diferentemente dos adversários não compareceu à emissora e foi entrevistado no Palácio da Alvorada, insistiu que só soube das denúncias (o mensalão e o valerioduto) ¿depois que aconteceram¿.
Lula tentou isentar o PT, apesar de toda a cúpula do partido ter caído com as denúncias e ter sido denunciada ao Supremo Tribunal Federal por comandar a ¿organização criminosa¿ do mensalão. E tampouco quis revelar os nomes daqueles que supostamente o traíram, segundo ele próprio declarara no ano passado. Lula aparentou tensão e ainda se confundiu ao tentar listar as ações do governo contra a corrupção, chegando a falar ¿combate à ética¿.
¿ O procurador-geral da República foi escolhido por mim sem que sequer eu o conhecesse, numa demonstração de que o combate à ética significa você permitir que as instituições façam as investigações que precisam fazer ¿ disse, nervoso.
Embora o comando do PT tenha se envolvido com o mensalão e o valerioduto, Lula disse que as denúncias não afetam o partido. O apresentador William Bonner insistiu, lembrando que havia ministros envolvidos, como José Dirceu, da Casa Civil, tratado pelo procurador-geral como ¿chefe da organização criminosa¿. E perguntou ao presidente se ele duvidava da idoneidade e da competência do procurador. Lula se defendeu:
¿ Se tivesse, não tinha indicado. Procurador da República no meu governo indicia. Nos outros governos, engavetava ¿ afirmou, acrescentando:
¿ É com esse grau de liberdade que quero que ele funcione, e é com esse grau de liberdade e respeitando o estado de direito que quero que as pessoas que foram indiciadas por ele vão ao Supremo Tribunal Federal.
Lula disse que como presidente é o responsável por qualquer erro cometido por um funcionário público, direta ou indiretamente, mas afirmou que só poderia ter agido de outra forma se soubesse:
¿ Eu só poderia fazer diferente se soubesse antes.
E comparou um presidente a uma família:
¿ Há famílias com problemas dentro de casa e a família não sabe. Como pode alguém querer que é o presidente da República, embora tenha de assumir responsabilidade, saiba o que está acontecendo agora na Secretaria (na verdade, delegacia) de Agricultura de São Paulo, com meus ministros que não estão aqui?
A apresentadora Fátima Bernardes então perguntou se ele acha que o eleitor espera dele responsabilidade como governante ou o comportamento de uma mãe que age com amor cego por um filho.
Lula insistiu que o governo está apurando as denúncias e citou o trabalho da Controladoria Geral da União, afirmando que fora criada em seu governo.
De novo, errou. O órgão foi criado pelo ex-presidente Fernando Henrique em 2 de abril de 2001. A primeira ministra da CGU foi Anadyr de Mendonça Rodrigues. Lula mudou o nome da CGU, passando a chamar o titular da pasta de ministro do Controle e da Transparência, e ampliou suas atribuições.
Bonner lembrou que Lula se solidarizara publicamente com ministros e petistas, mesmo acusados, num comportamento diferente daquele que adotava antes da Presidência, quando defendia punição para acusados antes da confirmação da culpa.
¿ Você deve estar falando de outra pessoa ¿ disse Lula, afirmando que ele afastara Dirceu e Antonio Palocci.
Mas Lula também não foi correto neste ponto. O próprio Dirceu anunciou sua demissão, publicada no Diário Oficial como exoneração, a pedido, no dia 16 de junho de 2005. Fez um pronunciamento tendo atrás de si 18 ministros. Teve uma última reunião com o presidente, quando entregou uma carta. Chamou Lula de ¿querido companheiro e amigo¿. Lula respondeu em carta chamando-o de ¿Querido Zé¿.
O presidente também disse que afastou Palocci. Mas, no dia de sua saída, houve dúvidas sobre se ele estava se demitindo ou apenas de afastando do cargo temporariamente. Palocci se despediu afirmando que saía com a consciência tranquila e negando ter patrocinado ¿malfeitorias com recursos públicos¿, numa cerimônia onde foi chamado por Lula de ¿mais que irmão¿.
Erro sobre o tamanho do país
Ao falar sobre segurança, o presidente confundiu números sobre a extensão territorial do país. Disse que o Brasil tem 17 mil km de fronteira. E acrescentou:
¿ Não são 17 mil metros, são 17 milhões (de metros). São 7 milhões de fronteira marítima e 9 milhões de fronteira terrestre.
O presidente errou: são 23 mil km de fronteira, sendo 15,7 mil km de fronteira seca e 7,3 mil km de marítima. Ao falar em 9 milhões de fronteira terrestre, o presidente fez confusão com os números. Pode ter se lembrado dos mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados da extensão do território do país.
Ao encerrara entrevista Lula cometeu outro deslize: disse que os índices econômicos melhoraram e que ¿a única coisa que cai é o salário¿.
COLABOROU Diana Fernandes