Título: NO BOLSA FAMÍLIA, O ALIADO DE PESO
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Fonte: O Globo, 03/09/2006, O País, p. 8

Benefício coordenado por Patrus Ananias alavanca votos para Lula

BRASÍLIA. Confusa e quase um fiasco no primeiro ano de governo, a área social deu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva seu maior cabo eleitoral em 2006: o Bolsa Família. O programa é realidade em todos os municípios brasileiros e, desde junho, beneficia 11,1 milhões de lares. Por mês, são cerca de R$650 milhões nas mãos da população pobre, a maioria no Nordeste, onde Lula tem seus maiores índices de intenção de voto. No ano, o gasto chegará a R$8,3 bilhões, incluindo remanescentes de programas como Bolsa Escola e Bolsa Alimentação.

O tamanho do Bolsa Família contrasta com a discrição do ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias. Responsável pelo programa de maior visibilidade do governo, o ex-prefeito de Belo Horizonte e deputado federal mais votado da história de Minas evita aparecer. A pedido de Lula, não disputará nenhum cargo nas próximas eleições:

¿ Sou um gestor razoável, para ser modesto.

Antes de conquistar tamanha estabilidade, o ministro, que assumiu em janeiro de 2004, já esteve a perigo. Naquele mesmo ano, recebeu críticas ao deixar de fiscalizar as contrapartidas de educação e saúde. Pior: deu uma declaração que jogou ainda mais combustível na crise, afirmando que o controle era ¿importante, mas não essencial¿. Foi o suficiente para a Casa Civil, chefiada então pelo ministro José Dirceu, intervir no programa e estabelecer um sistema de fiscalização em parceria com os Ministérios da Educação e da Saúde. Ao exigir que as crianças beneficiadas sejam vacinadas e freqüentem a escola, o programa tenta evitar que a pobreza passe de uma geração a outra.

¿ A crítica, mesmo que doa, é fundamental. A partir daquela entrevista, veio um debate que ajudou o programa a buscar cumprir todas as exigências da lei ¿ diz Patrus.

Apenas um petista de carteirinha nos quadros

Diferentemente do que ocorre em outros endereços da Esplanada, a Secretaria de Renda de Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Social, chefiada pela servidora de carreira Rosani Cunha, tem apenas um petista de carteirinha entre os mais de dez diretores e coordenadores do Bolsa Família. Isso não significa que o programa não esteja a serviço da agenda política da reeleição: em junho, o governo acelerou a inclusão de famílias e antecipou a meta de 11,1 milhões de beneficiários, prevista para dezembro.

¿ Nunca pedi atestado ideológico a ninguém ¿ diz Patrus.

A disposição ao diálogo, mesmo com quem está na oposição, rende elogios ao ministro.

¿ É o melhor ministro do governo Lula. ¿ diz o secretário de Assistência e Desenvolvimento Social da cidade de São Paulo, Floriano Pesaro, que é ligado ao ex-prefeito e candidato a governador José Serra (PSDB).

Para um presidente que assumiu dizendo ter o objetivo de garantir três refeições diárias à população pobre, Lula demorou a ver resultados. Em 2003, seus ministros batiam cabeça na tentativa de explicar a interminável lista de ações do hoje quase esquecido Fome Zero.

Lula herdou três programas de transferência de renda: o Bolsa Escola, o Bolsa Alimentação e o Auxílio-Gás. Não satisfeito com a dispersão das ações, o então ministro extraordinário de Segurança Alimentar, José Graziano, criou um quarto programa similar, o Cartão-Alimentação.

Vendo que a confusão só aumentava, o Palácio do Planalto lançou o Bolsa Família em outubro de 2003, unificando os quatro programas. Ele nasceu vinculado à Presidência e coordenado pela secretária-executiva Ana Fonseca. Em janeiro de 2004, o programa migrou para o recém-criado Ministério do Desenvolvimento Social, sob o comando de Patrus. O Planalto, porém, não afrouxou o controle, e Ana Fonseca virou secretária-executiva do ministério. Ela se desentendeu com Patrus e acabou demitida no fim de 2004. Para seu lugar, foi nomeada a então secretária de Assistência Social, Márcia Lopes, irmã do chefe do gabinete pessoal do presidente Lula, Gilberto Carvalho.