Título: AGRICULTORES SE SUICIDAM NA ÍNDIA
Autor: Florência Costa, Sonia Soares, Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 10/09/2006, Economia, p. 38

Mais de 42% vivem com menos de US$1 por dia

O retrato da Índia rural do século XXI é cinzento. Endividados até o pescoço, milhares de pequenos produtores têm tomado, nos últimos anos, a mais drástica das atitudes: o suicídio. De 1993 até agora, mais de cem mil pequenos fazendeiros se mataram, quase 10% do número total de produtores. Muitos tomam o veneno que deveria eliminar as pragas de suas plantações: pesticida. No início de junho, o primeiro-ministro, Manmohan Singh, desembarcou em comunidades rurais do país e visitou uma das localidades mais afetadas pela onda de suicídios, Vidharbha (no estado de Maharashtra). Ouviu apelos desesperados.

¿ Há três meses meu marido escolheu a morte e me deixou dívidas e cinco filhas. Uma delas morreu porque não tive dinheiro para pagar o médico. Não tem um dia em que não pense em suicídio. Essa é a única opção que me resta ¿ desabafou Gangabai Chandak, viúva de um produtor de algodão.

O custo do plantio aumentou dez vezes nos últimos anos, e mais de 42% dos trabalhadores agrícolas vivem abaixo da linha da pobreza (US$1 por dia), segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego.

Uma pesquisa feita pelo Instituto de Desenvolvimento Indira Gandhi mostrou que o estresse que leva os produtores agrícolas do país ao suicídio está ligado às dívidas, ao declínio de sua posição econômica e social e à falência do cultivo.

O primeiro-ministro anunciou um pacote de ajuda de quase US$1 bilhão e prometeu dobrar o crédito agrícola em três anos. O governo já dava subsídios para fertilizantes no valor de US$3 bilhões por ano. Os suicídios, no entanto, continuaram ocorrendo na área rural.

Dos 130 milhões de produtores do país, 80% têm pequenas áreas de plantio, de até dois hectares. Além das dívidas impagáveis com a falência de suas colheitas, os pequenos produtores amargam péssimas condições de vida. Somente 9% das casas rurais têm banheiros. A expectativa de vida no campo é de 59 anos, cinco a menos do que nas cidades. A mortalidade infantil é de 84 a cada mil na zona rural, pouco mais da metade das casas tem água potável e apenas 30% contam com eletricidade.

O desafio de gerar crescimento com inclusão social passa pela Índia rural, onde vivem 70% da população do país. Com a duplicação do crédito para os produtores nos próximos três anos, a meta é aumentar o crescimento da agricultura, que hoje é de 2%, para 4%. Há ainda um programa nacional de garantia de emprego rural por meio de obras públicas, que beneficiará pelo menos um membro de cada família que vive da agricultura. O custo anual do programa é de US$2,5 bilhões.