Título: Dilemas em alta
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/08/2006, Panorama Político, p. 2

Apesar do otimismo exibido ontem pelo candidato Geraldo Alckmin ¿ ¿pode escrever: estou no segundo turno¿ ¿, seus aliados estão preocupados com os rumos da campanha e com o risco de defecções diante da consolidação do candidato-presidente. O dilema agora é: como lidar com o dado mais revelador da pesquisa Datafolha, a alta aprovação ao governo Lula.

O prefeito Cesar Maia destacou ontem em seu ex-blog que, embora Lula tenha tido 49% de intenções de voto, deve-se tomar os 52% de avaliação positiva do governo como seu teto eleitoral. Para Cesar, isso ¿aumenta ainda mais a necessidade da campanha de Alckmin desconstruir Lula¿. As cobranças dessa natureza estão aumentando, mas há também na campanha quem discorde, a começar pelo núcleo de marketing, que fez a opção por ¿construir¿ Alckmin, mostrando que ele pode fazer muito mais que Lula, combinando eficiência e ética. Ali, acredita-se que uma escalada de ataques ao presidente neste momento produziria efeitos adversos, como a vitimização do presidente junto aos eleitores que Alckmin precisa conquistar.

Ele ainda tem chão pela frente, até cresceu na Região Sul, agregando um ponto percentual à sua média nacional. Mas vai ficando claro que a oposição subestimou a satisfação de amplas camadas do eleitorado com os resultados do governo Lula, ao apostar todas as fichas no potencial arrasador das denúncias de corrupção. A população foi informada sobre eles, os meios de comunicação fizeram seu papel, a oposição explorou-as intensamente. Mas, mesmo informado, o eleitorado vai mostrando que valoriza mais os ganhos com a política econômica (aumento do poder de compra combinado com inflação baixíssima), sem falar nos benefícios assistencialistas que contentam os muito pobres. Esses ganhos estão se sobrepondo à questão ética não porque ela seja irrelevante, mas porque houve um nivelamento por baixo. Nas palavras do senador Jefferson Péres (PDT-AM), ¿prevalece o entendimento de que o sujo está falando do mal lavado¿.

Como diz o cientista político Marcos Coimbra, do Vox Populi, governo não melhora da noite para o dia. Os programas eleitorais de Lula é que conseguiram ¿ mostrando feitos e aumentando os efeitos ¿ contaminar positivamente a avaliação de governo. Mesmo assim, continua posto para a coligação tucano-pefelista o desafio de ajustar sua estratégia com o carro andando e o tempo encurtando. Lula apresentou, ainda, uma rejeição em queda e um voto espontâneo em alta. Esse último é tido como um indicador da solidez do voto.

O programa de Lula seguirá em linha reta. Em sua campanha, ouve-se que o governo é bem avaliado mas é mal compreendido. O desafio do programa seria superar essa dicotomia, demonstrando que as políticas sociais e a política econômica são faces complementares de um mesmo projeto de governo, na linha de crescimento com distribuição de renda.

As damas fora na campanha

Segundo a última pesquisa Datafolha, Lula continua tendo déficit de apoio entre as mulheres, comparativamente ao universo masculino. Tem 54% de preferência entre os homens contra 44% entre as mulheres. Alckmin, pelo contrário, tem mais apoio entre as mulheres (26%) do que entre os homens (24%).

O programa eleitoral de Lula deve enfrentar esse problema com mensagens voltadas para as mulheres. Até agora, nem dona Marisa Letícia nem dona Lu Alckmin apareceram nos programas dos maridos.

Anteontem, no lançamento do livro de Ricardo Kotscho, ex-assessor de imprensa de Lula, Marisa disse que está sendo chamada para uma gravação, mas ainda não pôde fazer isso. E tem discurso de campanha para a questão.

¿ Esta lei contra a violência doméstica vai acabar com muita ignorância que ainda existe por aí. E a ministra Nilcéa Freire faz um trabalho exemplar à frente da Secretaria de Políticas para Mulheres.

Teses para a reforma

A campanha tucana prega o voto distrital puro. O PT, o voto proporcional com listas fechadas de candidatos. Nem uma coisa nem outra, mas a combinação das duas, diz o senador Jefferson Péres (PDT-AM).

¿ A reforma não é uma missão impossível, como dizem. O Senado já aprovou quase tudo e, se todos entendem mesmo a sua necessidade, a Câmara fará a sua parte no início da próxima legislatura, sem sanguessugas e longe das paixões eleitorais.

Para o senador, nosso sistema eleitoral deve ser misto. No distrito, o eleitor votará na pessoa, como é de seu gosto, e terá a oportunidade de vigiar melhor seu deputado. A outra metade das cadeiras de cada estado, a seu ver, deve ser eleita em sistema proporcional, com listas fechadas. O voto no partido fortalecerá o sistema e induzirá à fidelidade. Pode haver, sim, influência dos caciques na elaboração da lista, mas esse poder será reduzido pela outra escolha, a do distrito, onde terão vez os mais vinculados à população.

A hora de discutir a reforma é agora mesmo, diz o senador, enquanto a campanha corre e o eleitor está mais interessado. Ainda que nem tanto.