Título: CHINA DISCUTE A PROPRIEDADE PRIVADA
Autor: Gilberto Scofield Jr.
Fonte: O Globo, 24/08/2006, Economia, p. 27

País inicia regulamentação de lei, mantendo papel dominante do Estado

A China começou ontem a regulamentar a polêmica emenda constitucional que, em 2004, instituiu o direito à propriedade privada no país. Mas a propriedade pública - conceito que inclui desde a riqueza do subsolo chinês às estatais e seus ativos - continuará a ter - papel dominante - na economia chinesa, apesar de a lei garantir aos bens privados a mesma proteção jurídica que oferece hoje às áreas do Estado.

A informação foi dada à agência de notícias estatal Xinhua por Hu Kangsheng, vice-presidente do comitê de assuntos legais do Congresso Nacional do Povo (CNP). Hu não forneceu detalhes sobre como a lei vai conciliar a vontade dos reformistas - que pretendiam igualar propriedade pública e privada em termos jurídicos na Constituição - com o desejo da velha guarda comunista - que prega um tratamento diferenciado para os bens estatais - em sua regulamentação.

- O comitê legal considera que, levando em conta a realidade nacional chinesa, a preocupação maior na elaboração da lei será refletir adequadamente o sistema econômica básico do país, em que a propriedade pública possui um papel dominante e em que várias formas de propriedade possam se desenvolver lado a lado - disse Hu.

O Comitê Permanente do CNP (o grupo de políticos ligados ao Partido Comunista que efetivamente elabora as leis aprovadas a cada ano pelo Congresso) começou a analisar ontem a quinta versão do projeto de lei, que já deveria ter sido aprovado no plenário em março deste ano, mas que saiu da pauta por pressão dos comunistas mais conservadores.

E o impasse persiste. Afinal, a China precisa dar segurança jurídica aos investidores estrangeiros que, todos os anos, injetam mais de US$60 bilhões na economia e garantem boa parte do crescimento acima de 10% do Produto Interno Bruto. Ao mesmo tempo, a ala mais conservadora do Partido Comunista da China (PCC) teme que, ao abrir uma brecha legal para o indivíduo, a iniciativa privada acabe inibindo o poder do Estado a longo prazo.

Jornais asiáticos disseram que a disputa reflete o incômodo crescente, dentro do PCC, com o fato de que o partido está perdendo o controle total sobre a economia. Mas, se a ideologia implantada por Mao Tsé-Tung enfrenta dilemas no campo político, no econômico o país caminha para se tornar uma potência de verdade.