Título: HUMBERTO COSTA DIZ SER VÍTIMA DE COMPLÔ COM OBJETIVOS POLÍTICOS
Autor: Letícia Lins
Fonte: O Globo, 26/08/2006, O País, p. 4

Ex-ministro e candidato ao governo de PE afirma que autoriza quebra de sigilo

RECIFE. Indiciado com mais 41 pessoas em inquérito da Polícia Federal por formação de quadrilha, corrupção passiva e fraude em licitação, o ex-ministro da Saúde Humberto Costa disse ontem que provará sua inocência e que autoriza a quebra de sigilo fiscal, bancário e telefônico dele e de toda a família.

O petista, que é candidato ao governo de Pernambuco, disse que sua iniciativa tem o objetivo de facilitar a investigação do Ministério Público, caso este queria fazer uma devassa em sua vida. O ex-ministro se disse vítima de um complô e alegou que seu indiciamento tem objetivos políticos, a pouco mais de um mês da eleição. Costa disse também que foi o autor da denúncia sobre a existência da máfia dos vampiros à Polícia Federal e que, por isso, estranha que tenha passado de acusador a acusado.

¿ Isso tem objetivo político. Há poucos dias tentaram me envolver na máfia dos sanguessugas, mas quebraram a cara. O próprio empresário envolvido na fraude da compra de ambulâncias (Luiz Antônio Vedoin) foi muito pressionado, mas disse várias vezes que não tenho nada a ver com aquilo ¿ disse Costa em entrevista que convocou ontem, em seu comitê de campanha. ¿ Estou me antecipando a um fato negativo porque tomei conhecimento que os resultados desse inquérito já estão com a imprensa.

Ele deu a entrevista para se defender antes de a PF confirmar o indiciamento.

Na entrevista estavam presentes o prefeito petista de Recife, João Paulo, e representantes de todos os partidos que integram sua coligação.

¿ Cortei gordura e sou chamado de vampiro, não dá para entender. Quando assumi, um frasco de hemoderivado era fornecido ao Ministério da Saúde a US$0,41, e quando saí o mesmo medicamento era comprado pelo governo por valores que variavam de US$0,12 a US$0,16.

O inquérito foi concluído em Brasília pelo delegado Marcelo Mazelli, da PF, a quem o ex-ministro prestou depoimento em julho, durante mais de 16 horas, em Recife. Costa foi indiciado há 20 dias e tomou conhecimento há dez, mas só ontem resolveu falar sobre o assunto. Ele insistiu no argumento de que denunciou a máfia:

¿ Que chefe de gangue burro é esse que destrói todo o esquema de uma máfia em que se alimentava e denuncia o esquema? Quem entrar hoje no site da Polícia Federal vai observar que a Operação Vampiro foi desencadeada a partir de uma denúncia do então ministro Humberto Costa. Como passo da qualidade de denunciante à de réu?

Denúncia teria motivado ameaça de morte

Costa disse que foi ameaçado de morte por fazer a denúncia e disse estar com a ¿consciência tranqüila¿:

¿ Por ocasião da denúncia fui ameaçado de morte, passei mais de um mês andando com segurança e, agora, sou denunciado como parte do esquema. Várias conclusões que esse delegado tira para me indiciar vieram de auditorias que mandei fazer.

Costa confessou-se preocupado com os efeitos políticos e eleitorais do episódio:

¿ O inquérito não tem consistência. Serei inocentado, mas o prejuízo político é significativo. Quero dizer agora, e estou me antecipando, que sou inocente e peço que o eleitor faça seu julgamento.

Costa confirmou ter recebido em seu gabinete, em Brasília, a visita de Laerte Correia, um lobista ligado à máfia dos vampiros que está, assim como ele, indiciado no inquérito policial.

¿ Há 42 indiciados, muitos inclusive do governo anterior. Laerte não era funcionário do Ministério da Saúde, mas uma vez foi ao meu gabinete com um grupo de laboratório.

Costa cogitou até a existência de um complô para atingir sua candidatura e a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que concorre à reeleição, pois Pernambuco é um estado estratégico na eleição presidencial, onde Lula aparece com mais de 65% das intenções de voto.

¿ Essa Operação Vampiro foi deflagrada em 2004. Recebi uma carta anônima em 2003 sobre servidores nossos que estavam extorquindo fornecedores. Imediatamente comuniquei à PF, ao Ministério Público e ao Ministério da Justiça. Na época, 15 pessoas foram presas, inclusive lobistas como Laerte Correia. E 25 servidores foram demitidos e 40 outros afastados em caráter preventivo, porque eu não queria que pairasse dúvida sobre o episódio. Na realidade, o afastamento não foi por prejulgamento, mas pelo fato de que essas pessoas faziam parte da Comissão de Recursos Logísticos. A investigação foi concluída, e no ano passado foi retomado, com reinquirição dessas pessoas. E o delegado que comandou a reabertura me indiciou ¿ afirmou.

Medidas administrativas para coibir a máfia

A advogada do ex-ministro, Marília Fragoso, não forneceu cópias do inquérito. Ontem a assessoria de Humberto Costa entregou à imprensa dez páginas em documentos, mostrando todas as iniciativas implantadas durante a sua gestão para moralizar a compra de hemoderivados. Nos papéis, ele lembra que os gastos com hemoderivados são o segundo maior dispêndio do Ministério da Saúde com medicamentos, e que as medidas por ele implementadas teriam rendido economia de 42% durante sua gestão. Ele enumerou, também, nove medidas administrativas para coibir a máfia dos vampiros, que superfaturava hemoderivados fornecidos ao Ministério da Saúde, com a conivência de servidores que cobrariam propinas para fraudar licitações.