Título: COMBATE À DISCRIMINAÇÃO É ALVO COMUM
Autor: Luciana Rodrigues e Florência Costa
Fonte: O Globo, 10/09/2006, Economia, p. 41

Na África do Sul, empresas têm que ceder parte do seu controle a investidores negros

Iguais em sua diversidade étnica, Índia, Brasil e África do Sul traçaram caminhos distintos para incluir os discriminados. Se no Brasil as políticas de ação afirmativa são recentes ¿ e a distância que separa negros e brancos bem menos arraigada do que o legado do apartheid ou a herança religiosa das castas ¿ na Índia as iniciativas remontam à década de 1950 e, na África do Sul, foram adotadas logo após a queda da supremacia branca.

Universidades, companhias com mais de 50 empregados e órgãos do governo sul-africano têm cotas que repetem o padrão demográfico: 80% de negros e 50% de mulheres. As empresas (públicas, privadas ou estrangeiras) têm que seguir a Black Economic Empowerment (BEE), política que prevê, entre outras medidas, a cessão de parte do controle acionário a negros. Mas há quem acredite que, com isso, aumenta a burocracia e fica mais difícil atrair investimentos estrangeiros.

¿ Há o temor com o que alguns (investidores) percebem como risco de expropriação. Mas a maioria reconhece que a BEE é politicamente indispensável ¿ afirma Peter Draper, do South African Institute of International Affairs.

E, mesmo com as políticas pró-inclusão, o país ainda está longe de ser um arco-íris racial, expressão cunhada por Nelson Mandela. Há uma emergente classe média negra, mas também muita pobreza.

¿ Há uma frustração, porque falta remédio, falta emprego. As políticas de ação afirmativa são fundamentais, mas têm que vir acompanhadas de medidas concretas de redução da pobreza ¿ afirma a brasileira Diva Moreira, pesquisadora Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

Intocáveis limpavam latrinas

Na Índia, desde 1950 há cotas no serviço público para as castas menos favorecidas. Mas um projeto recente do governo de aumentar as reservas no ensino superior levou os estudantes às ruas de Nova Délhi e Bombaim para protestar desde maio.

Apesar de proibida pela Constituição de 1950, a discriminação por castas ainda persiste, principalmente no interior. Nessa rígida hierarquia, os grupos são divididos pelas suas funções no trabalho: no topo estão os brâmanes (sacerdotes e intelectuais) e, por último, os sudras (trabalhadores braçais). A identificação das castas se dá pelo nome das pessoas.

Entre 65% e 70% da população pertencem às castas inferiores ou ao grupo que se autodenomina dalits, também conhecidos como párias ou intocáveis, mas que hoje preferem ser chamados de oprimidos. De tão menosprezados, sequer pertencem ao sistema de castas e tinham tarefas impuras, como limpar latrinas. Alguns ascenderam socialmente.

Hoje, 22,5% das vagas no ensino superior já são destinadas aos dalits ou a outros indianos excluídos. O governo prevê mais 27% de cotas para as castas inferiores. Para acalmar os protestos, o governo prometeu aumentar as vagas ou aplicar as novas cotas paulatinamente.

(*) Correspondente