Título: UMA REVOLUÇÃO NO CÉU
Autor: Ana Lucia Azevedo e Roberta Jansen
Fonte: O Globo, 25/08/2006, O Mundo Ciência e Vida, p. 32

Plutão perde status de planeta. Astrônomos decidem que só há 8 deles em torno do Sol

Seu nome será apagado dos livros escolares. Ele agora é apenas mais um na multidão de pequenos astros de segunda classe do Sistema Solar. Quase que por unanimidade e numa reviravolta inesperada, os astrônomos baniram Plutão da lista de planetas. Desde ontem, por decisão da União Mundial dos Astrônomos (UIA), o Sistema Solar tem apenas oito planetas: Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Escuro, gelado e menor até do que a Lua, Plutão foi rebaixado. Como prêmio de consolação, o ex-planeta tornou-se o primeiro - mas sequer o maior - da nova classe dos planetas-anões. Eles deverão se chamar plutônicos, mas nem isso está decidido. Não houve consenso. E a classificação terá de esperar até pelo nome.

Em vez da companhia dos planetas, Plutão agora está no mesmo grupo de Ceres - o grande asteróide do cinturão entre Marte e Júpiter - e de UB313 (extra-oficialmente conhecido como Xena). Caronte, sua lua, que na semana passada era séria candidata a planeta, ficará num grupo ainda mais inferior: satélite de planeta-anão. Os planetas-anões são astros - estima-se que existam centenas deles - no desconhecido Cinturão de Kuiper, uma região gelada nos confins do Sistema Solar.

Descoberto em 1930 pelo americano Clyde Tombaugh, Plutão sempre foi um estranho dentre os planetas. Longe demais, muito pequeno, ele não é bem observado mesmo pelos mais potentes telescópios terrestres. A decisão de ontem, tomada durante a reunião da UIA em Praga, na República Tcheca, pode causar surpresa ao público, mas reflete uma discussão de anos entre os especialistas.

Nos últimos tempos, no entanto, o debate se acirrou ainda mais com a descoberta de uma série de objetos de tamanho semelhante ou até maior do que Plutão. Assim, os astrônomos se viram diante de um dilema: precisavam decidir se Plutão deixaria de ser planeta ou se ampliavam o conceito e abrigavam numerosos outros astros. Já sabiam, porém, que o Sistema Solar nunca mais seria o mesmo. Após sete décadas, nossa visão do espaço estava fadada a mudar.

- Hoje cedo, fiquei com os olhos marejados de lágrimas. Mas no fim do dia havíamos cumprido nossa missão e descrito o Sistema Solar como ele realmente é, e não como gostaríamos que ele fosse. Triste, mas é verdade - disse Iwan Williams, diretor do painel da UIA que trabalhou nos últimos meses na definição do que é um planeta.

Mais concisão nos livros escolares

De acordo com as novas regras aprovadas em Praga, a partir de agora, para um corpo ser considerado um planeta do Sistema Solar ele deve atender a três requisitos básicos: deve estar em órbita do Sol, ser o objeto dominante em sua trajetória no espaço, e ser grande o suficiente para ter um formato esférico - por questões da física, tal formato só ocorre em corpos de grande massa. Plutão, definitivamente, não atende ao segundo quesito. O que o enquadra, segundo as novas regras, na categoria de planeta-anão, ou seja, grande o suficiente para ser arredondado, mas não para ser dominante em sua órbita.

- Além disso, Plutão não é rochoso nem gasoso como os planetas do Sistema Solar - aponta o astrofísico Enos Picazzio, do Instituto de Astronomia Geofísica (IAG) da USP. - Ele é congelado, o que já o coloca numa outra classe.

Mas a decisão dos astrônomos também levou em conta o sistema educacional. Se tivesse prevalecido a proposta apresentada originalmente - de um Sistema Solar com 12 planetas e uma definição bem mais abrangente da categoria - em um ano já seriam 22 planetas. Em dois anos, poderiam ser 32, dados os avanços tecnológicos e o número crescente de novas descobertas. Com a aprovação da proposta, ganha-se concisão e clareza nos livros didáticos, em vez de um Sistema Solar intrincado e difícil de ser assimilado.

- A decisão foi acertada - sustenta o astrônomo Fernando Roig, do Observatório Nacional, que esteve em Praga na semana passada e participou dos debates. - Se tivesse prevalecido a outra proposta, não adicionaríamos apenas três planetas. A cada ano o Sistema Solar aumentaria. E é bom lembrar que a definição não é só para cientistas, mas para todo o sistema educacional.

Mas há descontentes. Alguns astrônomos questionaram as novas regras, sobretudo a que determina que planetas são corpos dominantes em suas órbitas, já que a trajetória de Netuno seria cruzada pela órbita de outros corpos.

(*) Com agências internacionais

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