Título: SUSPENSO LEILÃO DE INTERNET
Autor: Monica Tavares
Fonte: O Globo, 05/09/2006, Economia, p. 21

Tribunal de Contas da União manda Anatel adiar licitação da banda larga sem fio

Por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) suspendeu ontem o leilão de freqüências para prestação do serviço de internet banda larga sem fio. Os maiores beneficiados pela decisão foram o governo ¿ que queria adiar o leilão mas não dispunha de instrumentos para fazer isso sem causar polêmica ¿ e as empresas de telefonia fixa, que agora ganham fôlego para tentar liberar sua participação plena no leilão. A única forma encontrada pelo governo para mudar o quadro foi uma intervenção direta no órgão regulador, baixando uma portaria, o que encontrava resistências no próprio Executivo.

Agora, o Ministério das Comunicações corre contra o tempo para estabelecer novas diretrizes para a política federal de inclusão digital, de forma a tentar alterar os termos do edital. O objetivo é fazer com que a Anatel tenha que se adequar a uma nova orientação de governo, autorizando as empresas de telefonia fixa a entrarem no leilão de internet pelo ar nas áreas onde hoje atuam como concessionárias (por exemplo, no caso da Telemar, os 16 estados onde ela atua).

Mas ainda não está claro qual modificação o governo pode fazer que levaria a Anatel a mudar as regras da licitação, se e quando o TCU liberá-la. As telefônicas somente conseguiram garantir ontem a participação no leilão por meio de liminar do Tribunal Regional Federal (TRF), em Brasília. Elas comemoraram a decisão dos tribunais, que foi alvo de protesto dos provedores de internet, que acreditam que uma alteração no edital vai favorecer a concentração. Os executivos que representavam essas empresas colocaram narizes de palhaço quando o leilão foi suspenso.

Ministro descarta articulação

O ministro das Comunicações, Hélio Costa, defendeu a decisão do TCU diante de ¿vícios de origem¿ do edital que precisariam ser corrigidos. O ministro contou que foi informado de que o TCU poderia tomar esta medida na sexta-feira. Este teria sido um dos motivos do cancelamento da reunião de Costa com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o ministro descartou que tenha havido uma articulação entre Executivo e TCU para afrontar a Anatel:

¿ Não foi uma solicitação do Ministério. Pelo contrário, vendo o desenrolar dos acontecimentos, eu cheguei à conclusão de que era desnecessária a intervenção do Ministério ¿ afirmou Costa. ¿ Fiquei sabendo na sexta-feira que as coisas estavam caminhando nesse sentido.

O despacho do TCU é assinado pelo ministro Ubiratan Aguiar, que deu prazo de 15 dias para a agência se manifestar. A licitação está suspensa cautelarmente até uma decisão definitiva do TCU sobre o leilão. Ubiratan vai apresentar seu parecer ao plenário do Tribunal.

O ministro disse que a decisão de suspender o leilão baseou-se unicamente em solicitação das áreas técnicas do tribunal. Essas áreas teriam identificado dois problemas graves no modelo de licitação adotado pela agência, que, segundo os técnicos, poderia causar prejuízos de R$23 milhões aos cofres públicos:

¿ Eu me baseei tão-somente na solicitação da área técnica. Foram identificadas distorções no modelo apresentado pela Anatel, que poderiam causar danos irreversíveis. Por isso, a decisão de conceder a cautelar. Agora, a Anatel tem 15 dias para prestar informações ao tribunal e, se fizer isso antes desse prazo, poderemos julgar o mérito logo após.

Os dois pontos destacados pelos técnicos são a cotação defasada do euro, de novembro de 2004, que serviu de base para calcular os investimentos das empresas, e distorções nos preços das freqüências, fixados de acordo com o tamanho das cidades. Os preços dos leilões devem subir 76%. Os técnicos constataram, por exemplo, que as cidades de Ribeirão Preto e Santos, que são de porte médio e têm mais de 12 mil empresas, estavam sendo postas em leilão por preço menor que outras cidades de pequeno porte.

Um técnico do TCU explicou que o valor do euro estava desatualizado, cotado em torno de R$3,54, em novembro de 2004, quando da elaboração do edital. Esta cotação é que orientava os investimentos das empresas, principalmente em compra de equipamentos. Com a redução da cotação do euro para cerca de R$2,80, haveria uma queda dos investimentos e, portanto, a Anatel poderia cobrar mais pelas licenças sem prejudicar a rentabilidade das empresas.

Para Hélio Costa, foi ¿muito aconselhável¿ o que ocorreu e ele está aguardando o próximo passo do conselho diretor da Anatel. Mas acredita que o Conselho vai acatar a sugestão do TCU. O tribunal decidiu suspender o leilão porque a Anatel não acatou no edital sugestões feitas por seu corpo técnico há 20 dias. A participação das teles não foi analisada.

¿ É preferível assim, porque nós temos agora tempo de realmente fazer um estudo bem detalhado da proposta, para que ela atinja os seus objetivos de chegar às pequenas cidades. A nossa preocupação sempre foi essa ¿ afirmou Costa.

Decisão foi curiosa, dizem provedores

Por outro lado, o presidente da Associação dos Integrantes do Projeto Global Info, que reúne mais de 230 provedores de acesso à internet, Paulo Messina, acredita que a suspensão do leilão trará prejuízos para o consumidor. Ele disse ainda que a decisão do TCU foi ¿curiosa¿:

¿ Se tivesse feito a licitação, poderia ter redução de preço, não só de internet, mas de telefonia também. Com a concorrência, a tendência era os preços caírem.

Messina afirmou ainda que não vê lógica na argumentação do TCU de que havia problemas por causa da questão do câmbio do euro.

O presidente da Associação Brasileira de Telefonia Fixa (Abrafix), José Fernandes Pauletti, também lamentou o cancelamento do leilão. Mas por motivo diferente: não puderam fazer valer a liminar obtida no TRF, que lhes garantia participação irrestrita.

COLABOROU Regina Alvarez