Título: A HORA DE TODOS PELA EDUCAÇÃO
Autor: MILÚ VILLELA
Fonte: O Globo, 07/09/2006, Opinião, p. 7
Lidos com olhos críticos, um estudo preliminar e um exame de avaliação de desempenho realizados recentemente pelo Ministério da Educação revelam um descompasso entre percepção e fato em relação ao ensino público do país. Segundo o estudo, ainda em sua primeira etapa, os pais brasileiros estão satisfeitos com a escola pública onde, pela conclusão do ¿Prova Brasil¿, divulgado há dois meses, os alunos aprendem menos do que seria necessário e desejável.
Na verdade, aprendem muito menos. Para se ter uma idéia do tamanho do desafio, um estudante de oitava série do ensino fundamental tem conhecimentos correspondentes ao que é exigido dos estudantes da quarta série em outros países. Por causa desse déficit, não consegue fazer operações simples de matemática nem identificar a intenção do autor de um texto. Já o aluno de quarta série acha difícil, por exemplo, ler as horas em um relógio de ponteiros, realizar cálculos com dois algarismos ou compreender um texto curto e simples.
As conclusões do Prova Brasil não representam, a rigor, nenhuma novidade. Ressaltam o que já se sabia sobre o desempenho dos alunos brasileiros. Afinal, os mais recentes testes internacionais do Pisa vinham colocando o país nas últimas posições do ranking mundial de domínio de língua, matemática e ciências. O fato novo é a percepção dos pais de que, contra as evidências práticas, a rede de ensino público vai bem. A conclusão mais óbvia a que se chega é que o pai brasileiro, por motivos que precisam ser mais bem compreendidos, tem um nível baixo de exigência em relação à escola: fica feliz se o filho tem uma vaga e se recebe merenda regular, delega a tarefa de educar ao Estado, participa pouco da vida escolar e não sabe avaliar um ensino de qualidade. Contenta-se com o pouco porque talvez ainda não se veja como portador de um direito, e sim, beneficiário de um favor.
O Compromisso Todos Pela Educação, que foi lançado ontem, no Museu do Ipiranga, em São Paulo, nasceu exatamente com a missão de contribuir para mudar esse estado de coisas. Movimento criado com base em uma aliança entre lideranças da sociedade civil, empresas, MEC, Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e União Nacional de Dirigentes Municipais de Ensino (Undime), ele inicia suas atividades fortalecido por duas firmes crenças. A primeira, de caráter mais simbólico, apóia-se na idéia de que um país só poderá ser considerado independente se às suas crianças e jovens for dada a oportunidade de um ensino público de qualidade, capaz de prepará-los para os desafios do século XXI ¿ isso explica a escolha de 2022, ano do bicentenário da Independência, como horizonte do Compromisso. A segunda crença, de caráter mais prático, é que a educação brasileira só vai melhorar quando os pais, mães, educadores, líderes comunitários, conselhos tutelares, promotores públicos, empresários e todos os públicos ligados ao dia-a-dia da vida escolar de uma criança e jovem valorizarem a educação básica, souberem avaliar a sua qualidade e cobrarem uma oferta melhor nas escolas de sua comunidade.
Sobre o Todos pela Educação, cumpre dizer que não se trata de projeto pontual ou de uma campanha de propaganda para chamar a atenção sobre o tema. É uma ação permanente de 16 anos, suprapartidária por princípio e aberta à participação de todos os que acreditam na educação como a mais importante política pública para um país que precisa combinar desenvolvimento com justiça social. O Compromisso não pretende substituir governos nem organizações da sociedade civil, mas trabalhar ao lado deles, fortalecendo-os. Ao contrário de outros projetos e ações, não deseja intervir diretamente na escola. Sua proposta de atuação é ¿qualificar a demanda¿ por uma educação básica de qualidade, utilizando estratégias de comunicação e desenvolvendo ações permanentes de mobilização, orientação e estímulo para que pais e públicos relacionados à educação se sintam aptos a trabalhar por e a cobrar uma escola melhor a cada dia.
A principal diferença do Compromisso, no entanto, está no modo como fará o monitoramento dos resultados que espera atingir até 2022. O objetivo de trabalhar para melhorar as condições de acesso, permanência, conclusão e sucesso escolar foi traduzido em cinco metas simples mas desafiadoras, que servirão para que todos os brasileiros acompanhem permanentemente a evolução do quadro educacional no país: 1. Toda criança e jovem de 4 a 17 anos estará na escola; 2. Toda criança de 8 anos saberá ler e escrever; 3. Todos os alunos aprenderão o que é apropriado para a sua série; 4. Todos os alunos concluirão o ensino fundamental e médio; 5. O investimento na educação básica corresponderá a, no mínimo, 5% do PIB e deverá ser bem gerido.
As metas parecem óbvias. E o são, de fato. Como óbvia também deveria ser a constatação de que a educação é uma estratégia fundamental para o desenvolvimento do país. Atingi-las, no entanto, demandará esforço concentrado, clara noção de prioridades e cooperação entre as partes interessadas. Mais do que impulsos e vontades, exigirá um compromisso de todos os que crêem que um país só poderá ser independente se as suas crianças e jovens tiverem uma educação básica que lhes permita exercer o seu direito de igualdade e de oportunidades. Agora é a hora de Todos pela Educação. Você está convocado a participar. Saiba como acessando o site www.todospelaeducação.org.br.
MILÚ VILLELA é presidente do Museu de Arte Moderna de São Paulo, do Instituto Itaú Cultural, do Faça Parte-Instituto Brasil Voluntário e do Comitê Executivo do Compromisso Todos pela Educação.