Título: Efeito colateral do petróleo
Autor: Luciana Rodrigues e Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 11/08/2006, Economia, p. 37

Guerra no Líbano, crise no Irã, onda de calor nos Estados Unidos e os preços de plástico ficarão mais altos no Brasil. As turbulências na geopolítica internacional e os fatores climáticos que fizeram as cotações do petróleo disparar nas últimas semanas já estão afetando a economia brasileira. Desde setembro do ano passado, a Petrobras não reajusta os preços do óleo diesel e da gasolina. Mas o consumidor poderá sentir os Efeitos da alta do petróleo de forma indireta: na cadeia petroquímica e da indústria de plásticos, os produtores vão emplacar aumentos de até 18% nos próximos dias.

O querosene de aviação subiu 24% desde o início do ano ¿ o que encarece as passagens aéreas. E alguns fertilizantes já estão 30% mais caros do que há alguns anos, afetando a produção agrícola.

Também não é para menos: o petróleo bateu US$ 78 na segunda-feira e seus preços médios, este ano, estão 24% acima dos registrados em 2005 e 76% maiores do que eram há dois anos. Os derivados do petróleo acompanharam essa disparada nas cotações. Segundo José Ricardo Roriz, presidente do Sindicato da Indústria de Resinas Plásticas (Siresp), o preço da nafta petroquímica saiu de um patamar médio de US$ 300 a US$ 400, nos últimos dez anos, para US$ 650 entre julho e agosto. A nafta representa, em média, 70% dos custos de produção da indústria petroquímica.

¿ A demanda mundial está em alta, as vendas cresceram, mas nossas margens se comprimiram. Quase 80% das empresas tiveram prejuízo no último trimestre ¿ disse Roriz, que também é diretor da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim).

Cliente e fornecedor em queda-de-braço

Segundo Roriz, as empresas do setor estão reajustando entre 15% e 18%. Mas a negociação com os clientes é difícil e a perda de rentabilidade pode levar as indústrias a adiarem investimentos.

A Braskem, maior petroquímica da América Latina, em que pese ter mantido seu volume de vendas, amargou um prejuízo de R$ 54 milhões no segundo trimestre do ano. Com isso, o lucro acumulado dessa gigante do setor no primeiro semestre de 2006 ficou em R$ 71 milhões. O vice-presidente de Relações Institucionais da Braskem, Alexandrino de Alencar, explicou que só este ano os preços da nafta sofreram um reajuste médio acumulado da ordem de 35%. E, no ano passado, o produto também subiu, cerca de 20%:

¿ O reflexo do petróleo nos preços da nafta são imediatos, tanto aqui como no exterior.

A Petrobras reajusta os preços da nafta, com base em uma cesta de cotações internacionais, todo mês. Além disso, cerca de 30% a 40% da nafta consumida no país é importada. Mas enquanto o aumento da nafta é imediato, as indústrias não conseguem reajustar seus preços tão rapidamente, diz Alexandrino:

¿ Se nós aumentarmos muito os preços, o cliente pode comprar lá fora, principalmente porque o dólar está baixo. São as dores de parto de ter um mercado aberto.

Mas o executivo informou que a Braskem vai fazer um reajuste em seus preços entre 10% a 15% nas próximas semanas, porque não tem mais condições de absorver a alta nos custos.

Mesmo quem usa outros insumos acusou o golpe. A Rio Polímeros, maior complexo gás-químico integrado da América Latina, elevou em 10% os preços do polietileno que produz no último dia 1. A principal matéria-prima da empresa não é o nafta, mas sim o gás natural que, mesmo extraído da Bacia de Campos, tem seus preços atrelados às cotações internacionais. Segundo Eduardo Berkovitz, diretor comercial da Rio Polímeros, o gás aumentou mais de 25% desde o início do ano. Berkovitz não descarta que a empresa faça novos reajustes:

¿ petróleo a US$ 78 é algo fora dos padrões ¿ afirmou.

As vendas do setor petroquímico cresceram em média 14% este ano, mas, devido à perda de rentabilidade com o aumento dos custos, as ações das principais empresas caíram com força. Desde janeiro, os papéis de Braskem, Suzano e Unipar acumulam perdas de mais de 20%.

Na indústria de transformação plástica, o impacto é ainda maior. São 8.500 empresas no setor, que enfrentam forte concorrência e têm dificuldade de repassar a alta dos custos.

Preço da gasolina: defasagem de 16%

Na pequena fábrica de embalagens PJ Plastika, de Duque de Caxias, o preço da matéria-prima polipropileno subiu 15%. Mas, segundo José Mendes Monteiro, gerente da fábrica, só foi possível praticar reajustes com alguns clientes.

¿ A velocidade dos aumentos para a gente é muito diferente. Nossos fornecedores, que são as petroquímicas, são gigantes. E nossos clientes finais, grandes montadoras e redes de varejo, também ¿ queixou-se Merheg Cachum, presidente da Associação Brasileira da Indústria Plástica (Abiplast). ¿ Mas de alguma maneira vamos ter que repassar essas altas.

O petróleo também afeta os preços de fertilizantes nitrogenados, que são usados em lavouras de milho, café e cana-de-açúcar, entre outras. Segundo André Pessôa, diretor da consultoria Agroconsult, esse tipo de fertilizante subiu 30% em três anos.

Mas o impacto maior para o bolso do consumidor virá quando a gasolina e o óleo diesel forem reajustados. Segundo cálculos do especialista Adriano Pires Rodrigues, os preços da gasolina estão defasados em 16% em relação ao mercado americano, enquanto o óleo diesel está 21% mais barato do que no exterior.

Ontem, as cotações do petróleo recuaram em meio à expectativa de que a demanda por combustíveis diminua após a ameaça de atentados terroristas no Reino Unido. O barril do tipo Brent caiu US$ 2, para US$ 75,28.