Título: AMAZÔNIA TEM 76 ROTAS DE TRÁFICO DE MULHERES
Autor: Ismael Machado
Fonte: O Globo, 27/08/2006, O País, p. 25

Documento que mapeia situação no país levou dez anos para ser concluído e será divulgado em setembro

BELÉM. Da janela de um hotel em frente ao principal cartão-postal de Belém, o Mercado do Ver-o-Peso, a maranhense M.M.S, de 26 anos, lembra os cinco anos em que foi obrigada a se prostituir no Suriname, após ter sido aliciada na principal feira da cidade. Ela foi convidada para trabalhar como bailarina, mas acabou num clube de prostituição.

¿ Os surinameses nos tratam como cachorros. Tive que fazer sexo com vários homens ao mesmo tempo. Trabalhava das 22h às 4h todo dia ¿ conta.

A história da maranhense que saiu de São Luís tentando melhorar de vida é igual à de muitas outras contadas no relatório ¿Migração e tráfico de seres humanos do Pará para Suriname e Holanda¿, um documento que será divulgado em setembro pela ONG Forum da Amazônia Oriental (Faor), por meio do Observatório da Cidadania, um instrumento de avaliação das políticas públicas no Brasil.

Resultado de dez anos de pesquisa, o relatório mostra que a Amazônia é hoje a principal rota de saída para o tráfico de mulheres. Em todo o Brasil já foram identificadas 241 rotas de tráfico de seres humanos. Na Amazônia, os pesquisadores identificaram o maior número delas (76). Países como Holanda, Suriname e Espanha são os principais destinos das mulheres traficadas.

¿ Elas são atraídas por promessas falsas de dinheiro, casamento ou um trabalho diferente da prostituição. Depois descobrem que não é nada disso ¿ conta Lourdes Barreto, coordenadora do Gempac, o Grupo de Mulheres Prostitutas do Estado do Pará, uma ONG que dá auxílio a mulheres prostitutas em toda a Amazônia.

Os relatos são diversos. Duas irmãs de Belém foram convidadas pela tia para trabalhar no Suriname, onde ela mora. A tia emprestou às duas R$200 para que tirassem passaporte em Belém. No Suriname, elas foram levadas ao clube Diamond, um dos mais famosos redutos de prostituição de brasileiras. A dívida era a forma de manter as duas presas ao clube, para que não pudessem fugir.

¿ Nossa tia falou que tínhamos que ficar na casa até pagarmos nossa dívida e que não poderíamos tentar fugir, pois seríamos caçadas e, provavelmente, mortas ¿ contam.