Título: Um megarroubo evitado
Autor: Chico Oliveira, Flávio Freire, Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 02/09/2006, O País, p. 3

PF prende 38 de facção criminosa e descobre túnel escavado para roubar dois bancos no Sul

Numa operação em cinco estados, a Polícia Federal prendeu ontem 38 pessoas acusadas de pertencer à quadrilha que planejava assaltar os cofres das agências-sede do Banrisul (Banco do Estado do Rio Grande do Sul) e da Caixa Econômica Federal em Porto Alegre. Só na capital gaúcha foram 26 presos, flagrados quando cavavam um túnel no centro da cidade para chegar aos cofres subterrâneos dos bancos.

Entre os presos estão quatro chefes da facção criminosa que comandou os últimos ataques a alvos civis e policiais em São Paulo, além de 13 participantes do maior assalto da história do país: o roubo de R$164,8 milhões dos cofres do Banco Central em Fortaleza, em agosto do ano passado, também cavando um túnel até o cofre. Os túneis usados pela quadrilha inspiraram o nome da ação da PF: Operação Facção Toupeira.

A PF flagrou 22 homens dentro do prédio que a quadrilha usava como base, na região central de Porto Alegre, e a partir do qual começou a escavar o túnel rumo ao banco. O túnel já tinha 80 metros de comprimento. Outros quatro homens foram presos numa casa próxima. O assalto em Porto Alegre deveria ocorrer no feriado de 7 de setembro ou no dia 20, feriado no Rio Grande do Sul por causa das comemorações da Revolução Farroupilha (1835-1845).

Plano incluiu a compra de prédio

O planejamento da operação mostra o grau de organização da quadrilha: parte do dinheiro do roubo do BC em Fortaleza foi usado, segundo a PF, para que os criminosos comprassem em Porto Alegre um prédio de sete andares, a partir do qual começaram a escavar o túnel. O prédio, que estava abandonado, custaria R$1,2 milhão. A promessa de compra e venda foi assinada em 5 de julho, quando foram pagos R$300 mil à vista, em espécie. Outras três prestações foram acertadas para serem pagas a partir de cinco de outubro.

O homem que comprou o edifício, Fabrísio Oliveira Santos, foi preso em São Paulo e, segundo a PF, é integrante da facção criminosa paulista. O vendedor do prédio foi interrogado em Porto Alegre e, segundo a PF, não há nada contra ele. Em São Paulo houve ao todo sete presos, além de três em Alagoas, um no Piauí e um na Paraíba.

Para a PF, não há dúvidas de que o dinheiro serviria para seguir movimentando os negócios da facção:

¿ Cortamos um dos braços dessa facção. O assalto seria utilizado para levantar dinheiro para a organização, financiar outros assaltos, fugas, subornar servidores, pagar advogados ¿ disse o superintendente da Polícia Federal no Rio Grande do Sul, delegado José Francisco Mallmann.

Só em Porto Alegre, a Operação Facção Toupeira mobilizou cerca de cem policiais federais. Os policiais conseguiram surpreender os suspeitos sem disparar um único tiro, pois estavam todos desarmados.

Criminosos fingiam ser operários

Alguns suspeitos foram presos usando macacões e capacetes, típicos de quem trabalha em galerias. Para não chamar a atenção de vizinhos ou mesmo da polícia, os criminosos fingiam ser operários de uma empresa de jardinagem, mesmo método usado no roubo ao BC de Fortaleza. Na casa onde foram presos os chefes do grupo, a polícia encontrou alimentos, uísque, brinquedos, bijuterias, roupas e muitos carregadores de baterias espalhados pelo chão e pelas mesas.

¿ Só vinha carro importado e camionetes. Eles passavam o dia fechando caixas com fita adesiva e hoje soubemos que eram caixas com madeira para ser levada para escorar o túnel. A atividade era intensa, dia e noite, não paravam nunca ¿ disse o motoboy Wagner Sain, de 21 anos, de uma empresa ao lado da casa.

Os presos mais importantes da operação no Rio Grande do Sul foram Carlos Antônio da Silva, o Balengo, que, segundo a Polícia Federal, é suspeito de ter planejado o seqüestro da equipe da Rede Globo em São Paulo e comandava a operação em Porto Alegre; Jean Ricardo Galian, Lucivaldo Laurindo, o Tatuzão, que participou do assalto em Fortaleza, e Ricardo Laurindo, todos do comando da facção.

Em São Paulo, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, classificou a operação como um golpe contra o crime organizado. Ele disse ter certeza de que a quadrilha desbaratada ontem tem ligações com a facção criminosa:

¿ É um golpe forte no crime organizado naquilo que ele tem de oxigênio, que é o dinheiro. Eles estavam fazendo caixa. Eles são extremamente articulados e as ligações vão agora se desdobrando e se revelando.