Título: Doze minutos e dez segundos para a história
Autor: Luiza Damé e Cristiane Jungblut
Fonte: O Globo, 12/08/2006, O País, p. 13

Nunca na TV brasileira um presidente foi confrontado com questões tão espinhosas como Lula no `JN¿

Rodolfo Fernandes

Foi uma entrevista histórica, 12 minutos e dez segundos que criam um novo paradigma para coberturas políticas no país. Nunca, na TV brasileira, um presidente da República foi confrontado com questões tão espinhosas quanto as que foram colocadas na quinta-feira, no ¿Jornal Nacional¿, para o presidente Lula.

Respeitosamente, como deve ser, mas sem aliviar em nenhuma pergunta, Lula teve que se manifestar sobre todos os temas que frequentaram e frequentam o noticiário político no período de seu mandato ¿ a maioria dos quais nunca havia sido diretamente levada a ele. Perguntas que, de resto, foram feitas aos demais candidatos. Nelas, Alckmin errou nos números de um tema tão importante como a educação; e Heloísa Helena praticamente rasgou ao vivo o programa de seu recém-fundado partido.

O Brasil conheceu o padrão de entrevistas que o jornalismo americano adota, em que o entrevistado tem que dar satisfações claras sobre qualquer questão pública, por mais dura que seja. Se a pauta do país é corrupção, que responda sobre corrupção. E azar de quem não tenha as respostas adequadas. Para quem passou dois dias inteiros preparando-se para esses 12 minutos, o presidente Lula demonstrou nervosismo, revelados através da boca seca, do olhar irritação e da enorme confusão com números e fatos.

Três momentos podem entrar na antologia das entrevistas de TV no Brasil. Quando Lula tentou se comparar a um chefe de família que não poderia saber do erro de um filho, para justificar eventuais desconhecimentos de escândalos em seu governo, Fátima Bernardes interrompeu:

-Mas o senhor acha que o eleitor espera o comportamento de uma mãe zelosa ou de alguém que possa administrar e coordenar o governo?

Depois, quando tentou fazer prevalecer a tese de que as investigações foram levantadas pelo seu governo, o que não é exato, foi a vez de William Bonner afirmar, com uma desconcertante naturalidade, possível apenas a quem se preparou bem para a entrevista:

- Na verdade o governo não denunciou nada ¿ informou o entrevistador, lembrando que tudo começou com o escândalo dos Correios e a denúncia de Roberto Jefferson.

Ou ainda a pergunta de Bonner sobre as diferenças de Lula como acusador, na oposição, e como vítima, no governo:

- O que fez o senhor mudar tanto de comportamento?

A campanha eleitoral começou efetivamente com a série do ¿JN¿. Os entrevistadores fizeram seu dever de casa e estudaram antes de sentar diante dos entrevistados. Os candidatos, não. Pouco importa o efeito político posterior dessas entrevistas, que pode ser até nenhum. O importante é que foi uma afirmação do jornalismo. Os eleitores só têm a ganhar com entrevistas como essas.

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