Título: FINANCIAMENTO MÓVEL
Autor: Martha Beck
Fonte: O Globo, 29/08/2006, Economia, p. 21

Governo permitirá que consumidor leve empréstimo de um banco para outro, sem pagar CPMF

Opacote de medidas que o governo adotará para estimular a concorrência entre os bancos vai incluir a portabilidade de todas as dívidas dos clientes. Ou seja, o consumidor poderá levar o financiamento que tiver tomado em uma instituição para outra. O objetivo é permitir que o correntista obtenha, por exemplo, juros mais baixos ou prazo maior para um financiamento que já esteja em andamento. Para isso, haverá inclusive isenção de impostos, como CPMF, hoje incidentes nestas transações.

Segundo o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Sérgio Gomes de Almeida, a idéia é fazer com que os bancos sejam obrigados a oferecer cada vez mais vantagens a seus clientes se quiserem evitar que eles migrem para outras instituições ¿ ou se quiser captá-los.

¿ Vamos criar a portabilidade do crédito em geral. Isso aumenta a concorrência e diminui os spreads (diferença entre o custo de captação dos bancos e os juros cobrados dos clientes). É exatamente o que estamos buscando ¿ disse Almeida. ¿ Ainda não temos no sangue essa coisa (portabilidade). O sistema brasileiro enche o cliente de taxas e tributos que não facilitam a troca de instituição. Queremos mudar isso.

Apesar de estar em queda desde 2002, o spread para as pessoas físicas no Brasil ainda é um dos mais elevados do mundo. Em dezembro de 2002, ele era de 54,51%. O número caiu para 42,60% no fim do ano passado e hoje está em 39,71%.

Medida ainda não chega a consignado

As pessoas físicas também pagam mais de 50% de juros quando querem obter crédito no sistema brasileiro. Em julho, as taxas chegaram a 59,78% para o crédito pessoal e a 59,63% para o crediário em geral (aquisição de produtos).

Segundo o secretário, no entanto, a portabilidade do crédito consignado (com desconto em folha de pagamento), que também está nos planos da equipe econômica ¿ e foi a primeira modalidade de crédito estudada para poder ser carregada de um banco para outro ¿ ficará para um segundo momento. Isso porque, diz Almeida, esse tipo de medida é mais complexo porque o crédito consignado envolve convênios entre os bancos e as empresas, que comandam as folhas de pagamento.

Segundo técnicos que trabalham nas medidas, entre as vantagens que o governo vai dar para estimular a concorrência e facilitar a vida de quem quiser mudar seu financiamento de banco está a isenção da CPMF e do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Atualmente, quem quer transferir seu financiamento precisa buscar outra instituição, na qual obtém recursos que são depositados em sua conta corrente e, com incidência de CPMF e IOF, são usados para quitar o primeiro financiamento. E isso de forma desarticulada.

Agora, no entanto, um banco vai poder quitar o financiamento do cliente diretamente com o outro e assumir a dívida, o que torna a operação mais simples e mais barata para o cliente. Segundo o economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Roberto Troster, para os bancos, a vantagem de quitar uma dívida mais cara para financiá-la por uma taxa menor é ganhar o cliente, que pode usar uma série de outros serviços do banco ¿ garantindo às instituições, no conjunto, uma remuneração maior.

Fundo de crédito deve ser reduzido

Outras medidas que também estarão no pacote de estímulo ao crédito são a criação do Cadastro Positivo ¿ mecanismo pensado para beneficiar os bons pagadores, que poderiam obter juros menores quando fossem solicitar crédito no sistema bancário ¿ e a redução do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Os bancos contribuem para este fundo para que o sistema dê garantias aos correntistas em caso de quebra da instituição financeira. Porém, na avaliação do governo, essa reserva chega hoje a quase R$10 bilhões e já pode ser reduzida.

No caso do crédito consignado, o governo também pretende estendê-lo a microempresas e à compra da casa própria. Para as pessoas jurídicas, a garantia do consignado ¿ que no caso das pessoas físicas é o desconto automático do salário ¿ seriam recebíveis (receitas que ainda não entraram no caixa mas são transformadas em títulos e vendidas).

No caso da habitação, o consignado deve atender a quem ganha acima de cinco salários mínimos. Além disso, para ter acesso ao crédito, o trabalhador poderá comprometer até 30% de sua renda, sendo que esse percentual, inicialmente, deve ser menor, em torno de 20%. Além disso, o governo pretende eliminar a TR (Taxa Referencial) dos contratos habitacionais, o que tornaria as prestações prefixadas e traria economia ao mutuário ao final do contrato.

Para trabalhadores com renda abaixo de cinco salários mínimos, o governo tem outro plano. Vai propor ao Conselho Curador do FGTS a ampliação dos recursos destinados à habitação para pessoas de baixa renda em R$530 milhões, que se juntariam ao atual R$1,3 bilhão.

O Ministério da Fazenda deve divulgar os pacotes de habitação e crédito em 5 de setembro, após a reunião extraordinária do Conselho Monetário Nacional (CMN). Inicialmente, o lançamento deveria ser hoje, mas foi adiado para fechar alguns detalhes.

Também deve sair em breve do forno um conjunto de medidas visando a atrair indústrias de semicondutores para o Brasil e facilitar a implantação da TV digital no país. Segundo tem dito o ministro da Fazenda, Guido Mantega, entre os benefícios está a redução de praticamente todos os tributos federais do setor por cerca de 11 anos.

COLABOROU Henrique Gomes Batista