Título: A BATALHA DA EDUCAÇÃO
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 29/08/2006, O País, p. 4

De quem é a culpa de o candidato do PDT à Presidência da República, Cristovam Buarque, ter apenas 1% das intenções de votos: dele mesmo, que não consegue convencer o eleitorado de que a educação deve ser a prioridade do país, ou da sociedade brasileira, que não prioriza a educação? O próprio Cristovam respondeu, candidamente, ontem, na primeira entrevista do GLOBO com os candidatos à Presidência. Admitiu que pode não estar tendo a habilidade suficiente para convencer o eleitorado de que somente com a revolução da educação o país conseguirá dar um salto rumo ao século XXI. Mas fez também uma crítica indireta à atual situação do país, quando disse que o momento político não é de fazer propostas, especialmente as de longo prazo, como é o caso da educação, mas de ser contra tudo o que está aí, ou ser a favor.

Cristovam se recusa a assumir esse tipo de postura em busca dos votos que lhe faltam, pois pretende marcar uma posição que venha a ser reconhecida quando finalmente o país acordar para a necessidade de fazer a tal revolução da educação. Cristovam, aliás, admitiu diversas vezes que lhe falta habilidade política, mas arrancou aplausos dos militantes na platéia quando disse que às vezes é melhor não ter habilidade política, mas não mentir nem deixar de fazer o que considera mais certo: ¿Os mensaleiros são políticos habilidosos, os sanguessugas são habilidosos¿, reforçou Cristovam, para quem é por esse tipo de habilidade que o país está na situação em que se encontra, com os eleitores com asco da política e sem ânimo para tentar descobrir novos caminhos.

Ele lembrou que, quando concorreu à reeleição ao governo do Distrito Federal, se recusou a prometer um reajuste de 28% para os servidores, e muitos consideram que perdeu a eleição ali. O vencedor, Joaquim Roriz, prometeu e não cumpriu, mas mesmo assim foi reeleito. Para ele, tanto Lula como Alckmin representam a mesma proposta política, e por isso os dois estão à frente das pesquisas eleitorais. Cristovam não admite incoerência em suas atitudes quando esteve no Ministério da Educação nos primeiros 12 meses do governo Lula, e esclareceu que considera fundamental para saltar o muro que vê nos separando do futuro tanto a educação quanto a estabilidade econômica do país.

Para Cristovam, transformar necessidade em demanda, frase que repete desde quando esteve no Ministério da Educação, não significa aumentar os gastos do Estado sem controle, mas estabelecer novas prioridades para os gastos públicos. Confrontado com as críticas de que, quando passou pelo ministério, teve muitas idéias mas pouca ação, Cristovam pela primeira vez explicitou divergências de fundo com o governo Lula. Disse que o ProUni teve como base um programa seu que obrigava o aluno beneficiado a ajudar na alfabetização de adultos. Ressaltou que a Bolsa Escola que criou no Distrito Federal, e foi a base para o programa Bolsa Família, tinha incentivos para os alunos que passavam de ano, como uma caderneta de poupança que só poderia ser retirada quando o beneficiado completasse o ciclo escolar.

Essa participação dos beneficiados pelos programas sociais em movimentos de cidadania como a alfabetização, ou o incentivo ao estudo, fazem a diferença entre o assistencialismo do atual governo e projetos de inclusão social, enfatizou o candidato do PDT. Cristovam atribuiu ao corporativismo muitos dos defeitos que vê no governo Lula, que, segundo ele, divide o país em pedaços de influência de grupos, e à própria formação de sindicalista de Lula, que não entende o país como um todo integrado, mas em grupos de interesse.

Essa visão fatiada do país seria responsável pela omissão ou conivência de Lula com a corrupção que se instalou no país em seu governo. Cristovam também negou que sua campanha seja baseada em uma nota só, crítica que recebe com freqüência. Para ele, quando se fala de educação está se falando de todos os problemas brasileiros: corrupção, violência, desigualdade social. Ele considera que é um erro de visão estratégica de empresários e políticos pensarem na economia como vetor principal do desenvolvimento, esquecendo-se de que a educação é o principal capital do mundo moderno, tanto para as pessoas como para os países.

Para ele, um empregado bem preparado educacionalmente hoje tem condições de ter um nível de vida semelhante ao de seu patrão: ¿Pode não ter capital semelhante, mas tem condições sociais semelhantes, e às vezes até mais qualidade de vida¿, ressaltou. No lugar da ¿mais-valia¿ de Marx, Cristovam diz que hoje o que faz a diferença e produz riqueza é a ¿mais-sabedoria¿, se referindo à capacidade de apreender coisas novas e se reciclar. Defendeu que o diploma tenha que ser reavaliado de tempos em tempos, para que todos sejam obrigados a estudar permanentemente para se manterem atualizados com os avanços do mundo moderno.

O candidato do PDT disse que as medidas que estão sendo adotadas pelo governo para reduzir a desigualdade social representam ¿aspirinas¿, mas não soluções estruturais. Assim classificou as cotas raciais, que não considera solução para a igualdade social entre negros e brancos, mas apenas um paliativo que deve ser temporário. De qualquer maneira, acha que é preciso ¿mudar a cor da elite brasileira¿. A verdadeira igualdade só será alcançada quando todos tiverem escola da mesma qualidade, em todos os níveis, ressaltou.

Apesar de ter chance próxima a 1% de ser eleito presidente nas eleições de outubro, Cristovam se diz frustrado, mas não desanimado, com sua batalha pela educação.